MEDITAÇÕES CARTESIANAS (RESUMO)
O que se segue é um resumo das Meditações
Cartesianas do filósofo alemão Edmund Husserl, pai da Fenomenologia, escola
filosófica que compreende o fenômeno como a coisa em si. São
cinco as meditações, a primeira
trata do eu transcendental, a segunda, das estruturas
gerais do campo da experiência transcendental,
a terceira, inicia
a discussão sobre os problemas constitutivos, a quarta, continua essa discussão e enuncia
o Idealismo Transcendental e a quinta e última meditação, trata da
intersubjetividade transcendental. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original.
INTRODUÇAO
A fenomenologia
transcendental é quase um neocartesianismo,
no sentido de ter concedido um desenvolvimento radical das meditações cartesianas.
Nas Meditações, Descartes coloca todas as coisas em
dúvida, para encontrar a certeza indubitável que sirva de fundamento absoluto da
Filosofia. Desse modo, Descartes propôs uma reforma da Filosofia e das
ciências. Essa reforma realiza-se, em Descartes, como uma filosofia orientada para o sujeito.
Quem quiser realmente tornar-se filósofo
deverá, primeiro, voltar para dentro de
si e colocar de lado tudo o que acredita e iniciar um processo de
reconstrução a fim de chegar ao saber verdadeiro. Colocado tudo fora de
circuito, tudo o que sobra é o eu puro.
E, nesse sentido, há um segundo voltar,
o “voltar-se para o eu das cogitações
puras”. A partir do eu penso,
Descartes deduzirá a existência de Deus e do mundo.
As Meditações
impõem, assim, a necessidade de um recomeço radical na filosofia, para isso
é preciso ressuscitar as meditações cartesianas a fim de efetuar um retorno ao eu puro, e fazer reviver em seguida os valores
eternos que dele decorrem. Esse é o caminho que conduziu à fenomenologia
transcendental e que pretendemos percorrer.
PRIMEIRA MEDITAÇÃO:
RUMO AO EU TRANSCENDENTAL
Iniciamos com um radicalismo do ponto de partida, no
sentido de colocar de lado nossas crenças, não aceitando como certas as
verdades da ciência e tendo como objetivo chegar a um fundamento absoluto do conhecimento. Por conhecimento entende-se as verdades demostradas ou os julgamentos estabelecidos.
O ato de
julgar é uma “intenção” e em geral uma simples presunção de que uma coisa
existe ou é de determinada maneira. A coisa julgada, nesse caso, aparece como coisa presumida. Outro tipo de
julgamento intencional é a evidência, nela,
a própria coisa encontra-se presente
diante da consciência, é portanto nela que se encontra a coisa em si.
Em cada evidência, o ser ou a
determinação de uma coisa é captada pelo espírito no modo “ela mesma” e com a
certeza absoluta de que esse ser existe, certeza que exclui a partir de então
qualquer possibilidade de dúvida. No entanto, a evidência não exclui a possibilidade
de seu objeto tornar-se, em seguida, objeto de dúvida: o ser pode revelar-se
uma simples aparência. Em contrapartida,
na evidência apodítica há uma
impossibilidade absoluta de que se conceba a não-existência de seu objeto.
É preciso dizer que a existência do
mundo não ocorre como uma evidência apodítica, de modo que o próprio mundo e sua
existência precisa ser colocado entre
parênteses. A isso damos o nome de suspensão
fenomenológica. Mas suspendendo nossas
crenças sobre o mundo, não nos encontramos diante do nada, antes nos vemos diante
do eu puro. O domínio do eu puro chama-se
domínio transcendental e o voltar-se
para esse domínio dá-se o nome de redução
fenomenológica transcendental.
No entanto, ao se instituir o eu transcendental é preciso tomar cuidado.
Descartes, por não tomar esse cuidado concebeu o eu como uma substância e como ponto de partida para
raciocínios de causalidade. A subjetividade transcendental precisa
ser compreendida em sua pureza, distinta da noção de alma, da noção de eu da
psicologia ou de outras noções das ciências.
SEGUNDA MEDITAÇÃO:
O CAMPO DE EXPERIÊNCIA
TRANSCENDENTAL E SUAS ESTRUTURAS GERAIS
Do ponto de vista do conhecimento, o ser
do eu transcendental precede qualquer existência objetiva. Há uma corrente de
consciência de múltiplas cogitações
que forma a vida desse eu. O modo de ligação que une um “estado” de consciência
a um outro, chama-se “síntese”. A
forma fundamental da síntese é a identificação,
a forma da consciência interna contínua
no tempo.
Todo estado de consciência em geral é,
em si mesmo, consciência de alguma coisa,
seja a existência de seu objeto real ou não. Nesse caso, a suspensão mantém
objeto fenomenológico (objeto da
consciência). Chamamos de intencionalidade,
essa particularidade fundamental que a consciência tem de ser sempre
consciência de alguma coisa. A análise
da consciência entendida como intencional é a análise intencional. Mas o objeto também é, de maneira correlata, objeto intencional, por ser
objeto da consciência. As descrições
em direção à consciência intencional
chama-se noética, enquanto a descrição em direção ao objeto intencional chama-se noemática.
É preciso fazer uma distinção entre atos de consciência e de outro os atos reflexivos. Os atos reflexivos são uma voltar da consciência para
seus próprios atos. Na reflexão natural somos colocados no terreno do
mundo apresentado como existente, o mundo da vida cotidiana. Já na reflexão fenomenológica transcendental, a existência ou não existência do
mundo é colocada fora de circuito (suspensão).
Assim, na experiência transcendental, a
consciência é examinada transcendentalmente reduzida. O eu que se volta para a
consciência como um espectador desinteressado desdobrando-se sobre si mesmo é o
eu fenomenológico.
Tanto para uma egologia transcendental descritiva como para uma psicologia de interioridade pura, ou
seja, uma psicologia descritiva baseada real e exclusivamente numa experiência
interna (indispensável como disciplina psicológica fundamental), só há começo
possível a partir do eu penso.
TERCEIRA MEDITAÇÃO:
OS PROBLEMAS CONSTITUTIVOS
Por constituição fenomenológica entende-se a constituição de um objeto intencional
em geral. Até aqui o objeto intencional tem sido pensado independente de se
considerar se ele existe ou não. O ser do mundo é transcendental à consciência,
mas essa transcendência constitui-se unicamente na vida consciência. Desse
modo, a realidade e transcendência do mundo são inseparáveis da subjetividade
transcendental. Na subjetividade se constitui qualquer espécie de sentido e de
realidade. Os objetos só existem para nós e só são o que são como objetos de
uma consciência real ou possível.
QUARTA MEDITAÇÃO:
DOS PROBLEMAS CONSTITUTIVOS AO IDEALISMO TRANSCENDENTAL
O eu existe por si mesmo, ele é existente para si mesmo como uma
evidência contínua e em consequência constitui continuamente a si mesmo como
existente. O eu é o polo idêntico dos estados vividos, como mônoda que contém o conjunto da vida
consciente. A teoria do eu nos leva à fenomenologia
genética, mas antes será preciso fazer uma nova reflexão sobre o método fenomenológico.
O método da redução fenomenológica nos
levou ao eu transcendental, agora
podemos falar do método da descrição
eidética, que busca analisar as estruturas
essenciais do eu transcendental. Uma fenomenologia
eidética depende da compreensão da gênese
universal do eu. O eu constitui-se para si mesmo em algum tipo de unidade
de uma história.
A gênese
constitutiva possui princípios universais que se apresentam sob duas formas
fundamentais: gênese ativa (o eu
intervém como fator que engendra, cria e constitui com a ajuda de atos
específicos dele) e gênese passiva (síntese
da experiência passiva que recebe os dados como “todos prontos”). O princípio
universal da gênese passiva que constitui todos os objetos que a atividade “encontra”
chama-se associação. Considerado o
problema da constituição dos objetos da consciência a fenomenologia se define
como teoria transcendental do conhecimento.
A fenomenologia mostra que o eu
constitui-se como existência em si de sua essência própria e como o eu
constitui nele a objetividade. Entendida dessa forma a fenomenologia é um Idealismo Transcendental, não no
sentido tradicional ou kantiano, mas no sentido de uma explicitação do eu como
sujeito de conhecimentos possíveis.
QUINTA MEDITAÇÃO:
INTERSUBJETIVIDADE MONADOLÓGICA
A redução transcendental explicita o eu
que é meu, mas o que dizer dos outros “eus”? O outro se apresenta como conteúdo
ontonoemático, isto é, como correlato
da minha consciência. Nesse caso o problema se apresenta como a existência do
outro para mim, como problema de uma teoria
transcendental da experiência do
outro. Essa teoria também fornece a base para uma teoria transcendental do mundo objetivo, na medida em que a natureza
objetiva existe para a consciência.
O meu eu enquanto minha esfera transcendental
própria apresenta-se na qualidade de mônoda.
Essa esfera abrange a intencionalidade que visa os outros. O outro é o eu
excluído do ser concreto que me pertence. O outro, primeiro em si (não-eu), é
um outro eu. Isso torna possível a constituição de um domínio estranho a mim,
um mundo objetivo e infinito ao qual pertence os outros e eu mesmo.
Assim, a intersubjetividade transcendental possui uma esfera intersubjetiva
de vinculação, em que ela constitui de maneira intersubjetiva, o mundo
objetivo. O meu eu, mostrado a mim de maneira apodítica só pode ser aquele que
tem a experiência do mundo e de estar em comunidade com outros eus numa sociedade de mônodas.
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