TERCEIRA INVESTIGAÇÃO LÓGICA (RESUMO)
O
que se segue é um resumo da Terceira
Investigação Lógica de Edmund
Husserl, pai da Fenomenologia. A Terceira Investigação Lógica trata da Doutrina dos Todos e das Partes na qual
Husserl define os conceitos de objetos independentes e dependentes e das
relações de fundação. É importante colocar que este
resumo é apenas uma apresentação do texto original de forma compactada, sem
paráfrases ou resenhas críticas. A ideia é de que o texto permaneça do autor
original.
INTRODUÇÃO
A
diferença entre conteúdos abstratos ou
dependentes e conteúdos concretos ou conteúdos
independentes considerada na Segunda Investigação é de grande importância para as investigações fenomenológicas de
modo que precisa ser aprofundada. Uma fundamentação mais profunda da diferença
entre conteúdos dependentes (abstratos)
e conteúdos independentes (concretos)
conduz às questões fundamentais da doutrina
pura, pertencente à ontologia formal, dos todos e das partes.
I. A DIFERENÇA ENTRE OS OBJETOS
INDEPENDENTES E DEPENDENTES
Os objetos podem encontrar-se, uns em
relação aos outros, na relação de todos ou
de partes. O termo parte pode ser entendido como tudo o
que em um objeto se pode distinguir.
Os objetos compostos são aqueles que
possuem partes enquanto os objetos
simples são aqueles que não possuem partes. As relações entre as partes dos
objetos compostos podem ser de diferentes tipos: as partes podem encontrar-se
relativamente dependentes entre si de
modo a podermos falar de uma penetração
recíproca ou podem encontra-se relativamente independentes umas em relação às outra de modo a possuírem o
carácter de pedaços entrelaçados
entre si.
Alguns conteúdos são pensáveis apenas como partes, são aqueles nos
quais a modificação ou a supressão de pelo menos um dos conteúdos dados em
conjunto com ele teriam de modificá-los ou suprimi-los. Outros conteúdos, mesmo
que fora deles nada existisse, ainda que nada se ligasse a eles ou mesmo se, existindo
com eles outros conteúdos, estes fossem modificados ou suprimidos, eles
permaneceriam intocáveis.
Os conteúdos independentes são partes de
complexos representativos que são dados
em conjunto na consciência, embora sejam captados de maneira separada de acordo com suas naturezas
próprias. Por outro lado, os conteúdos dependentes não possuem tal separabilidade direta ao serem dados em
conjunto na consciência.
A separabilidade
não significa senão que podemos fixar de forma idêntica determinado conteúdo na
representação, por variação
ilimitada dos conteúdos ligados e o mesmo diz que ele se mantém intacto através
da supressão de qualquer consistência dos conteúdos ligados.
As nossas distinções entre conteúdos
dependentes e independentes se relacionam, em primeiro lugar, com o ser das
singularidades individuais, pensado em universalidade
ideal, isto é, singularidades tomadas como singularidades de ideias.
Assim, tais distinções transportam-se para as próprias ideias de modo
que se pode falar em ideias dependentes
e ideias independentes. Poderia se
chamar de relativamente independente uma
diferença ínfima de um gênero puro superior por referência à sequências de
níveis de espécies puras até ele e de cada espécie inferior de ser perante as
superiores enquanto poderia se chamar de relativamente dependentes as espécies, cujas singularidades individuais
correspondente, não pudessem existir a
priori, sem que, ao mesmo tempo, tivessem de pertencer à extensão
individual, mas puramente pensada, de outras espécies.
A diferença entre os conteúdos
dependentes e independentes se cruza com a diferença entre os conteúdos que, intuitivamente, se separam dos conteúdos que se ligam e os conteúdos que se fundem, que neles transbordam em separação. Tal separação intuitiva, repousa, muitas
das vezes, na descontinuidade.
Aos diferentes tipos puros de
dependência entre conteúdos correspondem diferentes tipos de leis puras vinculantes.
As leis podem dizer respeito às categorias
materiais (conceitos que respeitam ao conteúdo, exemplos: casa, árvore,
cor, som, espaço, sensação, sentimento, etc), às categorias formais (conceitos de qualquer coisa, um, objeto, qualidade,
relação, enlace, multiplicidade, número, ordem, todo, parte, grandeza, etc.) de
modo que se pode falar em leis materiais
e leis formais. As categorias materiais
se relacionam com as disciplinas
sintéticas a priori (ontologias
materiais) e as categorias formais se relacionam com as disciplinas analíticas a priori (ontologias formais). Por fim, pode-se
falar de leis analíticas que são
proposições incondicionalmente universais que não contém senão os conceitos
formais.
Até aqui, as relações de dependência e
independência foram consideradas em sentido absoluto, a independência absoluta pode ser entendida como uma certa não
pendência de todos os conteúdos concomitantes e a dependência absoluta pode ser compreendida como pendência
correspondente pelo menos de um conteúdo. Mas é importante definir os conceitos
também como relativos de modo que a distinção
absoluta se caracteriza como caso limite
da relativa. No interior da esfera das meras doações sensíveis vale como
dependente o momento do espaçamento visual com todas as suas partes. No
entanto, no interior do espaçamento considerado em abstrato, cada um dos
pedaços vale como relativamente
independente; cada um dos seus momentos, como a forma, vale como relativamente dependente.
Quanto à dinâmica de dependência e
independência relativas, o tempo tem
importante papel. O necessário existir em conjunto é ou uma coexistência que se
deve relacionar com um ponto do tempo qualquer ou mesmo um existir em conjunto
numa extensão de tempo. No segundo caso, o fluxo fenomenológico da consciência
decorre de cada agora atual vinculado a um já-sido, que por conseguinte, determina
o futuro da consciência.
II. PENSAMENTOS
PARA UMA TEORIA DAS FORMAS PURAS DOS TODOS E DAS PARTES
As relações entre as partes e estas com
os todos se dá como uma relação de
fundamentação. Como modelos de tais relações de fundamentação podem ser
colocadas seis proposições:
Primeira proposição: Se
um primeiro conteúdo enquanto tal necessita de fundação por meio de um segundo conteúdo,
então cada todo que tem o primeiro conteúdo como parte, mas não o segundo
conteúdo, também precisa precisamente de uma tal fundação.
Segunda Proposição: Um
todo, que engloba como parte um momento dependente, sem o complemento que ele
exige, é igualmente dependente, e o é relativamente a cada todo superior
independente, no qual esteja também contido aquele momento dependente.
Terceira Proposição: Uma
parte independente de uma parte independente, é uma parte independente do todo.
Quarta Proposição: Uma
parte dependente de uma parte dependente é uma parte dependente de um todo.
Quinta Proposição: Um
objeto relativamente dependente é também absolutamente dependente; em
contrapartida, um objeto relativamente independente pode ser dependente em
sentido absoluto.
Sexta Proposição: Se
dois conteúdos são partes independentes de um todo, eles são também
independentes relativamente um ao outro.
A relação de fundamentação entre as
partes de um todo podem ser de dois tipos: (1) Recíproca: quando a dinâmica de fundamentação é bilateral ou; (2) Unilateral: conforme o fato de a
correspondente conformidade a uma lei ser reversível ou não. A fundação de uma
parte numa outra pode, posteriormente ser imediata
ou mediata conforme ambas as
partes se encontrem num enlace imediato ou mediato.
Aqui, cabe definir de maneira mais clara
alguns conceitos: Chama-se pedaço a
cada parte autônoma relativamente a um todo e momento a cada parte não autônoma relativamente a um todo, uma parte abstrata. A pedaços que não têm
nenhum pedaço idêntico em comum dá-se o nome de pedaços disjuntos ou pedaços
que se excluem. À repartição de um
todo numa multiplicidade de pedaços que se excluem chama-se despedaçamento. Aos pedaços quando
estão disjuntos em sentido estrito, isto é, quando também não têm mais nenhum
momento idêntico chamam-se pedaços
separados.
Chama-se todo extensivo um todo que admite um despedaçamento de modo que os
pedaços, de acordo com a sua essência, são do mesmo gênero inferior do que o
determinado por meio do todo indiviso. Chamam-se partes extensivas as partes de um todo extensivo. Um objeto
relativamente aos seus momentos abstratos, chama-se elemento concreto relativo e, em relação aos seus momentos
próximos, chama-se elemento concreto
próximo. Um elemento concreto que não é abstrato segundo nenhuma direção
recebe o nome de elemento concreto
absoluto.
Ainda é possível distinguir partes mediatas e imediatas ou entre as partes
próximas e afastadas. Em um
primeiro sentido, a mediatez ou imediatez podem ser relativas ou absolutas. Quanto
às relativas, elas ocorrem quando partes de partes relacionam-se ao todo ou a
outras partes do mesmo todo. Quanto às absolutas, dividem-se em partes absolutamente mediatas, aquelas
relativamente às quais há, no todo, partes nas quais elas residem como partes e
em partes absolutamente imediatas,
partes que não devem valer como partes de nenhuma parte do mesmo todo. Em um
segundo sentido, a mediatez ou imediatez podem ser próximas ou afastadas do
todo.
Cabe agora definir claramente o conceito
de todo que foi apenas pressuposto
nas análises anteriores. Por um todo entendemos um conjunto de conteúdos que se
tornam abrangentes por meio de uma fundamentação
unitária. Aos conteúdos de um todo dá-se o nome de partes. O discurso do caráter unitário da fundação
deve significar que cada conteúdo se relaciona com qualquer outro, direta ou
indiretamente, por meio da fundação.
Existem leis constitutivas sintéticas a priori dos diversos tipos de todos. De
acordo com a forma pura da lei
determinam-se as formas puras de
todos e de partes por meio de um processo de abstração formalizante diferente da abstração em seu sentido
habitual. Formalizando, estabelecemos no lugar do nome que designa o tipo de
conteúdo correspondente, expressões indeterminadas de gênero e, com isso, ao
mesmo tempo, encontram-se, no âmbito da significação, as substituições correspondentes relacionadas aos pensamentos categoriais e materiais. Assim, as distinções entre partes abstratas e
pedaços, entre partes próximas e afastadas deixa-se reduzir à mera forma de
certas formas de fundação e formalizar completamente.
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