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CARTA AOS ROMANOS (CAPÍTULOS 1 AO 7) - KARL BARTH (RESUMO)


O que se segue é um resumo da primeira parte da obra Carta aos Romanos do teólogo reformado e ortodoxo, Karl Barth. Nesta primeira parte de sua obra, Karl Barth comenta os capítulos 1 ao 7 do livro de Romanos, tratando de temas como o evangelho, a graça de Deus e a justificação. O resumo está dividido em 7 partes em correspondência aos 7 capítulos do livro de Romanos. É importante colocar que este resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor original.

I. ROMANOS 1: O EVANGELHO E A IRA DE DEUS 

Paulo inicia a carta apresentando-se como servo, o que temos não é um gênio orgulhoso, mas um mensageiro cativo da missão que recebeu. A mensagem que Paulo recebeu e tem de entregar é o evangelho de Deus. Assim, o tema da epístola é o evangelho, o evangelho da ressurreição que é o poder de Deus, a revelação e o conhecimento desse poder, poder que é a investidura de Jesus, como o Cristo. 
O poder de Deus é poder para salvação. O humano, neste mundo, está em cativeiro. Nenhuma luz adicional encontraremos se nos aprofundarmos na conscientização de nossas limitações humanas, antes, sentir-nos-emos cada vez mais distantes de Deus, ficaremos mais compenetrados na enormidade de nossa queda. É que o humano é, no estado de Queda, o seu próprio senhor. A sua unidade com Deus foi tão destruída que a reconciliação é absolutamente inimaginável para o humano. A sua condição de criatura é o seu grilhão, seu pecado é a sua culpa, e sua morte é seu destino. 
O evangelho, por outro lado, fala-nos de Deus como Redentor, oferecendo liberdade e perdão, nos devolvendo o que perdemos. O evangelho é o anúncio de um novo mundo que está chegando. O evangelho requer. Somente para os que tem fé é ele o poder de Deus para a salvação. O poder de Deus para a salvação é algo tão novo, inaudito e inesperado que só pode surgir, ser percebido e ser aceito como contradição. O evangelho questiona a existência e o modo de ser do mundo e, consequentemente, de cada ser humano, tão certo quanto a profunda problemática de nossa vida é uma condição geral, assim, também a contradição divina em Cristo se faz sentir em cada pessoa. 
O evangelho é totalmente estranho à natureza das coisas deste mundo nosso conhecido, por isso não pode ser apreendido senão pela fé.  O evangelho é apenas digno de fé. O evangelho não pode ser assimilado, apropriado, pela análise intelectual, por deduções lógicas, por elucubrações indutivas, por convicção intuitiva, por exposição, por ensino ou por exemplo, mas unicamente pela fé. A fé é o respeito ante o incógnito divino e o amor de Deus. 
Mas o humano nega Deus e adora a criatura no lugar do Criador, o humano troca Deus pelo mundo e dá livre curso à sua natureza. O pequeno Deus que criamos, dispensa, necessariamente, o grande Deus, Por isso, os humanos aprisionam, encapsulam, a verdade. Daí se manifesta a noite da ira de Deus, o julgamento divino. A ira divina é o NÃO que permanece diante de nós enquanto não aceitamos a Deus. A ira de Deus é a justiça de Deus revelada ao incréu, a ira de Deus é a justiça fora de Cristo e sem Cristo.  

II. ROMANOS 2: O JULGAMENTO DE DEUS 

O ser humano é humano, e está no mundo dos humanos. O que nasceu da carne é carne, os fatos e feitos gerados pela atividade humana em sua existência estão impregnados pela impiedade. Assim, o humano não pode escapar do julgamento de Deus. Assim, não cabe ao humano julgar, a história do mundo não é o tribunal do humano, o julgamento final pertence a Deus. 
O juízo de Deus é segundo o paradigma da verdade. Perante esse Deus comparecerá também o justo, o crente. Comparecerão perante o Deus que recompensará a cada um segundo as suas obras, com glória, honra e incorruptibilidade e vida eterna aos que com perseverança buscam a Deus conforme o testemunharem as suas obras. Porém, com ira e indignação aos que com mente servil e desobedientes à verdade, seguem a rebeldia.  

III. ROMANOS 3: A JUSTIÇA DE DEUS E A JUSTIFICAÇÃO 

A história do mundo é constituída pelo entrechoque das supostas vantagens do espírito e da força que uma parte da humanidade goza ou pretende gozar em detrimento à posição da outra parte. A história do mundo é a luta pela existência, hipocritamente dissimulada nas ideias de justiça e liberdade, é o subir e descer das ondas de antigas e novas formas de justiça humana que se sobrepujam mutuamente em solenidades, e em futilidades. Esta história termina, encerra, o seu ciclo com o juízo de Deus. Quando este juízo de Deus se der, os vales se erguerão e as colinas se abaixarão. A guerra entre bons e maus chegará ao fim. O fim da História, o seu término, é também o seu alvo. Aquele que julga é também o Criador e o Redentor, o Restaurador de todas as coisas. 
O veredito da história dirige-se aos que a ela se atêm e pode levá-los a se calarem perante Deus, em uma espécie de renúncia extrema, pois justamente os que buscam a história são os que ouvirão e perceberão o julgamento que ela faz do mundo e da própria história. Quando os humanos se calarem diante de Deus e se ativerem a ouvir o que a Lei diz, quando reconhecerem que somente Deus tem razão e é justo, quando a sua religião suprimir esta mesma religião, quando a sua piedade revelar a inexistência dessa mesma piedade, quando a sua sobranceria espiritual e intelectual descer ao nível a que são rebaixadas as preeminências humanas, quando os humanos que galgaram os mais altos píncaros perceberem que todos, incluindo eles mesmos, são culpados perante Deus, então se manifestará o sentido eterno da história.  
No entanto, se antes Deus expressava seu julgamento por meio de sua ira, o seu NÃO, aparece, agora, Cristo, o Verbo encarnado de Deus, o seu SIM. Cristo é o SIM, o SIM da aceitação divina que anula os efeitos do NÃO. Agora justiça de Deus é perdão, significa que a irreverência e a impiedade dos humanos não são levadas em conta por Deus, antes são tidas por Ele como fatos irrelevantes que não impedem de chamar-nos de propriedade dele para que, de fato, lhe pertençamos. Esta é a justiça de Deus: o relacionamento positivo de Deus com os humanos. 
Em Cristo, Deus é justo e nos justifica. Somente existe justiça humana se ela vier da parte de Deus, tudo o que existe originado no humano é medido em Cristo, por Deus, que conforme Seu agrado, atribui às coisas mérito ou demérito. É necessário que morra em Cristo o humano que escolhe o materialismo, as lendas, as fábulas e a transitoriedade do mundo, o humano que se esquece que nada tem que não tivesse recebido e precisasse de receber novamente de Deus, o humano que quer safar-se do paradoxo da fé, o humano que já não quer abrir mão de sua confiança na sabedoria, na ciência, nas coisas certas e palpáveis do mundo, e do conforto que este oferece, para depender exclusivamente da graça de Deus.  Precisa morrer em Cristo o humano que tenha qualquer outro pretexto para se apoiar, que não seja a esperança. 
A justificação através de Cristo é sempre justificação independente das obras da lei, independentemente de tudo que da parte do humano pudesse ser considerado como justiça. Em Cristo estão as coordenadas da vida eterna. A justiça de Deus e a justificação garantem-nos, na real transcendência divina, a mais genuína imanência de Deus. Quem está em Cristo está em Deus. Cristo, desde a eternidade, foi destinado pela deliberação de Deus, como o lugar sobre o qual Deus habita, de onde Ele dala o lugar de expiação e reconciliação.  
Entre nós e Deus, estará sempre o Dia da Cruz e essa justificação é possível somente pela fé. No paradoxo da fé basta-nos a fidelidade de Deus, pois com ela pisaremos terreno firme e trilharemos caminho seguro. O Deus da fé não é alguma grandeza psíquica, nem histórica, mas a essência e a origem de todas as grandezas, absolutamente diferente de tudo mais, a palavra “Deus” não significa “alguma coisa”, mas “tudo”, aquilo que é final e definitivo. “Deus” é a palavra eterna, final, quando com ela, exclusivamente pela fé, indicamos a impossível possibilidade de sua fidelidade.  

IV. ROMANOS 4: A FÉ 

Se pretendermos inserir a ressurreição no correr da história mundana, se tentarmos situar a pressuposição que há em Cristo, de que ele é o Deus conosco, na ambivalência e conjuntura existente no mundo, se tentarmos entretecer o paradoxo da fé no contexto da experiência espiritual da humanidade, confrontar-nos-emos com uma situação ilógica, espécie de espectro devorador de todas as coisas vivas. A ressurreição não daria vida nova se fora apenas uma ocorrência anormal no mundo, a possibilidade da vitória sobre a morte é, em Cristo, uma possibilidade universal.  
As verdades transcendentais que emergem da vida de Cristo, não podem ser consideradas verdades parciais ou relativas, a possibilidade da vitória sobre a morte é dada a todos. A fé é o começo, é na origem divina da fé que encontramos a justificação que ela proporciona e a explicação de sua peculiaridade: ser ela algo novo, diferente, que se contrapõe a toda realidade religiosa. 
Descobrimos na fé, a verdade de toda religião, todavia, é ela idêntica às realidades palpáveis e históricas das experiências religiosas. A fé jamais se mescla, interfere ou se confunde com o desenvolvimento contínuo do ser humano, de suas possibilidades e suas obras, nem se transforma em caminho ou meio, no decorrer da vida material, na vida eclesiástica, na religião, ou mesmo na história da redenção. A fé é o firme fundamento, se ela representar o passo eterno para o totalmente invisível, sendo ela também invisível. E a fé somente vale por fé se for o passo à frente que vem de Deus e que só Deus torna possível e compreende. 
Deus permanece livre, inteiramente livre das injunções ou exigências da lei. Deus não reage em termos da impressão que os humanos têm ou possam ter da revelação, a lei e a impressão humana são testemunhas de sua fidelidade. A Religião é o inevitável reflexo espiritual ou a experiência do milagre da fé que se realiza na alma e a Igreja é o incontornável conteúdo da obra de Deus com os humanos. A Religião e a Igreja são a indicação da graça divina manifesta na redenção.  

V. ROMANOS 5: O MUNDO HUMANO 

É somente pela fé que somos justificados por Deus. Deus se justifica perante nós e assim se justifica perante ele. Ele nos liberta, aprisionando-nos; ele nos rejeita, quais somos, e assim nos confirma quais não somos. É assim que o velho homem, sendo rejeitado, pode morrer a fim de que possa ocorrer a implantação de um novo homem 
Como velho homem somos a humanidade, a raça, o mundo e estamos firmemente assentados, de um lado desde a causalidade da queda do primeiro homem, e do outro, até a propagação extrema dessa queda a toda a humanidade.  Este é o homem qual o conhecemos e qual somos: o homem que está sob a ira de Deus. Mas também o novo homem, o que não é, e aquele que eu sou, o homem justificado por Deus está sob a ira de Deus. 
Como novo homem estamos colocados no limiar de um novo mundo. O mundo é a totalidade de nossa existência, conforme está caracterizado pelo pecado. Ele consiste numa parte exterior, fora de nós destacada de nosso interior, um Cosmos que não é criação porque já não conhecemos o seu Criador e, de outra parte, interior, que está em nós e se espelha e se projeta, por sua vez, no Cosmos que está ao redor de nós.  
O mundo do ser humano é o mundo temporal e da matéria, é o mundo da separação, da reunião e da contradição, é o mundo do contraste entre o espírito e a natureza, entre o idealismo e o materialismo, entre a alma e o corpo. E o mundo da autossuficiência que anseia pela sua independência de Deus, e das realidades, é o mundo dos poderes, dos tronos e dos principados e potestades. Este mundo é co-prisioneiro do homem.  
Sendo dos humanos, este mundo participa, involuntariamente dos seus erros, de sua conduta displicente, da destruição do relacionamento da vida com Deus, que os humanos promovem, e da relativa divindade que os humanos criam e que constitui o motivo da sua grandeza e ruína.  A enfermidade dos humanos é, também, a do mundo. O humano precisa descobrir, para seu próprio pesar, que este Cosmos é o seu Cosmos. Este mundo por ser nosso é aquele no qual o pecado achou entrada. 
A vida em Deus é invisível, é impossível neste mundo. Todas as coisas deste mundo dos humanos, a materialidade, as realidades e os objetivos são mundaneidades eudeusadas ou divindade mundanizada. O pecado é justamente a troca de Deus pelo homem, e vice-versa; é o eudeusamento do homem ou a humanização de DeusPecado é a manifestação do Cosmos contra o ato de criação, é a oposição da existência e do modo de ser do humano contra o verdadeiro ser, é a oposição da criatura em relação ao seu Criador. 
A glória do Criador somente brilha neste mundo naquilo e à medida em que delimita e define a autossuficiência e a culpa das coisas, somente no alcance do seu conceito crítico, portanto, na questionabilidade de tudo quanto o humano faz, na possibilidade e na necessidade de sua supressão, na sua negação. A glória do Criador brilha, ainda, na medida da faculdade que as coisas humanas, tiverem de, dentro do que são, testemunhas do que não são.  Sendo que a vida em Deus é impossível neste mundo, a redenção só pode vir com a criação de um novo mundo: de novos céus e nova terra. 

VI. ROMANOS 6: A GRAÇA 

Numa relação dialética rigorosa vemos juntos o velho e o novo mundo, a soberania da morte e a soberania da graça A graça divina é o reino, a soberania, o poder e o domínio de Deus sobre o ser humano. A graça é perdão cuja continuidade depende exclusivamente da vontade de Deus. A graça ataca o pecado pelas raízes, a graça se opõe ao pecado da queda e fala a nós como aqueles que ainda não somos, como novas criaturas. Pela graça, Deus ignora o que realmente somos no mundo, pela graça Deus nos vê como não-pecadores. 
Em união com Cristo, fomos sepultados no batismo da morte e assim como Cristo ressuscitou, nós ressurgimos para a vida. É o poder da ressurreição que provê o conteúdo divino que existe na vida do humano renascido e que preenche a vacuidade que a morte de Cristo suscita. É o poder da ressurreição que restringe a nossa disposição para pecar, é este poder que torna impossível à nova criatura continuar vivendo em pecado. A graça é a refutação de todas as possibilidades humanas, a refutação fundamental da determinação do pecado. Ter a graça divina significa submeter-se à refutação de Deus, prestando-lhe obediência.  
Graça é obediência. Assim, a graça nos concede o poder da obediência, este poder da obediência é a graça divina que anula o pecado e, juntamente com ele, todas as possibilidades, recursos e meios que a criatura humana imagina ter, ou cria e desenvolve, para se aproximar de Deus, e ganhar a vida eterna. A graça é o poder da obediência, ela é teoria e prática, entendimento e ação. A graça é um imperativo categórico, um mandamento de força decisiva que não pode ser desobedecido. A graça é o conhecimento da vontade de Deus. A graça é a supressão do pecado 
A graça divina, no entanto, não significa que o ser humano possa ou deva fazer alguma coisa, nem tampouco que ele nada deva ou possa fazer. Graça divina significa que Deus faz alguma coisa, porém não tudo. Deus faz algo específico: Ele nos perdoa. Graça é autoconscientização da nova criatura, a resposta à interrogação de nossa existência. Graça significa que Deus conta a existência humana reivindicando-a para si. A graça é o poder de Deus sobre o humano uno e indivisível, é a verdade divina para o indivíduo em toda a extensão de seu ser e de sua existência, justamente por ser, e na medida em que for, a sua crise radical. Graça é o relacionamento de Deus com o humano, com o Deus que diz SIM. 

VII. ROMANOS 7: A LIBERDADE 

Sendo humana, a religião é também uma possibilidade restrita, limitada que, em sua estreiteza e ineficácia, assegura e autentica a liberdade de Deus em conceder graça. Vemos na restrição das possibilidades religiosas que a liberdade na qual nos é dada a graça está justamente está justamente para além da religião. A liberdade que Deus tem para conceder graça, sem levar em conta preconceitos e conceitos humanos, é uma impossibilidade absoluta para os humanos que só se torna possível em Deus, sem ser atingida pela dubiedade da religião. A limitação da religião coincide com a limitação das possibilidades humanas. 
A pessoa religiosa pode apresentar a mais positiva expressão do conteúdo divino na realidade humana e pode, também, abrigar o mais amplo desdobramento da negação humana à realidade de Deus. O religioso é sempre positivo e negativo, é positivo justamente por ser negativo. Ele é positivo porque testifica o conteúdo divino na realidade humana e é negativo mediante o confronto de sua natureza humana, com a realidade de Deus. Paradoxalmente, é justamente na religião que não se toma consideração de Deus, porque o que nela se apresenta é sempre outra coisa, o que a religião apresenta não é o SIM divino. O Deus que a religião apresenta é um Deus que não é livre, que não é vitorioso, este é um não-Deus, o Deus deste mundo.  
Assim, não é como pessoas religiosas que alcançaremos a liberdade. A pessoa religiosa, como o ser humano como tal, é carnal, seu pensamento, sua vontade e suas obras pertencem ao mundo e são da mais alta pecaminosidade e impiedade. A religião é uma atividade humana que está contida no mundo do pecado. A pessoa religiosa que se considera reta é uma pessoa existencialmente sem Deus. Justamente a religião serve de alavanca, de meio ao pecado, serve como seu capital operacional, como ponto de apoio que visa afastar o humano de Deus, colocando o humano em oposição a Deus. A pessoa religiosa é pecadora justamente por ser religiosa. Ser religioso significa ser criatura despedaçada, em desarmonia consigo mesmo, sem paz. 
É pela liberdade de Deus que não nos preocupamos com a relatividade de nossas experiências e de nossa história religiosa. É pela liberdade de Deus que a criatura alcança o instante supremo e eterno quando ela reconhece a Deus como seu Criador e vê na ressurreição o seu Salvador. 

Clique (aqui) para ler o resumo da segunda parte. 

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