ILUSTRANDO A SUBDETERMINAÇÃO DOUTRINÁRIA DA BÍBLIA
O objetivo deste texto consiste em ilustrar o que pode ser chamado de subdeterminação doutrinária da Bíblia. Essa Subdeterminação deve ser distinguida, embora relacionada, da Subdeterminação hermenêutica. A Subdeterminação hermenêutica se refere ao fato de que um mesmo texto Bíblico pode ser interpretado de diferentes formas, algumas vezes igualmente plausíveis. Trata-se, portanto, apenas da discussão de modelos de interpretação de textos bíblicos. A Subdeterminação doutrinária, por sua vez, se refere ao fato de que, se a Bíblia for pressuposta como revelação divina e como ensinando um conjunto de doutrinas único, diferentes modelos doutrinários podem ser compatíveis com todos os textos bíblicos, de modo que alguns modelos contraditórios podem ser igualmente plausíveis. Assim, por exemplo, embora a subdeterminação hermenêutica seja um problema para qualquer interpretação da Bíblia, incluindo a interpretação secular, a subdeterminação doutrinária é um problema para quem toma a Bíblia como doutrina revelada.
Assim,
este texto pretende ilustrar como a Bíblia pode ser consistentemente
interpretada dentro de diferentes modelos doutrinários, até mesmo
incompatíveis. Escolhi apenas casos em que diferentes modelos conseguem
explicar textos bíblicos de forma razoável ou plausível. Nem sempre a
plausibilidade de ambos os modelos é idêntica, mas ao menos ambos os modelos
apresentam interpretações razoáveis dos textos. Além disso, aqui se faz um
exercício hipotético. Na leitura secular alguém só poderia admitir que não
precisa existir uma unidade doutrinária na Bíblia e que ela poderia até mesmo
ensinar modelos contraditórios a depender da passagem, livro ou autor. Mas como
aqui se pretende ilustrar a subdeterminação doutrinária, este texto irá
considerar a Bíblia como tendo uma unidade de doutrina, independente disso ser
o caso ou não na realidade.
Para
ilustrar a subdeterminação da Bíblia escolhi cinco casos em que é possível
interpretar a Bíblia de forma consistente com ambos os modelos: (1) Trinitarianismo x Arianismo; (2) Infernismo x Aniquilacionismo x
Universalismo; (3) Consciencialismo
x Mortalismo; (4) Calvinismo x
Arminianismo e; (5) Sabatismo x
Dominicalismo x Abolicionismo sabático. Busquei ser justo com todas as posições
mostrando os melhores argumentos de cada lado, de forma imparcial e explicando como elas explicam as passagens bíblicas,
mostrando, assim, como modelos doutrinários opostos podem fornecer explicações
plausíveis ou consistentes com os textos bíblicos.
I.
TRINITARIANISMO X ARIANISMO
Definições:
Trinitarianismo
ortodoxo: doutrina
segundo a qual há um só Deus eternamente subsistente em três pessoas distintas
igualmente divinas (Pai, Filho e Esprito Santo), sendo o Filho eternamente
gerado pelo Pai e o Espírito Santo procedente do Pai e do Filho.
Arianismo: doutrina segundo a qual o Filho é divino, no entanto,
possui um grau de divindade menor que a do Pai, sendo a primeira criatura
divina criada por Deus Pai.
Trinitarianismo
ortodoxo: A Bíblia
afirma que Jesus é Deus (João 1:1). Tomé chamou Jesus de "Deus meu"
(João 20:28), e Jesus declarou que ele e o Pai são um (João 10:30). Além disso,
Jesus é chamado de Senhor (Kyriós) em textos que fazem alusão a passagens do
Antigo Testamento sobre Javé (Hebreus 1:10 citando Salmos 102:25). A Bíblia
também ensina que em Cristo habita toda a plenitude da divindade (Colossenses
2:9) e o descreve como "o Deus unigênito" (João 1:18), o que aponta
para sua geração eterna.
No Novo Testamento, a expressão "mentir para
Deus" é usada de forma intercambiável com "mentir para o Espírito
Santo" (Atos 5:3-4), indicando que o Espírito Santo é Deus. Passagens
trinitárias também são recorrentes no Novo Testamento, como em Mateus 28:19, onde Jesus ordena o
batismo "em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo", e em Efésios
1:1-13, que descreve a obra da salvação em estrutura trinitária. O Espírito
Santo é chamado de Espírito de Deus e de Cristo, sugerindo que ele procede
eternamente do Pai e do Filho (Romanos 8:9).
O Novo Testamento também afirma que há um só Deus (1
Timóteo 2:5), e mostra interações distintas entre o Pai, o Filho e o
Espírito, como no batismo de Jesus, quando o Pai fala do céu, o Espírito desce
como pomba e o Filho é batizado, indicando que há um só Deus e ao mesmo tempo as pessoas da Trindade são distintas uma das outras (Mateus 3:16-17). Versículos que falam do Filho
como inferior ou submisso ao Pai referem-se a uma submissão funcional, não a
uma diferença de essência. Assim, o Novo Testamento apresenta um único Deus que
subsiste em três pessoas igualmente divinas (Pai, Filho e Espírito Santo),
sendo o Filho eternamente gerado do Pai e o Espírito Santo eternamente espirado
por ambos.
Arianismo: Jesus é sem
dúvida divino ou deus, mas não no mesmo grau que o Pai. Em João 1:1, a
distinção entre "Deus" com artigo na primeira cláusula e
"Deus" sem artigo na segunda sugere que o texto pode ser melhor
traduzido como: "O Verbo estava com o Deus Pai e o Verbo era divino."
Colossenses 1:15 descreve Jesus como o
"primogênito de toda a criação", indicando que ele é a primeira
criatura criada por Deus. O termo "primogênito" na Bíblia, mesmo em
contextos metafóricos, refere-se a alguém pertencente ao grupo mencionado, de modo que independente de como se interprete o termo "primogênito", a passagem implica que o Filho é parte da criação.
Apocalipse 3:14 também chama o Filho de "princípio da criação de
Deus".
Jesus repreendeu o jovem rico por chamá-lo de bom, dizendo: "Ninguém é bom, senão Deus" (Marcos 10:18; Mateus 19:17). Isso indica que Jesus não reivindicava ser Deus no sentido do Sumo Bem. Ele afirmou que o Pai é o "único Deus verdadeiro" (João 17:3), de modo que o Filho não pode, então, ser também Deus no mesmo sentido que o Pai. Jesus também disse que o Pai é maior do que ele (João 14:28). Paulo reforça isso em 1 Coríntios 15:28, indicando que o Filho permanecerá subordinado ao Pai eternamente. Quando Colossenses 2:9 diz que no Filho habita "toda plenitude da divindade", é importante lembrar que foi o Pai quem fez essa plenitude habitar no Filho (Colossenses 1:19) e que Deus faz essa plenitude habitar em todo cristão (Efésios 3:19). Ser habitado da plenitude de Deus é ser plenamente habitado pelas qualidades do amor e bondade divinos.
Jesus também demonstrou não ser onisciente, pois afirmou desconhecer o dia de sua volta, algo que apenas o Pai sabe (Mateus 24:36). Apocalipse 1:1 menciona que o Filho recebeu a revelação do Pai antes de entregá-la a João, reforçando sua limitação.
Portanto, o ensino do Novo Testamento é que o Filho,
embora divino, não é Deus no mesmo grau que o Pai. Ele é a primeira criatura
divina, criada por Deus Pai.
II.
INFERNISMO X ANIQUILACIONISMO X UNIVERSALISMO
Definições:
Infernismo: doutrina segundo a qual os ímpios serão eternamente
punidos no inferno.
Aniquilacionismo: doutrina segundo a qual os ímpios serão aniquilados
da existência.
Universalismo: doutrina segundo a qual um dia todos irão se
reconciliar com Deus e serem salvos.
Infernismo: Mateus 10:28 diz que uma pessoa pode matar o corpo
sem matar a alma, o que mostra que a alma é distinta do corpo e sobrevive à
morte do corpo, o que apoia a doutrina da imortalidade da alma. A Bíblia também
usa expressões muito claras de que o inferno será eterno. Mateus 25:46 diz que
alguns vão para a vida eterna e outros para o castigo eterno. A mesma palavra
"eterno" que é usada para vida é usada para castigo, de modo que se a
vida eterna irá durar para sempre, o castigo também. Mateus 25:41 fala de "fogo eterno",
Marcos 9:43-48 de "fogo inextinguível", Apocalipse 14:11 de
"fumaça do tormento que sobe para todo sempre". Mesmo que se desse
outras interpretações metafóricas para esses textos, é difícil saber o que o
Novo Testamento teria então que dizer para ensinar o inferno eterno, não parece
que nada que o Novo Testamento dissesse além do que diz poderia deixar mais
claro a sugestão de que o inferno é eterno . Além disso, 2 Tessalonicenses 2:9
explica que a perdição no inferno significa a eterna separação de Deus.
Aniquilacionismo: A palavra grega para "eterno" (aion) não necessariamente significa
"eterno", pode significar algo que dura por tempo indeterminado ou
que é contínuo. Por exemplo, em Romanos 16:25 o termo se refere a algo que teve
uma duração definida. Além disso, Mateus 10:28 diz que Deus pode matar a alma e
o corpo no inferno. O termo grego no Novo Testamento para inferno, na verdade é
Geena, que se referia ao Vale de Hinon, onde cadáveres de criminosos eram
lançados e destruídos no fogo que queimava continuamente. Assim, é com base na
imagem desse lugar que Jesus falou de fogo inextinguível e de bicho e vermes
que não morrem enquanto devoram o cadáver, portanto é evidente que a linguagem
de textos sobre fogo eterno da Geena é simbólica (Marcos 9:43-48). Além disso,
Apocalipse 14:11 que fala de fumaça do tormento que sobe para sempre usa a
mesma linguagem de Isaías 34:10 que se refere à destruição de uma cidade para
sempre, não a um tormento eterno literal. O mesmo ocorre com Judas 1:7 que
chama o fogo que destruiu Sodoma de "fogo eterno". A ideia portanto
de fogo eterno é de algo que foi destruído para sempre e de forma irreversível.
O Apocalipse 21:8 também explica que o lago de fogo "significa" a
segunda morte, ou seja, a morte eterna. Portanto, o próprio Novo Testamento
explica que com a linguagem de fogo eterno ele quer dizer destruição ou
aniquilação eterna (cf. 2 Tessalonicenses 1:9).
Universalismo: A Bíblia promete que um dia toda a criação será
restaurada (Atos 3:21-22; Romanos 8:22-24; Apocalipse 21:1; 2 Pedro 3:15-17),
portanto a Bíblia promete uma redenção completa e final de toda ordem criada
que será livre do pecado. Paulo também escreveu que assim como todos caíram no
pecado por causa do pecado de um só homem, Adão, todos serão justificados pelo
ato de Justiça de um só homem, Jesus. Logo se o pecado de Adão levou à Queda
toda humanidade, a expiação de Cristo levará à redenção de toda a humanidade
(Romanos 5:18). Paulo também diz: "Porque, assim como todos morrem em
Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo." (1 Coríntios 15:22). Os
versículos da Bíblia que ameaçam com condenação ao inferno podem ser lidos como
advertências do que aconteceria se as pessoas não se reconciliassem com Deus ou
podem ser lidas com a ideia de um inferno temporário, já que a palavra
"eterno" (aion) no grego também pode significar algo que tem uma
duração continua, e não necessariamente algo que nunca acaba (cf. Romanos
16:25). Pode ser que algumas pessoas
tenham de ir ao inferno para serem punidas e purificadas antes de poderem estar
em condição de se reconciliar com Deus. De todo modo, Paulo promete que no final
de tudo todos irão se reconciliar com Deus, reconhecendo Cristo como Senhor
(Filipenses 2:10).
III.
CONSCIENCIALISMO X MORTALISMO
Definições:
Consciencialismo: doutrina segundo a qual os mortos estão conscientes
entre a morte e a ressurreição.
Mortalismo: doutrina segundo a qual os mortos estão inconscientes
entre a morte a ressurreição.
Consciencialismo: No Antigo Testamento, a doutrina da consciência dos
mortos ainda não estava plenamente desenvolvida, de modo que a condição dos
mortos é descrita dentro dos limites da experiência humana. Essa descrição não
está errada, mas reflete a condição dos mortos do ponto de vista da experiência
"debaixo do sol" (Eclesiastes 1:9). Com o Novo Testamento, torna-se
explícito que os mortos estão conscientes. Jesus disse ao ladrão na cruz:
"hoje estarás comigo no paraíso" (Lucas 23:43). O termo "hoje"
seria trivial no texto se não indicasse o dia em que o ladrão entraria no céu.
Em Mateus 10:28, Jesus afirma que é possível matar o corpo sem matar a alma,
indicando que a alma sobrevive à morte do corpo. Na parábola do rico e Lázaro,
ambos sobrevivem à morte física; mesmo que lida como uma história figurativa,
seria estranho que Jesus utilizasse uma parábola baseada em algo falso (Lucas
16:19-31). Moisés apareceu a Jesus no monte da transfiguração (Mateus 17:2),
enquanto Deuteronômio 34:5-7 afirma claramente que ele morreu e foi sepultado
por Deus. Paulo diz que, na morte, "deixamos o corpo e passamos a habitar
com o Senhor" (2 Coríntios 5:8), e também que estava em dúvida entre
continuar vivo com seu ministério ou morrer para "partir e estar com
Cristo" (Filipenses 1:23). Pedro menciona que os espíritos dos
anti-diluvianos estavam aprisionados e que Cristo pregou a esses mortos (1
Pedro 3:19; 4:6). Hebreus 9:27 diz que imediatamente após a morte segue-se o
juízo. Em Apocalipse, lemos sobre as almas dos mártires mortos durante a grande
tribulação como estando nos céus clamando a Deus por vingança (Apocalipse
6:9-11). Esse estado da alma nos céus ainda não é sua recompensa completa e é
um estado incompleto, em que elas aguardam a ressurreição e a recompensa final
no fim dos tempos.
Mortalismo: Eclesiastes 9:5-10 afirma claramente que os mortos
estão inconscientes, não sentem dor nem alegria, e que no além (Sheol) não há
obra alguma. O uso do termo "Sheol" (mundo dos mortos/além) indica
que o texto não se refere apenas à perspectiva terrena. Os Salmos dizem:
"os mortos não louvam o Senhor, nem os que descem à região do
silêncio" (Salmo 115:17) e "na morte não há lembrança de ti [Deus];
no Sheol, quem te louvará?" (Salmo 6:5). Outros versículos reforçam:
"se o Senhor não fora em meu auxílio, já a minha alma habitaria no lugar
do silêncio" (Salmo 94:17) e "quando o espírito deles se vai, eles
voltam ao pó, e naquele dia perecem os seus pensamentos" (Salmo 146:4). A
morte é comparada a um sono (1 Tessalonicenses 4:13), e os mortos só receberão
sua recompensa na ressurreição, com a segunda vinda de Cristo (2 Timóteo 4:8).
Paulo afirma que, sem a ressurreição, não haveria esperança de vida após a
morte, o que implica que os mortos estão inconscientes até a ressurreição (1 Coríntios
15:32). Textos que sugerem que os mortos vão para o céu na morte referem-se, na
verdade, à ressurreição, que, da perspectiva de quem morre, ocorre
imediatamente após a morte. Já Lucas 23:43 seria melhor traduzido como:
"eu te digo hoje que você estará comigo no paraíso". Os versículos
sobre Jesus pregando aos mortos indicam que Ele pregou a eles enquanto estavam
vivos, e Apocalipse 6:9-11 deve ser interpretado como uma visão simbólica.
IV.
CALVINISMO X ARMINIANISMO
Definições:
Arminianismo: doutrina segundo a qual Deus, por meio de uma graça
preveniente restaura o livre-arbítrio de todos os homens torando-os capazes de
escolher a salvação se quiserem. Aqui foi considerado um tipo de arminianismo
específico que defende ser possível perder a salvação.
Calvinismo: doutrina segundo a qual Deus não possui uma vontade
antecedente salvífica universal, mas apenas uma vontade decretiva de salvar apenas os
eleitos. Aqui foi considerado o calvinismo que adota a TULIP (depravação total,
eleição condicional, expiação limitada, graça irresistível e perseverança dos
santos) e um certo compatibilismo sobre livre agência humana.
Arminianismo:
A Bíblia é clara ao afirmar que Deus concede ao ser
humano o livre-arbítrio, ou seja, o poder de escolher servir a Deus ou não.
Textos como Josué 24:15 ("escolhei hoje a quem sirvais") e
Deuteronômio 30:19 ("escolhe, pois, a vida") mostram que Deus oferece
uma escolha genuína e que o ser humano tem responsabilidade por suas decisões.
Além disso, a Bíblia ensina que uma pessoa que já experimentou a salvação pode
apostatar, ou seja, se afastar da fé e perder a salvação, como descrito em
Hebreus 6:4-6.
A graça de Deus também não é irresistível, como mostram
passagens como Atos 7:51, onde Estevão acusa os ouvintes de sempre resistirem
ao Espírito Santo. Esse fato evidencia que a graça é oferecida, mas pode ser
rejeitada por livre escolha.
Quanto à expiação, o Arminianismo sustenta que Jesus
morreu por todos os seres humanos, não apenas pelos eleitos. Versículos como
João 3:16 ("Deus amou o mundo de tal maneira") e Hebreus 2:9
("para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todos") afirmam
claramente a abrangência universal da expiação. O apóstolo João reforça essa
ideia ao dizer que Jesus é a propiciação "pelos nossos pecados, e não
somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo" (1 João 2:2).
Sobre predestinação, o Arminianismo interpreta que ela
não é baseada em uma escolha arbitrária de Deus, mas na presciência divina.
Textos como 1 Pedro 1:2 indicam que Deus predestina aqueles que ele sabe, de
antemão, que crerão livremente. Além disso, o conceito de predestinação é
frequentemente visto como corporativo, referindo-se à eleição da Igreja como
corpo coletivo, e não à de indivíduos específicos para salvação ou condenação.
Isso é destacado em Romanos 9:13-18, onde Deus escolhe Israel como nação sem
negar o livre-arbítrio individual.
Por fim, o Arminianismo afirma que Deus deseja
sinceramente que todos sejam salvos (1 Timóteo 2:4) e que ele oferece a
salvação a todas as pessoas, respeitando, porém, a decisão de cada indivíduo.
Assim, a salvação é uma oferta universal, que depende da escolha pessoal de
aceitar ou rejeitar a graça divina.
Calvinismo:
A Bíblia diz que, com a Queda, os homens estão mortos
em seus pecados e debaixo da ira de Deus, sendo incapazes, portanto, de se
voltarem a Deus por si mesmos (Efésios 2:1-3). Quando fala de predestinação, a
Bíblia deixa claro que ela se baseia na vontade soberana de Deus; se fosse mera
presciência ou escolha de um grupo, não seria realmente uma eleição ou
predestinação real (Efésios 1:4-6). Deus declara que sua predestinação não
depende do que as pessoas querem, e que ele exerce misericórdia sobre quem quiser
(Romanos 9:15-16).
Jesus não morreu por todos, pois, se assim fosse, todos
seriam salvos, já que a obra de Jesus é eficaz — ele morreu apenas por seu povo
(Mateus 1:21) e por suas ovelhas (João 10:11). Em sua última oração na terra,
Jesus disse que orava apenas pelos eleitos, não por todo o mundo (João 17:9).
Jesus também afirmou que ninguém pode ir a ele a não ser que o Pai o traga
(João 6:44). Os versículos que mencionam o desejo de Deus de salvar a todos ou
que Cristo morreu por todos estão, na verdade, falando de "pessoas de
todos os tipos", e não literalmente de todas as pessoas sem exceção.
Além disso, calvinistas não negam que a graça possa ser
resistida por um tempo; o que afirmam é que, em algum momento, a pessoa eleita
não conseguirá resistir. Calvinistas também não negam que as pessoas tenham
liberdade para escolher servir ou não a Deus; no entanto, os ímpios sempre
usarão essa liberdade para escolher o mal, e somente os eleitos regenerados
podem escolher o bem.
A Bíblia também diz que as pessoas que apostatam da fé
nunca foram realmente salvas (1 João 2:19-20). Por fim, a salvação é pela graça
imerecida (Efésios 2:8-9); se o livre-arbítrio tivesse qualquer participação na
salvação, haveria algum mérito humano (Romanos 11:6). Portanto, conclui-se que
Deus escolheu e predestinou alguns para a salvação, que Jesus morreu apenas
pelos eleitos, e que a salvação não pode ser perdida.
V.
SABATISMO X DOMINICALISMO X ABOLICIONISMO SABÁTICO
Definição:
Sabatismo: doutrina segundo a qual os cristãos têm o dever de
guardar o sábado (sétimo dia) como dia do Senhor.
Dominicalismo: doutrina segundo a qual, desde a ressurreição, o dia
de guarda para o cristão se tornou o domingo.
Abolicionismo
sabático: doutrina
segundo a qual os cristãos não estão mais debaixo de um preceito obrigatório de
terem um dia de guarda.
Sabatismo: O sábado foi
instituído por Deus na criação, muito antes de surgir a lei judaica, sendo,
portanto, uma lei eterna (Gênesis 2:4). Ele também faz parte dos Dez
Mandamentos, que é a expressão da Lei moral eterna de Deus (Êxodo 20:8). Isaías
66:22-23 também diz que o sábado continuará a ser guardado no paraíso. Jesus
separou o sábado para ir à sinagoga (Lucas 4:16-21) e condenou, não a guarda do
sábado em si, mas uma guarda legalista do sábado. E lemos sobre cristãos usando
o sábado como um dia de oração (Atos 16:13). Jesus também disse que não veio
abolir a lei, de modo que todos os mandamentos da Lei moral de Deus continuam
vigentes (Mateus 5:17). Quando o Novo Testamento fala sobre o sábado ter sido
abolido, está se referindo aos sábados cerimoniais, como os dias de descanso
das festas judaicas, não ao sábado da lei moral.
Dominicalismo: A palavra "sábado" no hebraico significa
apenas "dia de descanso". A lei do sábado permanece eterna e
imutável, o que mudou não foi a lei em si, mas sim o dia, no Antigo Testamento
o dia de descanso era o sétimo, no Novo Testamento se tornou o
"oitavo". Apocalipse 1:10 fala do "dia do Senhor" (kyriake hemera), termo que não pode ser
nem o dia do Senhor escatológico, cujo termo grego é "hemera kyriou" (2Pedro 3:10), nem pode ser o sétimo dia,
porque os textos mais próximos da época de escrita do Apocalipse já passam a
falar do Domingo como dia de guarda. O termo "dia do Senhor" também
significa "dia de Cristo", porque Cristo era chamado de "Kyriós", porque é o dia em que
Cristo ressuscitou. Cristo, após sua ressurreição, realizou diversos atos no
domingo, ele fez do domingo um dia de reunião com seus discípulos (Marcos
16.9-11; Mateus 28.8-10; Lucas 24.34; Marcos 16.12-13; João 20.19-23). No
domingo, Cristo abençoou seus discípulos (João 20.19), soprou sobre eles o
Espírito (João 20.22), ordenou-lhes a grande comissão (João 20.21), ascendeu
aos céus (João 20.17) e em um domingo derramou o Seu Espírito sobre a Igreja no
Pentecostes (Atos 2.1). Além disso, o domingo se tornou o dia de culto cristão
no Novo Testamento (Atos 20.6-7; 1
Coríntios 16.2).
Abolicionismo
sabático: O Novo
Testamento fala de ordenanças da Lei que foram abolidas (Efésios 2:15),
Colossenses 2.16-17 diz que o sábado foi abolido, e não pode ser só o sábado
cerimonial, porque o texto o distingue dos dias de festas. Gálatas 4.10 também
reafirma que o sábado foi abolido. Romanos 14.5-6 diz que o cristão maduro não
faz distinção de dias, mas considera todos os dias iguais. O texto diz que os
cristãos têm liberdade para escolher ou não guardar dias. O Novo Testamento não
tem nenhum preceito explícito para guardar nem o sábado nem o domingo.
Portanto, os cristãos não estão obrigados a ter um dia de guarda específico.
- Sunkey
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