CRÍTICA DA RAZÃO PURA (RESUMO)
O que
se segue é um breve resumo da Crítica da
Razão Pura. A Crítica
da razão pura é uma crítica realizada pela Razão pura sobre as pretensões da
razão pura. Foi escrita pelo filósofo prussiano Immanuel Kant, cuja
teoria do conhecimento operou uma grande revolução no pensamento filosófico. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original.
INTRODUÇÃO
Por razão, compreende-se a faculdade que conecta os juízos do entendimento e unifica nosso conhecimento. Por entendimento compreende-se a faculdade que forma conceitos dos objetos e faz juízos sobre eles. A função do entendimento é pensar e pensar é combinar representações.
Todos as
nossas representações são produzidas por objetos que afetam nossos sentidos. A
capacidade de receber os efeitos que um objeto tem sobre nós é chamada de sensibilidade.
A função da sensibilidade é intuir. A intuição é
a receptividade da mente que
permite a um objeto individual ser dado ao conhecimento. Assim, o
conhecimento requer intuição e pensamento. Todo o nosso conhecimento começa pelos sentidos, daí passa ao
entendimento e termina na razão.
O conhecimento
pode ser distinguido entre conhecimento a posteriori (ou
conhecimento empírico)
e conhecimento a priori. O conhecimento a
posteriori ou conhecimento empírico é aquele que tem
sua origem na experiência. O conhecimento a priori é aquele
que é adquirido independentemente de qualquer experiência. O
conhecimento a priori pode ser (i) puro: é aquele
que não possui absolutamente nada de empírico ou (ii) impuro: é
aquele que depende de alguns outros conhecimentos adquiridos anteriormente pela
experiência. A Razão pura é, por isso, a que contém os
princípios para conhecer algo absolutamente “a priori”.
Nossos juízos
(que conectam um sujeito ao predicado) podem ser distinguidos entre analíticos ou sintéticos. Os juízos
analíticos são aqueles nos quais o predicado está contido no conceito
e os juízos sintéticos são aqueles que conectam ao conceito
uma predicação não incluída no conceito em questão. Eles podem ser (i) a
priori: proposições válidas e necessárias por si mesmas. (ii)
a posteriori: que por dependerem da experiência não podem ser
universais. A indução (tentar estabelecer leis universais com
base na experiência), portanto, sempre é uma generalidade suposta e relativa.
Estabelecidas esses conceitos introdutórios,
este trabalho tratará da sensibilidade (Estética
Transcendental), do entendimento (Lógica
Transcendental) e da questão do método (Doutrina
Transcendental do Método), cada uma dessas seções apresentam subdivisões
próprias conforme a complexidade dos temas tratados.
ESTÉTICA TRANSCENDENTAL
Por Estética entende-se a
ciência das regras da sensibilidade em geral e por Transcendental entende-se
a pesquisa que investiga as condições de possibilidade da própria experiência.
Assim, a Estética transcendental é ciência de
todos os princípios “a priori” da sensibilidade, isto é, das formas necessárias
da intuição, que são o Espaço e o Tempo. Nossa
intuição a respeito do espaço e tempo são a priori, isto é,
independente do conteúdo particular das sensações que recebemos de qualquer uma
das coisas. Nós representamos os objetos como estando fora de nós e colocados
todos no espaço. A ciência que determina sinteticamente e a
priori as propriedades do espaço é a Geometria.
O
espaço, como forma pura de todas as intuições externas, só serve como condição
“a priori”, para os fenômenos exteriores, o mesmo não ocorre com o tempo que
também se aplica aos fenômenos interiores, isto é, às nossas representações.
Assim, todos os fenômenos (internos e externos) são determinados segundo
relações de tempo. O espaço e o tempo, sendo formas da intuição, não possuem
realidade absoluta, isto é, não são propriedades das coisas em si.
LÓGICA TRANSCENDENTAL
A Lógica é a ciência
que examina as operações do entendimento. Ela pode ser distinguida em:
(1) Lógica Elementar: examina as operações
particulares do entendimento, contendo as regras para pensar retamente sobre
certos objetos determinados. (2) Lógica Geral: examina
as operações gerais do entendimento, contendo as regras absolutamente
necessárias do pensar. A lógica geral pode ser: (i) pura: que
tem por objetivo apenas os princípios a priori do entendimento,
ou (ii) aplicada: trata das regras do uso do entendimento sob
condições empíricas e subjetivas. A lógica geral, no entanto, não examina a
origem do nosso conhecimento, desconsiderando os conteúdos provenientes da
experiência e limitando-se às regras do pensamento. A Lógica que considera a
questão da origem do nosso conhecimento e do conteúdo de nossas representações
é a Lógica Transcendental.
A Lógica
Transcendental é a Ciência que trata com os objetos do conhecimento
como fenômenos constituídos pelo modo como o entendimento os pensa enquanto
condições a priori para a possibilidade da experiência em
geral. Ela pode ser dividida em: (1) Analítica Transcendental: é
a parte da lógica transcendental que expõe os elementos do conhecimento puro do
entendimento e os princípios sem os quais nenhum objeto em geral pode ser
pensado. (2) Dialética Transcendental: trata dos princípios
derivados da razão, tendo como objetivo expor as ilusões dialéticas na
metafísica, corrigindo seus erros.
ANALÍTICA
TRANSCENDENTAL
A função do
pensamento no juízo compreende: (1) um
“sujeito” que pode ser, em relação à Quantidade, universal ("Todo
S"), particular ("Alguns S") ou singular ("Um
S"), (2) uma cópula (é) que
pode ser, quanto à Modalidade, problemática ("é
possivelmente"), assertória ("é efetivamente")
ou apodítica ("é necessariamente"), (3) um “predicado” que
quanto à qualidade pode ser positivo (“é P”), negativo (“não
é P”) ou infinito (“é não-P”).
A partir
disso pode ser construído três tipos de silogismo, que são, quanto à Relação: categórico,
hipotético ou disjuntivo. Esses princípios básicos do
raciocínio lógico são expressos abaixo:
A partir disso
é possível elaborar à “Tábua dos Juízos”, como mostra a imagem
abaixo:
Para além
dessas regras básicas de Lógica, a Lógica Transcendental deve considerar
os conceitos puros intelectuais
que se referem “a priori”, aos objetos. Esses conceitos são denominados de
“categorias”. Assim, a partir da Tábua dos Juízos, pode-se elaborar uma “Tábua
das Categorias”, que é como se segue:
As doze
categorias já apresentadas na “Tábua das Categorias” correspondem às
formas de nosso juízo de modo que elas se aplicam necessariamente a qualquer
objeto possível que nos seja dado através da intuição sensível.
Dedução
Transcendental
Ao pensar os conceitos a priori, precisa ser colocada a
questão de se temos o direito de usar tais conceitos a priori enquanto
tais não importando o que os fatos possam ser. A pergunta que conduz à reposta
dessa questão é chamada de Dedução. Assim, Dedução Transcendental é
a tarefa cujo objetivo é estabelecer como os conceitos a priori podem
ser legitimamente aplicados aos objetos da experiência. Entende-se por “experiência” uma
sucessão de conteúdos distinguíveis que estão presentes ao mesmo sujeito
através do tempo no qual aparecem.
Sendo assim, a
experiência exige minimamente que se trate de um sujeito
idêntico que apreende uma série de conteúdos em um intervalo de tempo. Os
conteúdos experienciados são sintetizados em três passos:
(1) Síntese da Apreensão: na
própria intuição, os elementos da série são reunidos pelo sujeito.
(2) Síntese da Reprodução: Os
elementos reunidos são reproduzidos de maneira ordenada, isso significa que nos
próprios conteúdos há algo que permite essa combinação entre eles.
(3) Síntese do Reconhecimento: O
conteúdo reproduzido é reconhecido como pertencente a um conceito comum.
Na síntese do
reconhecimento, nossa conceitualização se dá na forma de um juízo,
isto é, na forma da aplicação de um predicado ao objeto apreendido. A objetividade ou validade
universal de um juízo é dada pela cópula “é” que une o
sujeito ao predicado, ligando necessariamente as nossas representações umas às
outras em virtude da unidade necessária da apercepção. A “apercepção” é
o princípio interno que nos permite atribuir as nossas experiências a um mesmo
sujeito idêntico.
A
condição da sensibilidade que nos possibilita aplicar um conceito a um objeto é
o “esquema”. Ao julgar um objeto dado o comparamos com imagens (esquemas)
reproduzidas de experiências passadas com objetos semelhantes e, assim,
classificamos o objeto em um conceito. Um conceito, portanto, é a combinação de
representações sobre um conceito comum.
Na
experiência, tudo (quanto possa apresentar-nos como objeto) se encontra
necessariamente submetido a princípios, a fonte de tais princípios encontra-se
no entendimento puro. Todas as leis da natureza se encontram submetidas a esses
princípios que são quatro como mostra a “Tábua dos Princípios”.
A Tábua das Categorias dá-nos
uma indicação muito natural sobre a Tábua dos Princípios, pois estes não são
mais que regras para o uso objetivo daquelas. Esclarecendo cada um dos
princípios:
(1) Axiomas da Intuição: Todas as
intuições são Quantidades extensivas no espaço e no tempo.
(2) Antecipações da Percepção: Em
todos os fenômenos o real, que é um objeto da sensação, tem uma Qualidade intensiva,
isto é, um grau de influência nos sentidos.
(3) Analogias da Experiência: Toda
mudança no mundo empírico envolve certas Relações ou conexões
necessárias. São três as analogias (ou princípios) da experiência:
(i) Princípio da Permanência da
Substância: Toda mudança é uma alteração de uma substância que
permanece, cuja quantidade não aumenta ou diminui.
(ii) Princípio da Sucessão no Tempo segundo
a Lei da Causalidade: Todas as mudanças acontecem de acordo com leis
causais necessárias, determinando que o estado que é anterior no tempo seja
necessariamente sucedido por um estado posterior.
(iii) Princípio da Simultaneidade segundo a
Lei da Comunidade: Todas as substâncias enquanto possam ser
percebidas como simultâneas no espaço, estão em uma comunidade, isto é,
uma ação recíproca universal.
(4) Postulados do Pensamento
Empírico: Dizem respeito às três categorias da Modalidade que
não concernem aos objetos como tais, mas à relação de nosso entendimento deles:
(i) Possibilidade: Aquilo que está
de acordo com as condições formais (intuição e conceitos) da experiência
é possível.
(ii) Existência: Aquilo que está
de acordo com as condições materiais da experiência é real.
(iii) Necessidade: Aquilo cuja
conformidade com o real está determinado segundo as condições necessárias da
experiência é necessário.
Refutação do Idealismo
Este último princípio
traz a questão da existência das coisas, de modo que cabe aqui
uma refutação ao Idealismo. O Idealismo nega ou coloca em dúvida a existência
de objetos externos a nós no espaço ou no tempo. Tal idealismo é refutado se
considerarmos que nossa consciência dos objetos externos é imediata, uma
consciência que se dá por meio da intuição. Aquilo que intuímos de maneira
imediata precisa ser distinto de todas as nossas representações subjetivas.
Assim, temos também experiência e não apenas representação das coisas
exteriores. Mesmo as nossas representações internas só são possíveis mediante o
pressuposto da experiência externa.
Isso é diferente do Idealismo
Transcendental. O Idealismo Transcendental é a crença de
que temos conhecimento somente dos fenômenos,
não das coisas em si mesmas. Adotando o Idealismo Transcendental, precisamos
fazer a distinção entre fenômenos e númenos.
Por númeno entende-se
o “em si”, isto é, as coisas em sua própria natureza distintas da maneira pela
qual as intuímos. Por fenômeno
entende-se os objetos enquanto objetos dos sentidos. A coisa em si pode ser
entendida tanto em sentido negativo (como
aquilo que não é objeto de nossa intuição sensível) ou positivo (como objeto de um modo
particular de intuição, a intelectual, que, contudo, não possuímos). As coisas
em si mesmas se mantêm para nós incognoscíveis. Assim, se dissermos que os
objetos são tais quais aparecem isso só deve ser entendido enquanto se pensa
nos objetos enquanto objetos da experiência e não enquanto a coisa em si.
DIALÉTICA TRANSCENDENTAL
Há ilusões que possuem sua origem
na própria razão. Por Dialética entende-se
o raciocínio fundado em uma ilusão da razão. Como já dito, todo o nosso
conhecimento começa pelos sentidos, daí passa ao entendimento e termina na
razão. Aqui a razão é apresentada de forma distinta do entendimento. A razão é
a faculdade de unificar as regras
do entendimento por meio de princípios. A razão se dirige aos conteúdos de
conhecimento do entendimento a fim de lhes conferir uma unidade.
É importante distinguir dois
tipos de conhecimento: conhecimento imediato do conhecimento
por inferência. O conhecimento imediato é o conhecimento
daquilo que é evidente por si mesmo, já o conhecimento por
inferência é aquele que depende de uma operação intelectual de
concluir algo a partir de um princípio. A inferência pode ser de dois tipos:
(i) inferência do entendimento: quando a conclusão é
extraída diretamente dos princípios. (ii) inferência de razão: quando
além do conhecimento que serve de princípio, é necessário ainda outro juízo
para operar a conclusão. Como já considerado, existem três tipos de inferências
de razão: raciocínios categóricos, hipotéticos e disjuntivos.
A partir das categorias ou
conceitos a priori do entendimento, podemos
extrair os conceitos puros da razão. Os conceitos puros da razão recebem o nome
de ideias transcendentais. As ideias transcendentais
podem ser divididas em três classes. (i)
da unidade do sujeito pensante (alma)
(ii) da unidade do conjunto de todos
os fenômenos (mundo) (iii) da unidade da condição suprema de
tudo o que pode ser pensado (Deus).
No entanto, há raciocínios ilusórios que surgem da própria razão pura e
dos quais nem o mais sábio dos homens pode se libertar. Esses são os raciocínios
dialéticos. Os raciocínios dialéticos são de três tipos considerando
as três ideias transcendentais que conduzem à sua conclusão: (1) Paralogismo da Razão
Pura: inferência da unidade absoluta do sujeito. (2) Antinomia da Razão Pura: inferência
da totalidade absoluta da série de condições de um fenômeno dado em geral.
(3) Ideal da Razão
Pura: inferência da unidade absoluta de todas as condições da
possibilidade das coisas em geral.
(1) Paralogismo da Razão Pura
Um paralogismo é um raciocínio
falso quanto à sua forma. Aqui considera-se os raciocínios falsos em torno da
noção do sujeito pensante. São quatro os raciocínios ilusórios em torno da
noção do sujeito pensante:
(i) Paralogismo da Substancialidade: é a compreensão
do eu pensante como uma substância. No
entanto, deve-se contrapor a isso que o pensamento se define por um
ato, e não por propriedades.
(ii) Paralogismo da Simplicidade: é a compreensão
do eu pensante como simples, a unidade do
pensamento permitiria considerar o eu penso como simples e
indivisível. No entanto, a unidade do pensamento não implica a unidade do
sujeito pensante.
(iii) Paralogismo da Personalidade: consiste em
conceber o sujeito pensante como uma pessoa. A psicologia
racional infere a personalidade do ‘eu’ do fato de que eu sou consciente de
minha identidade durante o tempo. No entanto, a unidade da consciência através
do tempo é totalmente compatível com mudança de identidade da substância, pois
seria perfeitamente possível que substâncias numericamente distantes
comunicassem suas representações e consciências à seguinte.
(iv) Paralogismo da Idealidade: consiste em considerar
que o eu pensante é a única certeza indubitável e que todos os
fenômenos exteriores são duvidosos. Essa questão já foi considerada na Refutação
do Idealismo.
(2) Antinomia da Razão Pura
Ao pensar sobre o mundo como totalidade, a razão é
inevitavelmente conduzida a antinomias. Uma antinomia é um par de argumentos cujas conclusões são
contraditórias, envolvendo uma tese e uma antítese.
São quatro as antinomias da razão pura:
(i) Antinomia do Tempo e do Espaço
Tese: “O mundo tem um começo no
tempo e é finito no espaço.”
Antítese: “O mundo não tem começo e é infinito”
Antítese: “O mundo não tem começo e é infinito”
Segundo a tese, uma séria infinita no tempo é impossível de modo o mundo
precisa ter um começo, também seria impossível um espaço infinito pois é
impossível pensar em um mundo composto de infinitas partes. No entanto,
conforme a antítese, se o mundo começou
a existir, teria de haver um tempo no qual o mundo não existia., um tempo
vazio. Nada pode passar a existir num tempo vazio, porque nenhuma parte de
tempo em si pode fornecer de preferência às outras partes, condições para a
existência do mundo. Assim, o mundo não pode ter um começo e também precisa ser
infinito, sem limites.
(ii) Antinomia da Simplicidade:
Tese: “Toda a substância
composta, no mundo, é constituída por partes simples.”
Antítese: “Não existe nada no mundo que seja simples.”
Antítese: “Não existe nada no mundo que seja simples.”
Segundo a tese, uma decomposição de um objeto não pode prosseguir
infinitamente, de modo que um objeto composto precisa ser constituído por
partes simples irredutíveis. No entanto, conforme a antítese, toda substância ocupa um lugar no espaço, tudo
que se encontra no espaço é composto, de modo que não existem
substâncias simples.
(iii) Antinomia da Causalidade:
Tese: “A causalidade segundo as leis da natureza
não é a única, há ainda uma causalidade pela liberdade.”
Antítese: “Não há liberdade, tudo no mundo
acontece segundo as leis da natureza.”
Segundo a tese, a cadeia de causalidade naturais não pode ser uma série
infinita, é preciso haver uma causalidade da causa para além das causas da
natureza. Conforme a antítese, a
liberdade é contrária à lei da causalidade, pois todo começo pressupõe uma
causa anterior. A causalidade é o fio condutor de todas as regras e não se pode
pensar em um acontecimento livre da causalidade e das leis naturais.
(iv) Antinomia da Necessidade:
Tese: “Há um ser
absolutamente necessário que ou faz parte do mundo ou é sua causa”
Antítese: “Não existe
um ser absolutamente necessário”
Segundo a tese, as coisas do
mundo dependem de outras para existir, isto é, são contingentes. No entanto, se
tudo dependesse de algo para existir, cairíamos numa série infinita. Assim,
deve existir um ser necessário, que existe por si mesmo, do qual todas as
outras coisas dependem. Um ser necessário que tivesse causado o mundo
precisaria começar a agir a fim de criar o mundo, para começar a agir ele
precisaria estar subordinado ao tempo. Uma causa subordinada ao tempo
precisaria já fazer parte do mundo e tudo o que faz parte do mundo é
contingente. Portanto, não existe um ser necessário.
As duas primeiras antinomias são antinomias matemáticas porque envolvem
relações de espaço e tempo e de parte-todo, as duas últimas antinomias são antinomias
dinâmicas pois envolvem relações de dependência causal.
Tanto as teses quantos as antíteses das antinomias matemáticas são
falsas, já que elas pretendem tratar das coisas em si mesmas, ignorando que os
objetos correspondentes das nossas ideias sobre o mundo são fenômenos dados à
intuição. As determinações de espaço e tempo não pertencem às coisas em si.
No caso das antinomias dinâmicas, tanto a tese quanto a antítese podem
ser verdadeiras. Isso se dá porque em relação aos fenômenos não se pode
dar algo que não esteja submetido à dependência causal, no entanto. quando se
trata da coisa em si, não há contradição em se supor um ser simples e
necessário.
(3)Ideal da Razão Pura
Aqui entra em questão a noção de Deus enquanto condição suprema de tudo o que
pode ser pensando. Existem três tipos de provas da existência de Deus:
(i) Provas
Ontológicas: Sustentam que se Deus é Perfeito ele deve existir porque a
existência seria uma perfeição.
(ii) Provas Cosmológicas: Sustentam
que dado o fato de que o mundo é contingente, ele depende de uma Causa necessária para existir.
(ii) Provas Físico-Teológicas: Que defende
a existência de um Ser Inteligente considerando a ordem que encontramos no
mundo.
O argumento otológico erra ao considerar a existência como uma
perfeição. Ser ou existir não é uma perfeição que poderia pertencer à natureza
de uma coisa. Ser evidentemente não é um predicado real, é apenas a
posição de uma coisa, é simplesmente a cópula de um juízo.
O argumento cosmológico, por sua vez, pretende concluir a partir do
contingente, uma causa necessária. Tal argumento ignora que o princípio da
causalidade só possui validade de aplicação no mundo sensível. A prova cosmológica peca por aplicar a categoria da
causalidade fora do mundo da experiência.
Por fim, o argumento físico-teológico
que pretende concluir a existência de Deus com base na experiência
que temos de mundo, ignora que nenhuma experiência poderia fornecer material
suficiente para formar uma ideia tão elevada quanto a ideia de Deus.
Assim, por meio do uso especulativo da razão, Deus mantém-se como um simples ideal.
A existência de Deus não pode ser provada nem refutada por este meio.
DOUTRINA
TRANSCENDENTAL DO MÉTODO
A
doutrina transcendental do método diz respeito à determinação das condições
formais de um sistema completo da razão pura. Essa doutrina envolve (1) A
Disciplina da razão pura; (2) O Cânone da Razão Pura; (3) A arquitetônica da
Razão pura e; (3) A História da Razão Pura.
(1) Disciplina da Razão
Pura: A tarefa primordial da razão é disciplinar-se. Essa
disciplina diz respeito (i) ao uso "dogmático" da razão: no
uso especulativo da razão pura, não há dogmas, não lhe convém nenhum método
dogmático, daí o cuidado da Filosofia em não imitar o método matemático. (ii) uso
"polêmico" da razão: em todos os seus empreendimentos deve a
razão submeter-se à crítica, daí a importância da liberdade de expressão e de
um espaço compreensivo de discussão. (iii) das hipóteses da razão: a
liberdade deve incluir uma aceitação das opiniões, mas essas opiniões não podem
ser meros achismos, antes devem estar ligadas ao que é realmente dado e
portanto certo. A esse tipo de opinião mais rigorosa dá-se o nome de hipótese.
(iv) as provas da razão: a razão, mediante os seus conceitos, não se
deve orientar diretamente para os objetos, mas primeiro demonstrar a priori a validade objetiva dos
conceitos e a possibilidade da sua síntese. Por síntese entende-se o
chegar ao conhecimento das coisas que não estavam contidas nos próprios
conceito delas.
(2) Cânone da Razão Pura: As pretensões
da razão devem ser limitadas, mas não por uma censura externa, mas internamente
pela própria razão. Daí a necessidade de um cânone, um conjunto de
princípios que regule o uso legítimo das faculdades cognitivas em geral. A
Lógica Geral é o cânone para o entendimento e para a razão em geral, a
Analítica Transcendental é o cânone para o entendimento puro. Onde, porém, não
é possível nenhum uso legítimo de uma faculdade cognitiva não há cânone,
portanto, não há nenhum cânone do uso especulativo da razão
(3) Arquitetônica da Razão Pura: por
arquitetônica entende-se a arte dos sistemas. Sob o domínio da razão os
nossos conhecimentos em geral devem ser organizados em uma unidade sistemática.
As partes devem ser ordenadas em um esquema. O sistema de todo o
conhecimento filosófico é a Filosofia. A filosofia se divide em: (i) Filosofia
Pura: conhecimento pela razão pura e, (ii) Filosofia Empírica: conhecimento
racional extraído de princípios empíricos. A Filosofia Pura pode também ser
chamada de Metafísica. O sistema da metafísica se divide em: (i) Ontologia:
trata do entendimento e da própria razão sem considerar os objetos que
seriam dados (ii) Fisiologia Racional: considera os objetos
dados, sendo uma consideração racional da natureza. A Fisiologia da natureza
universal é a Cosmologia Racional e a Fisiologia e o conhecimento da
ligação de toda a natureza com um ser superior à natureza é a Teologia
Racional. Assim, o sistema inteiro da Metafísica
consta de quatro partes fundamentais: 1. A Ontologia.
2. A Fisiologia Racional. 3. A Cosmologia
Racional. 4.A Teologia Racional.
(4) História da Razão Pura: Na
História encontram-se diversas posições diferentes em relação à Metafísica.
Pode-se citar: (i) o Sensualismo: que considera apenas os objetos dos sentidos
como reais. (ii) o Intelectualismo: que considera que há nos sentidos
apenas aparências e considera que os verdadeiros objetos são apenas
inteligíveis. (iii) Empirismo: que considera que todo nosso conhecimento
deriva da experiência. (iv) Noologismo: que considera que os
conhecimentos puros têm sua fonte na razão. (v) Naturalismo: que
acredita que por meio da razão comum sem ciência, pode-se conseguir-se
muito melhores resultados no campo da Metafísica. (v) Cientificismo: que
observa o método científico, procedendo sistematicamente em relação à
metafísica.
Assim, até hoje a Metafísica permaneceu numa situação vacilante, entre
incertezas e contradições. Já teremos sido capazes de conduzir a razão humana
até à plena satisfação numa matéria que sempre ocupou a filosofia até hoje? A
via crítica está aberta, caberá ao leitor julgar.
Comentários