NATUREZA TEOLÓGICA DO MILAGRE
A Teologia Cristã está sustentada sobre
o sobrenatural (Geisler, 2015). O próprio ministério do Cristo foi marcado por milagres, como a
repreensão do vento e do mar (Mateus8.23-27), a ressurreição do filho da viúva
de Naim (Lucas7.11-17), a ressurreição da filha de Jairo (Marcos 5.21-43), a
ressurreição de Lázaro (João 11.1-45) dentre outros (Renovato, 2014). Desse
modo, a natureza teológica do milagre tem um valor essencial para a cosmovisão
cristã, na medida em que grandes doutrinas do Cristianismo estão edificadas com
base nos milagres da história bíblica, a exemplo do milagre da criação, que
traz importantes implicações teontológicas. Existem também os milagres
relacionados às doutrinas cristológicas, como o nascimento virginal, a
ressurreição literal e a ascensão de nosso Senhor Jesus Cristo. Os milagres que
atestaram o ministério e a mensagem apostólica sinalizam para o próprio axioma
da fé cristã. De fato, não se pode negar a importância dos milagres.
DIMENSÃO TRÍPLICE DO MILAGRE
O milagre pode ser teologicamente
definido como intervenção divina no curso regular do mundo que produz um evento
com um objetivo definido e que não poderia ocorrer de outra forma. Nesse
sentido, milagres são eventos sobrenaturais, mas não antinaturais, o que
significa que quando ocorre um milagre não há uma violação da lei natural da
causalidade, mas sim uma superadição de uma causa sobrenatural que produz um
novo efeito (Geisler, 2015).
A Bíblia Sagrada emprega três palavras
para falar de eventos miraculosos que nos ajudam a compreender a arqueologia, a
teleologia e a ontologia do milagre. Com arqueologia refiro-me a origem ou
fonte dos milagres divinos. Essa origem é representada pela palavra poder (hb. Koak; gr. Dunamis), que
traz consigo a ideia de força ou energia. Quanto a teleologia do milagre,
fala-se dos propósitos dos eventos sobrenaturais causados por Deus, tendo, em
especial, o fim de servir de sinal (hb.
Oth; gr. Semeion) para confirmar a origem de uma mensagem divina. Por fim, a
palavra maravilha (hb. Mophet; gr. Teras) revela a ontologia do milagre, como sendo naturalmente um
evento incomum e que por seu carácter espantoso atrai a atenção dos
observadores (Geisler, 2015).
ARQUEOLOGIA DO MILAGRE
Com a expressão, arqueologia do milagre
faço referência a fonte do milagre como sendo a Onipotência divina. O termo
bíblico relacionado a isso é “poder”. A Bíblia usa a palavra energetma (derivado de energes: “ativo”, “energético”) para descrever
os dons espirituais como operações diretas do poder do Deus Onipotente visando
resultados definidos. Usa também o termo dunamis,
ressaltando o fato de que os milagres são, na sua origem, de carácter
sobrenatural (Stamps,1995).
Desse modo, a origem ou fonte dos milagres
está no Poder de Deus, revelando a Sua Onipotência. Sendo assim, John Frame,
descreve os milagres como “acontecimentos causados de modo incomum pelo poder
de Deus, acontecimentos tão extraordinários que em geral os consideramos impossíveis.
” (Monteiros, 2015). Os milagres também atestam o poder do Evangelho (Cabral,
2011), o que nos faz lembrar as palavras paulinas:
Não
me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo
aquele que crê: primeiro do judeu, depois do grego. - Romanos 1:16
Sabe-se que Satanás e seus anjos podem
fazer certos “prodígios”, mas enquanto seres limitados não possuem poder parta
operar verdadeiros milagres, entendidos dentro do seu significado teológico e
teleológico: “Além disso, todo o poder que o diabo possui lhe foi dado por
Deus, sendo cuidadosamente limitado e monitorado (cf. Jó 1:10-12).” (Marinho, 2015). Assim, em sua natureza teológica, o milagre é
entendido como sendo de origem divina, operado pelo poder de Deus e revelando a
onipotência do Altíssimo:
Ó
Soberano Senhor, tu começaste a mostrar a teu servo a tua grandeza e a tua mão
poderosa! Que Deus existe no céu ou na terra que possa realizar as tuas obras e
os teus feitos poderosos? - Deuteronômio 3:24
TELEOLOGIA DO MILAGRE
Quanto aos objetivos do milagre, ele é
um evento que tem como propósito glorificar a Deus. Portanto, ele não é antropocêntrico,
nem visa chamar atenção para a habilidade de algum homem. É a Deus, e não aos
homens que se atribui a glória revelada no milagre (Gonçalves, 2013). Por
conseguinte, o milagre não tem como propósito produzir shows ou espetáculos,
como o que ocorre nas igrejas neopentecostais (Andrade, 2011).
Donald Stamps apresenta
a teleologia do milagre:
Os
propósitos dos milagres no reino de Deus são pelo menos três: (a) dar
testemunho de Jesus Cristo, autenticando a veracidade de sua mensagem e
comprovando a sua identidade como o Cristo de Deus ([João] 2.23; 5.1-21; 10.25;
11.42); (b) expressar o amor compassivo de Cristo (At10.38; Mc8.2; Lc 7.12-15)
(c) evidenciar a era da salvação (Mt11.2ss), a vinda do reino de Deus... e a
invasão do domínio de Satanás por Deus... (Stamps,1995, p.1582)
Mais especialmente os milagres são
sinais que servem de credencial para uma mensagem incomum da parte de Deus. Vemos
isso em Moisés, cujos sinais miraculosos objetivavam confirmar e credenciar seu
chamado (Êxodo 4.1-8). O ministério e a mensagem apostólica também foram
confirmados por sinais:
O poder de realizar
milagres estava ligado ao ofício apostólico e tinha como seu propósito a
autenticação dos apóstolos como servos especiais de Cristo e a confirmação da
doutrina deles como o evangelho de Deus. Isso não implica que somente os
apóstolos poderiam realizar milagres; de fato, outros santos também possuíram o
dom de operação de milagres. (Engelsma, 2007, p.15).
ONTOLOGIA DO MILAGRE
Por fim, o milagre é, em sua natureza e
por definição, uma ocorrência rara, singular e incomum, que causa espanto nos
seus observadores e atrai a atenção do povo de Deus. O escritor dos Hebreus
descreve muito bem isso, apresentando também a arqueologia, teleologia e
ontologia do milagre:
Como escaparemos nós, se
tivermos negligenciado uma salvação de tal magnitude, sendo que começou a ser
anunciada por intermédio do Senhor e nos foi confirmada por aqueles que o
ouviram, ao passo que Deus se juntou em dar testemunhos em sinais, e também com
maravilhas e por múltiplos poderes, e dons do Espírito Santo, distribuídos por
sua vontade? – Hebreus 2.3-4
Ante a ontologia do milagre como um
evento incomum, alguns filósofos céticos têm argumentado contra a possibilidade
ou credibilidade dos milagres. Pode-se falar de dois tipos de argumento:
argumento da imutabilidade da lei natural e argumento do princípio da
repetibilidade:
ARGUMENTO DA
IMUTABILIDADE DA LEI NATURAL
Este argumento contra milagres aparece
em Baruch Spinoza e afirma que as leis naturais são imutáveis e portanto não
podem ser violadas. O problema desse argumento é um petitio principii (‘mendigar a pergunta’), isto é, a definição de
leis naturais como imutáveis já pressupõe uma visão anti-sobrenaturalista. Poderíamos
apontar simplesmente um erro conceitual, e a partir de então definiríamos as
leis naturais, como fazem alguns cientistas, como médias estatísticas ou
probabilidades a respeito de como as coisas funcionam e não padrões que não
possibilitem exceções (Geisler, 2015). Também já foi dito, alhures, que
milagres não são antinaturais, mas sim sobrenaturais, pois são uma adição de
uma causa sobrenatural e não quebras da lei da causalidade.
ARGUMENTO DO PRINCÍPIO DA
REPETIBILIDADE
Este argumento aparece em David Hume e
Antony Flew. Huxley faz o seguinte resumo do argumento de Hume: “Quanto mais a
afirmação da ocorrência de um fato conflita com a experiência prévia, tanto
mais completa deve ser a evidência que porventura possa justificar a crença em
sua ocorrência” (Chaves, n.d.). As premissas do argumento seriam as seguintes:
Premissa 1 - A, lei
natural é, por definição, uma descrição de uma ocorrência regular.
Premissa 2 - O milagre é,
por definição, uma ocorrência rara.
Premissa 3 - A evidência
em favor do regular é sempre maior do que a evidência em favor do raro.
Premissa 4 - Quem é sábio
sempre baseia sua crença na evidência mais convincente.
Conclusão - Portanto, um
sábio não deveria acreditar em milagres. (Forti, 2014)
Antony Flew, de modo similar, também
argumenta que na prática as evidências a favor do geral e repetível são sempre
maiores que aquelas a favor do particular e não-repetível, portanto, na
prática, as evidências contra os milagres sempre serão maiores do que aquelas a
favor deles (Geisler, 2015).
O argumento baseado no princípio da
repetibilidade é incoerente com a própria epistemologia de Hume caindo na
falácia de uma conjunção constante e de uma espécie de consensus gentium. Não podemos com base na uniformidade de
experiências passadas negar eventos futuros. O argumento baseado no princípio
da repetibilidade eliminaria alguns dos próprios pressupostos naturalistas, que
admitem algumas singularidades não-repetíveis, além de, se for levado a sério,
servir de base para negar eventos históricos singulares ocorridos no passado
(Geisler, 2015). O argumento de Hume faz uma confusão entre “probabilidade” e “credibilidade”
(Forti, 2014):
O
que Hume parece deixar passar em branco é que as pessoas sábias, na verdade,
baseiam as suas crenças em fatos, não
em probabilidades. Às vezes, a
probabilidade contrária a um evento é muito alta, mas a evidências a favor
desse evento é muito boa. (Geisler, 2015, p. 51).
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Do ponto de vista bíblico, os milagres
são sinais de Deus, operados pelo poder divino, para a glória dele e para chamar
a atenção e atrair o povo da Aliança. As operações sobrenaturais de Deus não
são apenas verdades biblicamente fundamentadas, mas também eventos
filosoficamente possíveis. Diante do valor dos milagres para a Teologia e ortodoxia
evangélica, os cristãos precisam afirmar a veracidade e historicidade dos milagres,
rejeitando todo ensino, que influenciado pelo positivismo, pelo liberalismo ou
pelo ceticismo, querem levar dos crentes a fé nos milagres de Deus.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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do Pentecostalismo. Monergismo.
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Disponível em: http://pacocapessoal.tumblr.com/post/82847448351/as-evidencias-hist%C3%B3ricas-da-ressurrei%C3%A7%C3%A3o-de-jesus
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das Assembleias de Deus (Revista EBD).
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