TRATADO LÓGICO-FILOSÓFICO (RESUMO)


O que se segue é um resumo da obra “Tratado Lógico-Filosófico” do filósofo britânico Ludwig Wittgenstein. O texto se divide em seis partes, a primeira parte trata do mundo como uma totalidade de fatos ou ocorrências, a segunda considera a figuração dos fatos enquanto modelo da realidade, a terceira discorre sobre a proposição como meio pelo qual o pensamento se exprime, na quarta partea proposição é apresentada como figuração da realidade, na quinta, trata-se da proposição como função de verdade das proposições elementares, por fim, a sexta parte discute de maneira mais ampla as proposições da lógica. É importante colocar que este resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor original.

I. O MUNDO COMO TOTALIDADE DOS FATOS 

O mundo é tudo o que ocorre.  O mundo é a totalidade dos fatos, não das coisas. A totalidade dos fatos determina, pois, o que ocorre e também tudo que não ocorre. Os fatos, no espaço lógico, são o mundo. O que ocorre, o fato, é o subsistir dos estados de coisas. O estado de coisas é uma ligação de objetos (coisas). 
Nada é acidental na lógica, se uma coisa puder aparecer num estado de coisas, a possibilidade do estado de coisas já deve estar antecipada nela. Se as coisas podem aparecer em estados de coisas, então isto já. deve estar nelas. Assim como não podemos pensar objetos espaciais fora do espaço, os temporais fora do tempo, assim não podemos pensar nenhum objeto fora da possibilidade de sua ligação com outros. 
A coisa é autônoma enquanto puder aparecer em todas as situações possíveis, mas esta forma de autonomia é uma forma de conexão com o estado de coisas, uma forma de heteronomia. Se conheço o objeto, também conheço todas as possibilidades de seu aparecer em estados de coisas. Cada uma dessas possibilidades deve estar na natureza do objeto. 
Ao serem dados todos os objetos, dão-se também todos os possíveis estados de coisas.  A coisa está como num espaço de estados de coisas possíveis e não pode ser pensada sem ele. O objeto espacial deve estar no espaço infinito. Os objetos contêm a possibilidade de todas as situações. A possibilidade de seu aparecer nos estados de coisas é a forma dos objetos. 
O objeto é simples, cada asserção sobre complexos deixa-se dividir numa asserção sobre suas partes constitutivas. Os objetos não podem ser complexos pois formam a substância do mundo. A substância do mundo pode determinar apenas uma forma, mas não propriedades materiais. Os objetos de mesma forma lógica, abstraindo suas propriedades externas, se diferenciam um do outro apenas por serem distintos. 
Substância é o que subsiste independentemente do que ocorre. Ela é forma e conteúdoEspaçotempo e cor são formas dos objetos. Aquilo que é fixo e subsistente é o objeto.  A configuração dos objetos forma o estado de coisas. No estado de coisas os objetos se ligam uns aos outros como elos de uma cadeia.  No estado de coisas os objetos estão uns em relação aos outros de um modo determinado. O modo pelo qual os objetos se vinculam no estado de coisas constitui a estrutura do estado de coisas. A forma é a possibilidade da estrutura. 
A estrutura do fato é constituída pelas estruturas dos estados de coisas. A totalidade dos subsistentes estados de coisas é o mundo. A totalidade dos subsistentes estados de coisas determina também quais estados de coisas não subsistem. A subsistência e a não-subsistência dos estados de coisas é a realidade. Chamamos de fato positivo à subsistência de estados de coisas e de fato negativo à não-subsistência deles. Os estados de coisas são independentes um do outro de modo que da subsistência ou da não-subsistência de um estado de coisas não é possível concluir a subsistência ou a não-subsistência de outro. A realidade inteira é o mundo. 

II. FIGURAÇÕES DOS FATOS 

figuração é um modelo da realidade. A figuração presenta a situação no espaço lógico, a subsistência e a não-subsistência de estados de coisas. A figuração consiste em que seus elementos estão uns em relação aos outros de um modo determinado. A figuração é um fato.  
A vinculação dos elementos da figuração chama-se sua estrutura e a possibilidade dela, sua forma de afiguração. A forma de afiguração é a possibilidade de que as coisas estejam umas em relação às outras como os elementos da figuração. A figuração enlaça-se com a realidade; estendendo-se para ela de modo que a figuração se aplica à realidade como padrão de medida 
Os fatos, para serem figuração, devem ter algo em comum com o que é afigurado. O que a figuração deve ter em comum com a realidade para poder afigurar à sua maneira, correta ou falsamente, é sua forma de afiguração. O que cada figuração, de forma qualquer, deve sempre ter em comum com a realidade para poder afigurá-la em geral, correta ou falsamente, é a forma lógica, isto é, a forma da realidade. 
A figuração representa uma situação possível no espaço lógico. A figuração contém a possibilidade da situação, a qual ela representa. A figuração afigura a realidade, pois representa uma possibilidade da subsistência e da não-subsistência de estados de coisas. A figuração concorda ou não com a realidade, é correta ou incorreta, verdadeira ou falsa. 
O que a figuração representa é o seu sentido. Na concordância ou na discordância de seu sentido com a realidade consiste sua verdade ou sua falsidade. Não existe uma figuração a priori verdadeira, pois para reconhecer se uma figuração é verdadeira ou falsa devemos compará-la com a realidade. 

III. O PENSAMENTO COMO PROPOSIÇÃO SIGNIFICATIVA 

Pensamento é a figuração lógica dos fatos. A totalidade dos pensamentos verdadeiros é a figuração do mundo. Não podemos pensar nada ilógico, porquanto, do contrário, deveríamos pensar ilogicamente. É impossível representar na linguagem algo que contrarie as leis da lógica. 
Na proposição o pensamento se exprime sensível e perceptivelmente. O signo sensível e perceptível, como o signo falado ou escrito, da proposição como projeção da situação possível. O método de projeção é o pensar do sentido, da proposição, o signo proposicional é o signo pelo qual exprimimos o pensamento. A proposição é o signo proposicional em sua relação projetiva com o mundo. 
O signo proposicional consiste em que seus elementos, as palavras, estão relacionados uns aos outros de maneira determinada. O signo proposicional é um fato. A proposição não é uma mistura de palavras, a proposição é articulada. Na proposição o nome substitui o objeto. Uma proposição pode apenas dizer como uma coisa é, mas não o que é. Posso apenas falar sobre eles, não posso, porém, enunciá-los. 
A proposição que trata de um complexo acha-se numa relação interna com a proposição que trata das partes constituintes dele. O complexo só pode ser dado por sua descrição, e esta concordará ou não concordará com ele. A reunião dos símbolos de um complexo em um símbolo simples pode ser expressa por uma definição. 
A proposição exprime o que é expresso de um modo determinado e dado claramente: A proposição é articulada. Cada signo definido designa por sobre os signos primitivos pelos quais é definido. Os nomes, por sua vez, não podem ser decompostos por definições. Nenhum signo isolado e autônomo possui denotação. 
As denotações dos signos, primitivos podem ser esclarecidas por elucidações. Só a proposição possui sentido; só em conexão com a proposição um nome tem denotação. Chama-se expressão (símbolo) a cada parte da proposição que caracteriza um sentido. A expressão é tudo que, sendo essencial para o sentido da proposição, as proposições podem ter em comum entre si. A expressão caracteriza uma forma e um conteúdo. 
A expressão é representada por uma variável, cujos valores são as proposições que contém a expressão, essa variável chama-se variável proposicional.  Pode-se fixar os valores que a variável proposicional pode tomar. ação dos valores das variáveis proposicionais consiste na indicação das proposições, as quais têm como marca característica comum a variável. A fixação dos valores é uma descrição dessas proposições. Na proposição, a palavra "é" aparece como cópula, como sinal de igualdade e expressão da existência. 
A proposição possui traços essenciais, aqueles que sozinhos tornam a proposição capaz de exprimir seu sentido e acidentais, os traços que derivam da maneira particular de produzir o signo proposicional. É, pois, essencial na proposição o que é comum a todas as proposições que podem exprimir o mesmo sentido. O nome autêntico é aquilo que todos os símbolos que designam o objeto têm em comum. 
O signo proposicional empregado e pensado é o pensamento. O pensamento é a proposição significativa. A totalidade das proposições é a linguagem. O humano possui a capacidade de construir linguagens nas quais cada sentido se deixa exprimir, sem, contudo, pressentir como e o que cada palavra denota. A linguagem corrente forma parte do organismo humano e não é menos complicada do que ele. É humanamente impossível de imediato apreender dela a lógica da linguagem. Toda filosofia é “crítica da linguagem”. 

IV. PROPOSIÇÃO COMO FIGURAÇÃO DA REALIDADE 

proposição é figuração da realidade, é modelo da realidade tal qual a pensamos. A proposição é figuração da realidade; pois conheço a situação representada por ela quando entendo a proposição. E entendo a proposição sem que o sentido me seja explicado. A proposição mostra seu sentido. A proposição mostra, se for verdadeira, como algo está e diz que isto está assim. Por meio da proposição a realidade deve ser fixada enquanto sim ou enquanto não. A proposição é a descrição de um estado de coisas. 
 Com a ajuda dos andaimes lógicos, a proposição constrói o mundo. A proposição é urna figuração da situação unicamente enquanto for logicamente articulada. A proposição representa a subsistência e a não-subsistência dos estados de coisas. A totalidade das proposições verdadeiras a totalidade das ciências naturais. 
filosofia deve ser distinguida das ciências naturais. A finalidade da filosofia é o esclarecimento lógico dos pensamentos. A filosofia não é teoria, mas atividade. A filosofia não resulta em “proposições filosóficas”, mas em tornar claras as proposições. A filosofia deve tomar os pensamentos que, por assim dizer, são vagos e obscuros e torná-los claros e bem delimitados. A teoria do conhecimento é a filosofia da psicologia. A filosofia delimita o domínio contestável das ciências naturais. Deve delimitar o pensável e com isso o impensável.  
Podemos em certo sentido falar de propriedades formais de objetos e estados de coisas, em particular de propriedades da estrutura dos fatos, e no mesmo sentido de relações formais e de relações de estruturas. Chamamos de propriedade interna aquela que for impensável que seu objeto não a possua. Pode-se falar a partir disso de relações internas, chama-se de séries formais às séries ordenas por relações internas.  
A expressão da concordância e da discordância com as possibilidades de verdade das proposições elementares exprime as condições de verdade da proposição. A proposição é expressão de suas condições de verdade. Entre os grupos possíveis de condições de verdade há dois casos extremos: a tautologia, em que a proposição é verdadeira para todas as condições de verdade das proposições elementares e a contradição, em que a proposição é falsa para todas as condições de verdade. Tanto a tautologia, como a contradição, são vazias de sentido. A proposição mostra o que diz, a tautologia e a contradição que não dizem nada. A tautologia e a contradição não são, porém, absurdas; pertencem ao simbolismo do mesmo modo que "0" pertence ao simbolismo da aritmética. 

V. A PROPOSIÇÃO COMO FUNÇÃO DE VERDADE DAS PROPOSIÇÕES ELEMENTARES 

A proposição é uma função de verdade das proposições elementares. A proposição elementar é uma função de verdade de si mesma. As proposições elementares são os argumentos de verdade da proposição. As funções de verdade se ordenam em séries. Este é o fundamento da teoria da probabilidade. A unidade das proposições probabilísticas consiste nas circunstâncias que conferem a um determinado acontecimento tal e tal grau de probabilidade. Desse modo, a probabilidade é uma generalização. Envolve uma descrição geral de uma forma proposicional. 
A solução dos problemas lógicos deve ser simples, já que estes colocam o padrão da simplicidade. A lógica está antes de qualquer experiência de que algo é de determinado modo. Desse modo está antes do Como, embora não antes do Que. A aplicação da lógica decide que proposições elementares existem. 
Os limites de minha linguagem denotam os limites de meu mundo. A lógica preenche o mundo, os limites do mundo são também seus limites. Que o mundo é o meu mundo, isto se mostra porque os limites da linguagem, linguagem que somente eu compreendo, denotam os limites de meu mundo. O mundo e a vida são um só. Eu sou meu mundo. 
Tudo o que vemos poderia ser diferente. Tudo o que podemos em geral descrever poderia ser diferente. Não há a priori uma ordem das coisas. Pode-se falar na filosofia, do eu de um ponto de vista não-psicológico. O eu penetra na filosofia porque o "mundo é meu mundo". O eu filosófico não é o homem, nem o corpo humano, nem a alma humana de que se ocupa a psicologia, mas o sujeito metafísico, o limite, não sendo, pois, parte do mundo. 

VI. AS PROPOSIÇÕES DA LÓGICA 

As proposições da lógica são tautologias, portanto, não dizem nada. Elas são proposições analíticas. As proposições da lógica são tautologias; isto mostra as propriedades (lógicas) formais da linguagem, do mundo. Suas partes constituintes, ao se vincularem dessa maneira, produzem uma tautologia, e isto caracteriza a lógica de suas partes constituintes. 
As proposições da lógica demonstram as propriedades lógicas das proposições, pois se ligam em proposições que não dizem nada. É possível chamar a esse método de método nulo. As proposições lógicas descrevem os andaimes do mundo, ou melhor, os representam. Não “tratam” de nada. Pressupõem que os nomes possuam denotação e as proposições elementares, sentido. E tal é sua vinculação com o mundo. 
Na lógica cada proposição está sob a forma de uma prova. A prova na lógica é apenas um expediente mecânico para facilitar o reconhecimento da tautologia onde ela é complicada. Cada proposição da lógica é um modus ponens representado num signo. A lógica não é teoria, mas figuração especular do mundo. A lógica é transcendental. A matemática é um método da lógicaAquilo que é essencial para o método matemático é trabalhar com equações. A lógica do mundo que as proposições lógicas mostram nas tautologias, a matemática a mostra nas equações. O método pelo qual a matemática chega às equações é o da substituição, de modo que passamos de um número de equações para uma nova equação, substituindo expressões por outras, de acordo com as equações. 
O mundo independe de nossa vontade. Não há vinculação lógica entre vontade e mundo, há somente uma necessidade lógica. O sentido do mundo deve estar fora dele. No mundo tudo é como é e acontece como acontece: nele não há valor, e se houvesse, o valor não teria valor.  
Por isso, não pode haver proposições da ética. A ética não se deixa exprimir. A ética é transcendental. Ética e estética são um só. ética nada tem a ver com castigo e recompensa no sentido comum. Essa questão a respeito das consequências de uma ação deve ser insignificante. No mínimo essas consequências não serão acontecimentos. Porém, deve existir por certo uma espécie de recompensa ética e de castigo ético que devem, todavia, estar na própria ação.  
Se querer o bem ou querer o mal muda o mundo, isto só poderá mudar os limites do mundo, nunca os fatos; nunca o que pode ser expresso pela linguagem. Também como na morte, o mundo não se altera, mas acaba. Como é o mundo é perfeitamente indiferente para o que está além. Deus não se manifesta no mundo, mesmo a imortalidade da ama não está assegurada. No entanto, existe com certeza o indizível. Isto se mostra, é o que é místico. 
O método correto em filosofia seria propriamente: nada dizer a não ser o que pode ser dito, isto é, proposições das ciências naturais, algo, portanto, que nada tem a haver com a filosofia; e sempre que alguém quisesse dizer algo a respeito da metafísica, demonstrar-lhe que não conferiu denotação a certos signos de suas proposições. As proposições deste texto se elucidam do seguinte modo: quem as entende, por fim as reconhecerá como absurdas, quando graças a elas e, por elas, tiver escalado para além delas. É preciso por assim dizer jogar fora a escada depois de ter subido por ela. Deve-se vencer essas proposições para ver o mundo corretamente. 


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