O DESESPERO HUMANO (RESUMO)
O que se segue é um resumo do livro O Desespero Humano de Søren Kierkegaard. Kierkegaard foi o
primeiro teólogo e filósofo existencial, seu livro trata do desespero como uma
doença mortal, um “eternamente morrer” e do pecado como condensação do
desespero. O resumo segue, em geral, a própria divisão do livro. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original.
PARTE I: A DOENÇA
MORTAL É O DESESPERO
LIVRO I — O DESESPERO É A DOENÇA
MORTAL
1.
DESESPERO COMO DOENÇA DO ESPÍRITO
O homem é espírito e por espírito entende-se o eu. O eu é uma relação que se orienta em sua própria interioridade,
um voltar-se para si mesmo. O homem é uma síntese de infinito e de finito, de
temporal e de eterno, de liberdade e de necessidade, o eu surge como terceiro
termo da síntese alma-corpo. Isto é, o espírito (eu) surge quando a relação
alma-corpo conhece a si própria, de modo que se estabelece uma terceira
relação.
A partir disso pode-se falar do desespero
de duas formas: como desespero de não
querermos ser nós próprios ou como vontade
desesperada de sermos nós próprios. O desespero só é extirpado quando
orientando-se para si próprio, querendo ser ele próprio, o eu mergulha até o
poder que o criou.
2. DESESPERO VIRTUAL E DESESPERO
REAL
O desespero é dialeticamente tanto uma
vantagem quanto uma imperfeição. É uma vantagem
porque ele é o que nos distingue dos animais e revela nossa espiritualidade
sublime, mas é uma imperfeição quando
se converte numa fuga do real. O desespero
virtual se dá quando eu se depara com sua impotência e busca negar-se, já o
desespero real é aquele no qual há
uma aceitação de si e um abrir-se às possibilidades.
3. O DESESPERO É A DOENÇA MORTAL
Por
doença mortal entende-se um mal que termina pela morte, mas em um certo sentido
quando se diz que o desespero é uma doença mortal quer-se dizer paradoxalmente
que seu mal está em não poder morrer. O desespero é uma tortura agonizante que
não se deixa acabar, é a impossibilidade da última esperança, a impossibilidade
de morrer. O desespero é um eternamente morrer que nuca acaba, que nunca morre.
LIVRO II – A UNIVERSALIDADE DO
DESESPERO
Não existe um único homem que esteja
livre do desespero. Até mesmo estar inconsciente do próprio desespero é uma
forma de desespero. O desespero é precisamente a inconsciência em que os homens
estão do seu destino espiritual. Essa falsa despreocupação com o próprio
destino espiritual, essa falsa satisfação em viver é o próprio desespero.
LIVRO III: PERSONIFICAÇÕES DO
DESESPERO
1. DESESPERO CONSIDERADO QUANTO AOS
FATORES DA SÍNTESE DO EU
O eu é a síntese consciente de infinito e de Finito. O eu está em evolução a
cada instante da sua existência, não tem existência real, e não é senão o que
será. Enquanto não consegue tornar-se ele próprio, o eu não é ele próprio; mas
não ser ele próprio é o desespero. Em toda a vida humana que se julga já
infinita, e o quer ser, cada instante é desespero. Porque o eu é uma síntese de
finito que delimita e de infinito que ilimita. Carecer de infinito comprime e
limita desesperadamente.
O eu também é liberdade, como síntese do necessário
e do possível. O eu é necessidade, porque é ele próprio, e possível, porque
deve realizar-se. O possível se dá em forma de desejo nostálgico e de melancolia
imaginativa. O Cristianismo ensina que a salvação é impossível para o
homem, mas para Deus tudo é possível. Assim, o crente põe a sua fé em que Deus pode a todo instante. Já o determinista e
o fatalista se desesperam porque para eles só há a necessidade.
2. DESESPERO VISTO SOB A CATEGORIA
DA CONSCIÊNCIA
Quanto maior a consciência, maior o
desespero. O diabo que tem consciência absoluta de seu estado experimenta o
desespero mais intenso de todos. Enquanto que quando há ignorância e
inconsciência, o desespero está em menor grau. Quanto mais se possui uma exata ideia
do desespero, mais se desespera.
Há pessoas que cometem suicídio num estado de alma indeciso e
obscuro, estes se encontram num estado de desespero menos intenso do que aquele
em que alguém se mata com a consciência de que matar-se é um ato de desespero.
Assim, o desespero aumenta à medida que se aumenta a consciência do eu. O
contrário do desespero é a fé, que
como já dito, ocorre quando o eu descendo em si próprio, querendo ser si
próprio, mergulha através da sua própria transparência no poder que lhe deu
existência.
Já distinguimos duas formas de
desespero: o de ser si próprio e o de não se quer ser si próprio. O desespero de não querer ser si próprio pode
ser chamado de desespero-fraqueza (desespero
de ser fraco, no qual o desesperado aspira a não ser ele próprio) e pode se dar
como: (i) desespero de uma coisa
temporal: sofrer passivo do eu por causa de uma opressão que vem de fora.
(ii) desespero ante a própria
eternidade: que é um sofrimento ante a consciência da própria fraqueza.
O desespero
por querer ser si próprio, por sua vez pode ser chamado de desespero-desafio (o querer ser si
mesmo custe o que custar). Esse
desespero exige a consciência de um eu
infinito que o desesperado quer ser. Com o auxílio dessa forma infinita o eu
quer, desesperadamente, dispor de si, ou, criador de si próprio, fazer do seu
eu o eu que escolhe ser de modo a construir ele próprio o seu eu.
PARTE II: DESESPERO E
PECADO
LIVRO IV – O DESESPERO E O PECADO
1. AS GRADAÇÕES DA CONSCIÊNCIA DO EU
Pecamos quando perante a ideia de Deus nos desesperamos, quer não
querendo ser nós próprios, quer querendo ser nós próprios. O pecado é a condensação do desespero,
sendo o pecado, assim, uma categoria do espírito. O eu diante de Deus pode ser
chamado de eu teológico.
Sendo o pecado cometido contra Deus,
ele é elevado a um infinito de potência. O desespero condensa-se à proporção da
consciência do eu; mas o eu condensa-se à proporção da sua medida, e, quando
esta medida é Deus, condensa-se infinitamente. Só a consciência de estar
perante Deus faz do nosso eu concreto, individual, um eu infinito; e é esse eu
infinito que então peca perante Deus.
2. A DEFINIÇÃO SOCRÁTICA DE PECADO
Segundo Sócrates, pecar é ignorar. O defeito dessa definição está
em deixar vago o que se entende por ignorância. Se o pecado for entendido como
ignorância, ele não existe, pois seria, como Sócrates pensa, impossível cometer
uma injustiça sabendo o que é injusto.
Para o Cristianismo, o pagão sem a
Revelação não pode saber o que é pecado de modo que é a doutrina do pecado que
cria uma diferença radical entre o paganismo e o Cristianismo. Se
torna necessária uma revelação de Deus para instruir o homem sobre a natureza
do pecado.
Assim, é natural que não encontremos
entre os pagãos uma definição exata de pecado. Os gregos eram demasiado
ingênuos para chegarem a compreender que alguém poderia cometer injustiça mesmo
conhecendo o justo. Para o cristão, no entanto, o pecado está na vontade e não no conhecimento; e esta
corrupção da vontade ultrapassa a consciência do indivíduo.
3. O PECADO NÃO É UMA NEGAÇÃO, MAS
UMA POSIÇÃO
O pecado não pode ser reduzido a uma
mera negação, fraqueza, finitude ou ignorância, o pecado é uma posição. O pecado é uma posição, e o
que tem de positivo é precisamente o estar perante Deus. Aqui o Cristianismo
produz um paradoxo, pois estabelece de forma tão sólida a natureza positiva do
pecado, que parece impossível eliminá-lo, mas o Cristianismo também ensina a
doutrina da Redenção, que ensina a completa eliminação do pecado.
LIVRO V – A CONTINUAÇÃO DO PECADO
1. O PECADO DE DESESPERAR DO SEU
PECADO
O estado contínuo do
pecado é ele mesmo um pecado, isto é, permanecer no pecado é pecar. O pecado é
desespero, e o que eleva a sua intensidade é o novo pecado de desesperar do seu
pecado. Desesperar do pecado é tentar manter-se caindo cada vez mais, é um
afundar-se ainda mais no pecado.
2. O PECADO DE DESESPERAR QUANTO À
REMISSÃO DOS PECADOS
Aqui o eu se encontra diante de Cristo,
mas mesmo assim se desespera. O eu se apega à ideia de que é impossível que os
pecados sejam perdoados, ele se escandaliza
ante a ideia de que Cristo possa perdoar pecados e assim o escândalo eleva
o pecado a um grau superior e esquece-se que o próprio escândalo é um pecado.
3. O PECADO DE NEGAR O CRISTIANISMO
Esse é o pecado contra o Espírito Santo, o mais alto grau de desespero, é a
negação do Cristianismo que passa a ser considerado uma mera fábula. O pecado
contra o Espírito Santo é o pecado que ataca. Tratar o cristianismo como fábula
e mentira é tratar de igual modo a Cristo. Este é o pecado elevado à sua
suprema potência, é a blasfêmia contra o Espírito Santo: assim como os judeus
diziam que Cristo expulsava os demônios por meio do poder do Diabo, assim
também este pecado faz de Cristo uma invenção do demônio.
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