TEMOR E TREMOR (RESUMO)
O
que se segue é um resumo do livro “Temor
e Tremor” de Søren Kierkegaard,
teólogo e filósofo dinamarquês considerado o primeiro filósofo da existência. Seu livro trata do paradoxo da fé tendo por
base a história da prova de Abraão. São discutidos três problemas: (i) se há uma suspensão da moral; (ii) se há um dever absoluto diante de
Deus e (iii) se a atitude de
silêncio de Abraão diante de Sara, Isaque e Eliézer pode ser justificada. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original.
A PROVA DE ABRAÃO
“Passado algum tempo, Deus pôs Abraão à prova,
dizendo-lhe: ‘Abraão!’ Ele respondeu: ‘Eis-me aqui’.
Então disse Deus: ‘Tome seu filho, seu único
filho, Isaque, a quem você ama, e vá para a região de Moriá. Sacrifique-o ali
como holocausto num dos montes que lhe indicarei’. Na manhã seguinte, Abraão
levantou-se e preparou o seu jumento. Levou consigo dois de seus servos e
Isaque seu filho. Depois de cortar lenha para o holocausto, partiu em direção
ao lugar que Deus lhe havia indicado.
No terceiro dia de viagem, Abraão olhou e viu o
lugar ao longe.
Disse ele a seus servos: ‘Fiquem aqui com o
jumento enquanto eu e o rapaz vamos até lá. Depois de adorarmos, voltaremos’.
Abraão pegou a lenha para o holocausto e a
colocou nos ombros de seu filho Isaque, e ele mesmo levou as brasas para o
fogo, e a faca. E caminhando os dois juntos,
Isaque disse a seu pai Abraão: ‘Meu pai!’ ‘Sim, meu filho’, respondeu Abraão. Isaque perguntou: ‘As brasas e a lenha estão aqui, mas onde está o cordeiro para o holocausto?’
Respondeu Abraão: ‘Deus mesmo há de prover o cordeiro para o holocausto, meu filho’. E os dois continuaram a caminhar juntos.
Isaque disse a seu pai Abraão: ‘Meu pai!’ ‘Sim, meu filho’, respondeu Abraão. Isaque perguntou: ‘As brasas e a lenha estão aqui, mas onde está o cordeiro para o holocausto?’
Respondeu Abraão: ‘Deus mesmo há de prover o cordeiro para o holocausto, meu filho’. E os dois continuaram a caminhar juntos.
Quando chegaram ao lugar que Deus lhe havia
indicado, Abraão construiu um altar e sobre ele arrumou a lenha. Amarrou seu filho
Isaque e o colocou sobre o altar, em cima da lenha.
Então estendeu a mão e pegou a faca para
sacrificar seu filho.
Mas o Anjo do Senhor o chamou do céu: ‘Abraão! Abraão!’ ‘Eis-me aqui’, respondeu ele. ‘Não toque no rapaz’, disse o Anjo. ‘Não lhe faça nada. Agora sei que você teme a Deus, porque não me negou seu filho, o seu único filho.’”
Mas o Anjo do Senhor o chamou do céu: ‘Abraão! Abraão!’ ‘Eis-me aqui’, respondeu ele. ‘Não toque no rapaz’, disse o Anjo. ‘Não lhe faça nada. Agora sei que você teme a Deus, porque não me negou seu filho, o seu único filho.’”
- Gênesis 22.1-13
Teremos como propósito extrair dessa
história, sob forma problemática, a dialética que comporta para ver que
inaudito paradoxo é a fé, paradoxo capaz de fazer de um crime
um ato santo e agradável a Deus, paradoxo que devolve a Abraão o seu filho, paradoxo
que não pode reduzir-se a nenhum raciocínio, porque a fé começa precisamente onde acaba a razão.
PROBLEMA I: Há uma suspensão teleológica
da moralidade?
A moralidade, em si, está no geral, e a este título é aplicável a
todos, sendo um fim em si mesma e sendo ela mesma o fim (telos) de todas as coisas. A tarefa do indivíduo está em despojar-se
de seu caráter individual a fim de alcançar a generalidade.
A fé¸
por outro lado, é justamente aquele paradoxo
segundo o qual o Indivíduo se encontra como tal acima do geral, é o Indivíduo quem, depois de ter estado como tal
subordinado ao geral, alcança ser agora, graças ao geral, o Indivíduo, e como
tal superior a este; de maneira que o Indivíduo como tal encontra-se numa
relação absoluta com o absoluto. Reivindicar a individualidade frente ao geral
é cometer pecado.
Assim é preciso responder afirmativamente
à questão: A história de Abraão comporta uma suspensão teleológica da moralidade.
A moral
impõe a Abraão o
dever de amar o seu filho. Por meio de seu ato, Abraão suspendeu a
moral porque tinha um fim (telos) para
além dela. Como Indivíduo, superou o
geral, sem cometer pecado. Isso permanece como um paradoxo inexplicável, é algo
que não pode ser compreendido. A fé é um milagre; no entanto ninguém dela está
excluído; porque é na paixão que toda a vida humana encontra a sua unidade, e
a fé é uma paixão. A fé é a mais alta paixão de todo homem, o mais alto
que o homem pode alcançar.
PROBLEMA II: Há
um dever absoluto para com Deus?
A moralidade é o geral e, como tal,
também o divino, de modo que todo o dever é, no fundo, dever para com Deus. No
entanto, o dever não nos coloca em relação com o divino. A moralidade faz o indivíduo despojar da sua interioridade, para a exprimir em algo de exterior. Todas as
vezes em que se apega a um sentimento interior, peca ou entra em crise. O
paradoxo da fé consiste em que há uma interioridade incomensurável em relação à
exterioridade,
No âmbito da fé, o Indivíduo é superior
ao geral, o Indivíduo determina a sua relação com o geral tomando como
referência o absoluto. Na história de Abraão, do ponto de vista moral, a
relação que mantém com Isaque exprime-se dizendo que o pai deve amar o filho.
Esta relação moral está referida ao relativo e opõe-se à relação absoluta com
Deus. Pode-se dizer, nesse sentido, que há um dever absoluto para com Deus, porque,
nesse dever, o Indivíduo se refere como tal absolutamente ao absoluto e, sendo
esse dever absoluto, a moral é rebaixada ao relativo.
PROBLEMA III: Pode moralmente justificar-se
o silêncio de Abraão perante Sara, Eliézer e Isaque?
Definido como ser imediatamente
sensível e psíquico, o Indivíduo é ser
oculto e do ponto de vista da moral, ele deve se libertar do oculto e se manifestar
no geral. A Moral exige a manifestação e pune o oculto. A moral condena guardar silêncio, mas foi justamente
isso o que Abraão fez, não falou a Sara, a Eliézer, nem a Isaque.
Nesse caso, mais uma vez vemos a
presença do paradoxo. O Indivíduo se encontra acima da moral em sua relação com
o absoluto. Abraão cala-se porque não pode falar; nesta impossibilidade reside
a angústia. Isso se dá porque a atitude
de fé de Abraão não poderia ser compreendida por ninguém de modo que ele nada
poderia falar, portanto Abraão não falou. Nesse sentido, a angústia do paradoxo
reside no silêncio: Abraão não pode falar.
A atitude de Abraão está além da
possibilidade de compreensão. Abraão permaneceu fiel no seu amor a Deus, aquele
que ama Deus não tem necessidade de lágrimas nem de admiração; esquece o
sofrimento no amor, e tão completamente que não deixará atrás de si o mínimo traço
de dor, se não fosse o próprio Deus a recordar-lhe; porque vive no oculto,
conhece a angústia, conta as lágrimas e nada esquece.
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