SEGUNDA INVESTIGAÇÃO LÓGICA (RESUMO)



        O que se segue é um resumo da Segunda Investigação Lógica de Edmund Husserl, pai da Fenomenologia. Esta Investigação trata da Unidade Ideal da Espécie e as Modernas Teorias da Abstração, consiste em uma análise fenomenológica da consciência do geral contra os erros cometidos pelos nominalistas. É importante colocar que este resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor original.


INTRODUÇÃO

       Compreendemos, na primeira investigação, a significação como unidade ideal da espécie. A significação como espécie é alcançada por meio da abstração. A questão da abstração é importante para a Lógica pura por dois motivos: (i) porque, sob as distinções categoriais das significações que a lógica pura tem de ter essencialmente em consideração, se encontra também a distinção correspondente à oposição de objetos individuais e universais; (ii) porque, as significações em geral como unidades de espécie configuram o domínio da lógica pura.  Aqui se deve defender o direito próprio dos objetos específicos ideais ante os objetos individuais reais assegurando o Idealismo como única possibilidade de uma Teoria do Conhecimento que reconheça o ideal como condição para o conhecimento objetivo.

I. OS OBJETOS UNIVERSAIS E A CONSCIÊNCIA DE UNIVERSALIDADE

        Os objetos universais tornam-se conscientes para nós em atos essencialmente diferentes daqueles em que nos tornamos conscientes dos objetos individuais. Isto é, os objetos específicos ideais são evidentemente distintos dos objetos individuais e, também, é evidente o modo distinto do representar no qual uns e outros objetos vêm até nós.
       Chamamos de ato de visar individual ao ato no qual nós nos voltamos para o fenômeno e visamos o próprio aparecente enquanto “este” que aparece. Por outro lado, chamamos de ato de visar especializante ao ato de apreender ao conteúdo do que aparece, não como “este”, mas enquanto ideia.
      Os excessos do Realismo levaram a uma negação não só da realidade da espécie, mas também da sua objetividade. Contra isso, é preciso observar que no conhecimento, uma espécie se torna efetivamente objeto e, sendo assim, são possíveis juízos em relação à espécie do mesmo modo em que são possíveis juízos em relação aos objetos individuais.
        A diferença entre as singularidades individuais e específicas corresponde à diferença entre as universalidades individuais e específicas. Nesse sentido, pode-se falar de juízos individuais singulares (exemplo: Sócrates é um homem), juízos específicos singulares (exemplo: Dois é um número par), juízos individuais universais (exemplo: Todos os homens são mortais) e juízos específicos universais (exemplo: Todas as proposições puramente lógicas são “a priori”).
        A significações são algo idêntico. Onde quer que exista igualdade encontramos também uma identidade. Cada igualdade tem relação com uma espécie que subjaz aos elementos comparados. Considerando isso, é possível falar da intenção em dois sentidos distintos: (i) a intenção quando apreendemos unificadamente um grupo de objetos em uma unidade intuitiva, ou quando reconhecemos de uma só vez a igualdade enquanto tal ou também quando, em atos singulares de comparação reconhecemos a igualdade de um determinado objeto com os objetos do grupo; (ii) a intenção quando captamos o atributo que constitui a indicação da igualdade ou da comparação, como uma unidade ideal. O visado é o universal, a unidade ideal e não os singulares ou múltiplos.
      
II. O SUBSTANCIALIZAR PSICOLÓGICO DO UNIVERSAL

       Dois erros dominaram o desenvolvimento das teorias sobre o objetos universais: (i) o substancializar metafísico do universal: aceitação da existência real de espécies fora do pensamento, que subjaz ao realismo platônico e; (ii) o substancializar psicológico: a aceitação de uma existência real de espécies no pensamento que teve um efeito histórico particular na filosofia de John Locke. O defeito fundamental da teoria do conhecimento de Locke é a falta de clareza da ideia de ideia, o que leva a consequências absurdas. A esses dois erros, liga-se um terceiro, o nominalismo, que acredita poder transformar o universal relativamente ao objeto e ao ato de pensar em particular.

III. ABSTRAÇÃO E ATENÇÃO

         Algumas teorias nominalistas consideram a abstração como uma mera realização da atenção. Segunda essas teorias, não existem nem representações universais, nem objetos universais, no entanto, enquanto representamos intuitivamente os elementos concretos individuais, podemos voltar uma atenção exclusiva para as diversas partes e lados do objeto. A nota característica que, em e por si mesma não pode ser, nem efetiva, nem representada, torna-se objeto de um interesse exclusivo que, com isso, prescinde todas as notas características ligadas a ela. É assim que se compreende a si mesmo o abstrair tanto em sentido positivo quanto em sentido negativo.
        O nominalismo erra: (i) em não indicar o dado descritivo e o que precisa ser explicado, nem a relação entre ambos. (ii) em ser uma reação exagerada à teoria das ideias de John Locke. O nominalismo rejeita não só as ideias abstratas de John Locke, mas também os conceitos universais. (iii) no que diz respeito à importante diferença entre a universalidade da função psicológica e a universalidade que pertence ao próprio conteúdo de significação. (iv) em desatender totalmente às formas de consciência nas suas peculiaridades irredutíveis.
        No entanto, o erro principal de todas as teorias nominalistas a respeito da abstração consiste na incompreensão da essência da atenção.  Se é correta a teoria da atenção da abstração e se, no seu sentido, o reparar em todo o objeto e o reparar nas suas partes e notas características é, em essência, o mesmo ato, não há para nossa consciência quaisquer espécies. Nesse caso, a consciência sempre se dirigiria para o singular individual. Essa teoria falha em seu alvo, pois querendo explicar a consciência de universalidade, ela abandona a consciência no conteúdo das suas explicações.

IV. ABSTRAÇÃO E REPRESENTAÇÃO

        Segundo a teoria da representação, existem apenas representações intuitivas singulares, e nelas se realiza todo pensar. Na modernidade, essa teoria é refinada com a noção de substituição: embora só existam representações intuitivas individuais, há um direcionamento da consciência à comodidade pensante que troca as representações individuais por outras delas substitutas, representantes de caráter generalizante.
        Os erros dessa teoria resultam do fato de ela se deter quase exclusivamente no singular intuído enquanto nada sabe fazer com os caracteres de ato. Continuamente procura quaisquer singularidades sensíveis enquanto não considera os atos de pensamento como aquilo que eles apresentam de modo puramente fenomenológico.

V. ESTUDO FENOMENOLÓGICO SOBRE A TEORIA DA ABSTRAÇÃO DE HUME

       A teoria da abstração de David Hume defende que a representação individual se generaliza quando um nome geral se liga a ela e, através do hábito, liga-se a outras representações individuais, estabelecendo-se uma relação associativa. É importante considerar a teoria de Hume sobre a distinção de razão, isto é, a distinção em nossos conceitos à qual não corresponde uma distinção real.         
       Quanto a isso, um pensamento paradoxal parece estar presente em Hume, adotado de maneira mais clara por seus seguidores, o de que as notas características (qualidades internas) não são algo inerente aos objetos que as têm. Antes, existe apenas pedaços, conteúdos parciais abstratos que não existem por si, sendo meras ficções fundadas nas coisas.
        Se os conteúdos abstratos nada são, então os conteúdos de enlace e de relação na intuição de um conteúdo de forma de unidade correspondente também nada são.  Ao ceticismo no que diz respeito aos conteúdos parciais abstratos, corresponde também um ceticismo em relação aos conteúdos parciais concretos, isto é, a dúvida quanto à própria existência de multiplicidade de conteúdos concretos, o que conduziria à afirmação de que a consciência é algo absolutamente unitário, o qual, pelo menos, não podemos saber se tem, em geral, conteúdos parciais.       
       Esse ceticismo precisa ser refutado. Se transformarmos os conceitos e as relações empíricos em conceitos e relações exatos, se construirmos conceitos ideais de extensão, de superfície, de igualdade e de continuidade qualitativas, etc.; surgirão proposições a priori exatas, que põem em separado o que se fundamenta nas intenções dos conceitos rigorosos. Mas, embora o vago, o domínio da experiência em geral, não pertença à esfera do conhecimento exato que opera com puras idealidades, não está, por isso, de forma alguma excluído da esfera do conhecimento em geral.

VI. SEPARAÇÃO DE DIFERENTES CONCEITOS DE ABSTRAÇÃO E DE ABSTRATO

       A teoria da abstração por meio da atenção pressupõe o que nega a teoria da distinção de razão, isto é, que nos próprios conteúdos existe uma certa diferença que corresponde à diferença entre o abstrato e o concreto. No entanto, a teoria da abstração enfrenta uma confusão entre abstração e abstrato de modo que é preciso estabelecer algumas distinções.
        No que diz respeito aos conteúdos podemos dizer: (i) conteúdos abstratos são conteúdos dependentes, conteúdos concretos são conteúdos independentes. (ii) o devido conceito de abstração significa o ato por meio do qual um conteúdo abstrato é distinguido. (iii) a abstração é uma vivência descritiva própria na qual ocorre o realce do conteúdo abstrato a partir do fundo concreta. (iv)  a diferença entre o concreto e o abstrato não está na natureza própria do conteúdo, mas no modo de ser dado, chama-se abstrato um conteúdo na medida em que é abstraído, concreto, na medida em que não o é. (v) se entendermos por abstrair, em sentido positivo, o atender que privilegia um conteúdo, e por abstrair em sentido negativo o não reparar em conteúdos concomitantemente, a referência semântica exclusiva a conteúdos dependentes perde o sentido.
        Quanto ao conceito de espécie: (i) entendemos por conceitos as significações dos nomes. Os nomes podem ser concretos (nomeiam indivíduos) ou abstratos (nomeiam atributos). Por traz dessa distinção gramatical, há uma distinção lógica entre as significações nominais dirigidas aos atributos das significações nominais dirigidas aos objetos. (ii) em outro sentido, pode-se chamar de representação concreta aquela que representa diretamente um objeto individual e representação abstrata aquela que é mediada por representações atributivas. (iii) o discurso sobre a abstração também se ocupará dos atos através dos quais surgem os “conceitos” abstratos, trata-se dos atos nos quais os nomes universais obtêm a sua relação direta com unidades específicas.

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