A FUNÇÃO DA LEI - GÁLATAS 3.23-29
Como já observado nas exegeses de porções de capítulos
anteriores (1.6-10 e 2.15-21), Paulo está escrevendo para pessoas que ele havia evangelizado em
sua primeira viagem missionária. No entanto, falsos mestres judaizantes haviam
se infiltrado entre os gálatas, negando o apostolado paulino e ensinando a
justificação pelas obras da Lei. Para refutar a heresia dos judaizantes, o
apóstolo deixa claro que a doutrina da justificação pela fé é uma doutrina
fundamental da religião cristã.
Paulo prossegue sua exortação aos
gálatas, relembrando-os de quando receberam o Evangelho pela fé e não pelas
obras (3.1-5), em seguida cita o exemplo veterotestamentário de Abraão que foi
justificado pela fé (3.6-14), mostra que o propósito da Lei é revelar o pecado
e a condenação, não salvar, mas apontar a necessidade de se buscar salvação em
Cristo (3.15-22).
O apóstolo mostra que a Aliança de Deus
com Abraão não foi revogada, que essa Aliança se cumpre em Cristo, o
Descendente de Abraão. Paulo continua mostrando que a Lei não anula essa
Aliança de graça, mas que Deus deu essa Lei para apontar o pecado. No entanto,
a Lei não tem o poder de salvar ou justificar, pois todos são transgressores
dela de modo que a justificação só pode vir de Cristo por meio da fé.
O objetivo do texto não é opor a
dispensação do Antigo Testamento e a dispensação do Novo Testamento. O apóstolo
havia acabado de falar que mesmo Abraão está entre aqueles que foram
justificados pela fé. Além disso, o texto se dirige especialmente aos gálatas
gentios e não a judeus que viveram sob a antiga dispensação. O texto se refere
à experiência individual de cada eleito de Deus antes e depois de ser
subjetivamente justificado pela fé.
23 Mas, antes que viesse a fé, estávamos sob a
tutela da lei e nela encerrados, para essa fé que, de futuro, haveria de
revelar-se.
Πρὸ τοῦ δὲ ἐλθεῖν τὴν
πίστιν ὑπὸ νόμον ἐφρουρούμεθα συνκλειόμενοι εἰς τὴν μέλλουσαν πίστιν ἀποκαλυφθῆναι.
O apóstolo Paulo mostra que antes que
viesse essa fé por meio da qual o pecador é justificado, nós estávamos debaixo
da Lei que tinha o propósito de nos conduzir a esta futura fé que haveria de
ser revelada.
Mas, antes que viesse
a fé Πρὸ
τοῦ δὲ ἐλθεῖν τὴν πίστιν: O texto fala de um período anterior à fé. Diz respeito ao tempo em que
o pecador ainda não encontrou a fé em Cristo, estando em pecado, debaixo da
condenação e sob a obrigação de cumprir o Pacto de obras. A NTLH diz: "Mas,
antes que chegasse o tempo da fé", de modo similar a versão OL traz:
"antes que chegasse esse tempo em que a fé em Cristo nos abriu a entrada
junto a Deus". Ou seja, Paulo fala de um tempo antes que tivéssemos acesso
a Deus por meio da fé, isto é, quando estávamos alienados de Deus por nossos
pecados. O "mas" deixa claro que a condição do cristão antes de
encontrar a fé em Cristo é oposta à sua condição após tê-la encontrado. Como já
observado na exegese anterior, "πίστις" é operada em nós por Deus e é
a firme convicção e confiança na revelação divina.
estávamos sob a
tutela da lei e nela encerrados ὑπὸ νόμον ἐφρουρούμεθα συνκλειόμενοι: O texto diz que
estávamos sobre a "custódia" da Lei (NVI), ou seja, a Lei exercia
sobre nós o papel como de um guarda quando vigia um prisioneiro: "nós
estávamos como que guardados e vigiados pela lei" (OL); "nós éramos
prisioneiros da lei" (NTLH). A palavra grega para “estávamos sob a tutela
da lei” era usada para falar da proteção de uma cidade feita por guardas
militares, tanto para manter um inimigo fora e proteger os habitantes, quanto
para impedir a fuga de um inimigo preso na cidade (2 Coríntios 11.32; Atos 9.24
– JS, p.89). A Lei é um guarda a vigiar um prisioneiro não dando espaço para
que ele escape de suas exigências e punições. "Νόμος" provavelmente
se refere à vontade revelada de Deus que nos condena como transgressores e nos
encerra debaixo do pecado. O verbo "συγκλείω", usado no particípio
presente, que também aparece no verso anterior ("a Escritura encerrou
tudo sob o pecado") traz a ideia de "enclausurar" (SC), “impedir”
ou “engaiolar” (JS, p.89), reforçando a analogia do homem natural como
aprisionado pela Lei. A Lei é, em comparação ao verso anterior, identificada com
a Escritura, a revelação de Deus. A Lei de Deus, revelada na Escritura,
encerrou tudo sob o pecado, ou seja, todos são declarados como prisioneiros,
transgressores condenados pela Lei. A ideia é que a Lei nos mantinha
aprisionados para que não pudéssemos escapar (JS, p.89).
para essa fé que, de
futuro, haveria de revelar-se. εἰς τὴν μέλλουσαν πίστιν ἀποκαλυφθῆναι. A versão OL traz a ideia de
que, enquanto percebíamos nossa condenação, aguardávamos o momento em que
receberíamos o poder de crer no Salvador: "esperando o momento em que,
pela fé, pudéssemos crer no Salvador, que havia de vir." Novamente, a fé é
apresentada como um dom que vem de Deus e se manifesta em nós, não uma obra
nossa. Na literatura grega, o verbo "μέλλω", usado aqui no particípio presente,
traz a ideia de "coisas que acontecerão (ou que serão feitas ou sofridas)
por necessidade fixa ou decreto divino" (TGL). Isso reforça a ideia de que
a fé vem de Deus, ela é dada em conformidade com o desígnio divino. O verbo
"ἀποκαλύπτω", usado no aoristo, de onde vem "apocalipse"
(revelação), comunica a ideia de uma passagem de algo que antes era inexistente e agora se
tornou manifesto. Não existia fé no homem natural, mas a partir do momento em
que Deus opera tal fé no homem, ela se torna visível.
24 De maneira que a lei nos serviu de aio para
nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados por fé.
ὥστε ὁ νόμος παιδαγωγὸς
ἡμῶν γέγονεν εἰς Χριστόν, ἵνα ἐκ πίστεως δικαιωθῶμεν·
A Lei, nesse sentido, funciona como um
tutor cuja função é revelar o padrão moral de Deus, mostrar que somos
transgressores desse padrão e que estamos, por nossas transgressões, condenados, a fim de que busquemos justiça, não em nós mesmos, mas em Cristo. Assim, a Lei
atua como um tutor que conduz o pecador a Cristo a fim de ser justificado, não
pelas obras da Lei, mas pela fé.
De maneira que a lei
nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo ὥστε ὁ νόμος παιδαγωγὸς
ἡμῶν γέγονεν εἰς Χριστόν: "De maneira que...", isto é, antes estávamos debaixo da Lei
que nos conduziu a Cristo, de modo que,
ela funcionava como um aio. Aqui a Lei é comparada a um "pedagogo" -
SBB ("παιδαγωγὸς": "tutor"-NVI;
"educador"- OL; "guia" - VFL), a NTLH traduz essa ideia
como: "a lei ficou tomando conta de nós até que Cristo viesse". Entre os
gregos e romanos, o "pedagogo" era um escravo confiável que ficava
encarregado de supervisionar a vida e a moral dos meninos pertencentes à melhor
classe. A disciplina do "pedagogo" era mais rígida do que a de um pai
(1 Coríntios 4.15). O tutor era o disciplinador da criança e severo a ponto de
ser cruel e que castigava a criança por suas más ações (JS, p.90). A Lei é como um "pedagogo" que
desperta a consciência do pecado e prepara a alma para Cristo, mostrando-a que
ela não pode salvar-se por suas obras (TGL). A Lei não só mostra que não
estamos a sua altura, mas sim que a transgredimos completamente. A Lei pode
mostrar que não somos justos, mas não pode nos salvar (TK, p.86). O verbo
"γίνομαι" está no perfeito do indicativo indicando algo passado, o
que revela que a Lei já não cumpre esse propósito pedagógico na vida do
cristão. Os cristãos não estão mais sujeitos à Lei como um Pacto de Obras, nem
estão mais sob sua condenação.
a fim de que fôssemos
justificados por fé. ἵνα ἐκ πίστεως δικαιωθῶμεν·: O significado de justificação pela fé já foi
tratado quando se fez a exegese no capítulo anterior. Como observado, a
justificação é o ato objetivo pelo qual Deus, baseado na justiça de Cristo, declara
justo o pecador e essa declaração é subjetivamente aceita pelo pecador por meio
de uma firme confiança gerada nele pelo próprio Deus. A Lei, portanto, revela
ao pecador a impossibilidade de que esse se salve com base em sua própria
justiça a fim de que ele busque na justiça de Cristo a sua salvação. O verbo
"δικαιόω" está no aoristo, reforçando que a justificação, diferente
da santificação, é um ato não repetido e que ocorre de uma vez por todas. Muitos cristãos passam por uma experiência
similar antes de abraçarem completamente a doutrina da justificação pela fé.
Passam por um estágio de imaturidade quando se tornam extremamente legalistas,
buscando cumprir tarefas religiosas para se tornarem muitos bons. Enfrentavam
nesse estágio muitos altos e baixos emocionais por suas ansiedades em cumprir
suas exigências legalistas e por seus fracassos em tentar alcançar a justiça por meio
de obras. Neste estágio agiam como crianças imaturas vigiadas por um tutor até
que abraçaram verdadeiramente e com fé a justiça de Cristo e passaram a confiar
unicamente nele para salvação (TK, p.89). João Calvino deixa claro que a
justificação pela fé necessariamente exclui completamente qualquer tentativa de
buscar justiça por meio das obras:
“...a
justiça da fé e a justiça das obras diferem entre si; que, em subsistindo uma,
necessariamente se derruba a outra... aquele que queira obter a justiça de
Cristo deve dar de mão à justiça própria... Se ao estabelecer a justiça
própria, alijamos a justiça de Deus, para que consigamos esta, então
necessariamente aquela é inteiramente abolida... Donde se segue que por quanto
tempo permanecer a mínima parcela de justiça proveniente das obras, em nós
permanece alguma razão de nos gloriarmos. Ora, se a fé exclui toda jactância, a
justiça proveniente das obras de modo algum pode associar-se à justiça
proveniente da fé.” (JC 3.11.13).
25 Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos
subordinados ao aio.
ἐλθούσης δὲ τῆς
πίστεως οὐκέτι ὑπὸ παιδαγωγόν ἐσμεν.
O apóstolo mostra que a partir do
momento em que somos justificados pela fé, a Lei perde sua função de mostrar que
estamos condenados por nossos pecados. O homem justificado pela fé já não está
mais debaixo da Lei como Pacto de Obras, nem está mais condenado, pois a
punição que a Lei exigia contra seus pecados, foi paga em Cristo. Além disso,
Cristo já cumpriu toda a Lei no lugar daqueles a quem justifica, de modo que o
justificado é considerado, diante do Tribunal de Deus, como tendo já cumprido
toda a Lei. Dessa forma, o cristão não tem de obedecer a Lei como uma forma de
satisfazer a Lei. É nesse sentido que o cristão não está mais subordinado à
Lei, no entanto, embora o cristão não mais tenha de obedecer a Lei para
justificação, ele deve obedecê-la para santificação.
Mas, tendo vindo a fé
ἐλθούσης δὲ τῆς
πίστεως : Esta expressão (ARC: Mas, depois que veio a fé) contrasta
com a do verso 23 (ARC: Mas, antes que a fé viesse), até aqui Paulo tratou da condição
dos eleitos antes da justificação pela fé quando eles estavam debaixo da Lei,
agora o apóstolo passa a tratar da condição do eleito a partir do momento em
que o mesmo é justificado por Deus. O “mas” enfatiza que o que somos agora é o
oposto do que éramos antes da fé (JS, p.91). O verbo "ἔρχομαι" é
usado no aoristo, novamente reforçando que a justificação pela fé é um ato
definido não-contínuo, a justificação não é um processo, mas um ato
único e não repetido.
já não permanecemos
subordinados ao aio. οὐκέτι ὑπὸ παιδαγωγόν ἐσμεν: O verbo "subordinar" não aparece no
grego, mas é inferido da preposição "ὑπὸ". A ARC segue mais de perto
o grego: "já não estamos debaixo de aio." O verbo "εἰμί"
está no presente do indicativo mostrando que em sua atual condição, isto
é, enquanto alguém justificado pela fé, o cristão não está mais debaixo da Lei
como um aio. Isto é, o cristão já não mais está debaixo da Lei como um pacto de
obras, não estando mais sob sua condenação. Chega o momento em que o jovem já
não é mais uma criança e não precisa mais de um tutor. Aqueles que abraçam a fé
em Cristo atingem a maioridade e a liberdade (WH, p. 180). No entanto, o fato
da Lei não ter mais o papel de tutor na vida do cristão não significa que ela
não tenha mais qualquer propósito na vida dele. Quando uma criança é
disciplinada por um tutor, ela cresce até um ponto em que a disciplina passa a
ser interiorizada, de modo que a criança não precisa mais de preceitos
externos. O filho adulto obedece aos preceitos, agora interiorizados no seu
coração, de maneira natural e o faz de maneira melhor do que fazia quando era
criança. Ele não presta mera obediência exterior à Lei, não a obedece por temor da punição, mas por amor e gratidão (TK,
p.91).
26 Pois todos vós sois filhos de Deus mediante a
fé em Cristo Jesus;
Πάντες γὰρ υἱοὶ Θεοῦ ἐστε
διὰ τῆς πίστεως ἐν Χριστῷ Ἰησοῦ·
Não temos mais a Lei por pedagogo, mas
temos Deus por Pai. Além de sermos justificados pela fé em Cristo, somos
adotados como filhos de Deus. Deus trata aqueles a quem justifica como filhos.
O adjetivo "todos" deixa claro que a filiação é um privilégio
recebido por todos os que são justificados pela fé. O verbo "εἰμί" é
utilizado no presente do indicativo mostrando que aqueles que são justificados
pela fé já são filhos de Deus no presente. Não nos tornaremos filhos de Deus no
futuro estado eterno, já somos filhos de Deus atualmente. Assim como a
justificação, a adoção é recebida por meio de uma firme convicção e confiança
gerada pelo próprio Deus em nós: "O mesmo Espírito testifica com o nosso
espírito que somos filhos de Deus." (Romanos 8.16). Já não estamos mais
debaixo de um tutor severo que nos disciplina, mas de um Pai amoroso, nos
tornamos filhos adultos e herdeiros do Pai. Essa filiação é mediante a fé em
Cristo, só os cristãos são filhos de Deus. Deus é Pai apenas de Jesus Cristo e
daqueles nele representados (JS, p.92). Os cristãos não devem primeiro ser judeus,
em virtude da união com Cristo, todos os crentes são verdadeiros cristãos (WH,
p.180). O “nós” de Paulo (v.25) muda para “vós” (v.26) reforçando que ser
cristão nada tem a ver com raça ou religiões anteriores.
27 porque todos quantos fostes batizados em
Cristo de Cristo vos revestistes.
ὅσοι γὰρ εἰς Χριστὸν ἐβαπτίσθητε,
Χριστὸν ἐνεδύσασθε.
Além de justificado e adotado, o cristão
é inserido (batizado) no corpo de Cristo e passa a estar unido a Ele.
porque todos quantos fostes batizados em Cristo ὅσοι γὰρ εἰς Χριστὸν ἐβαπτίσθητε: O verbo "βαπτίζω" é usado no aoristo,
indicando que esse batizo, assim como a justificação é um ato único e não
repetido, e não um processo. A preposição "εἰς" é usada para indicar qual o efeito do batismo, conforme a
NTLH: "batizados para ficarem
unidos com Cristo", a ideia seria de introduzir o discípulo numa comunhão
com Cristo em sua morte, significando que com ele morremos para o pecado (TGL).
A OL, no entanto, prefere a ideia de ser batizado sob a autoridade ("em
nome") de Cristo, mas concorda com o significado de companheirismo na
morte de Cristo: "identificados com a sua morte". É interessante que
Paulo fale de “batismo” (a circuncisão cristã) em um contexto no qual os
judaizantes exigiam a circuncisão. Mas assim como o Antigo Testamento ensinava
que a circuncisão que realmente importa é a circuncisão do coração, o
apóstolo ensina sobre um batismo que é
mais do que um ritual exterior, ele fala daquele batismo pelo qual somos
introduzidos no Corpo de Cristo, a Igreja (1 Coríntios 12.13).
de Cristo vos revestistes. Χριστὸν
ἐνεδύσασθε : O verbo "ἐνδύω" também aparece no
aoristo indicando que esse revestimento de Cristo também foi um ato único e não
repetido e traz a ideia de vestir uma roupa (SC). A referência pode ser a uma
toga que o menino vestia quando entrava na maioridade e que servia de sinal de
que ele se tornou adulto (JS, p.91). A NTLH entende isso por se revestir das
qualidades de Cristo e a OL fala de ficar semelhante a ele. O cristão adulto é
moralmente conformado segundo as qualidades de Cristo, é alguém que
interiorizou o padrão moral correto e o obedece, não como um sistema de
salvação, mas como consequência da operação poderosa da graça de Cristo.
28 Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem
escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo
Jesus.
οὐκ ἔνι Ἰουδαῖος οὐδὲ
Ἕλλην, οὐκ ἔνι δοῦλος οὐδὲ ἐλεύθερος, οὐκ ἔνι ἄρσεν καὶ θῆλυ· πάντες γὰρ ὑμεῖς
εἷς ἐστε ἐν Χριστῷ Ἰησοῦ.
A unidade cristã no corpo de Cristo inclui a todos os cristãos, sem
distinção de classe, sexo ou nacionalidade. Não é só o judeu quem faz parte da
Igreja ou povo de Deus, mas, em Cristo, todos, judeus e gentios, são membros do
Israel espiritual de Deus.
Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem
escravo nem liberto; nem homem nem mulher: οὐκ ἔνι Ἰουδαῖος οὐδὲ Ἕλλην, οὐκ ἔνι δοῦλος οὐδὲ
ἐλεύθερος, : O verbo "ἔνι"
é usado no presente mostrando que Paulo descreve a unidade atual da Igreja de
Cristo, ela é universal. Ele afirma, contra os judaizantes, que nela não há
proeminência de judeus sobre os gentios. Tanto os judeus mantinham um desprezo
pelos gentios, quanto os gentios mantinham similar esnobismo e havia também um
desprezo por escravos e mulheres como inferiores (WH, pp.181-182). É importante
salientar que quando o apóstolo diz que não há diferenças, não é que as
diferenças não existam, mas que não importam no sentido de não criarem
barreiras à comunhão. Homem e mulher continuam tendo sexos diferentes e funções
sociais distintas (JS, p.93).
porque todos vós sois um em Cristo Jesus. οὐκ ἔνι
ἄρσεν καὶ θῆλυ· πάντες γὰρ ὑμεῖς εἷς ἐστε ἐν Χριστῷ Ἰησοῦ. : Com "todos", Paulo inclui toda classe
de pessoas, com "vós" Paulo exclui os não-cristãos. Os cristãos de
todos os tipos constituem uma unidade em Cristo. O adjetivo "εἷς"
traz a ideia de "universalidade" (TGL). A Igreja é católica, composta
por pessoas de todos os tipos unidas em uma só fé. Não há divisões nacionais,
Israel literal não é mais o povo particular de Jeová, os cristãos justificados
são agora o povo especial de Deus: "todos, em Cristo Jesus formam um só
povo." (OL). Isso ocorre porque todos foram unidos a Cristo: "por
estarem unidos com Cristo Jesus" (NTLH).
29 E, se sois de Cristo, também sois
descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa.
εἰ δὲ ὑμεῖς Χριστοῦ, ἄρα
τοῦ Ἀβραὰμ σπέρμα ἐστέ, κατ’ ἐπαγγελίαν κληρονόμοι.
Todos os membros do corpo de Cristo, formado tanto de judeus e gentios,
fazem parte do Israel espiritual, são descentes de Abraão pela fé e herdeiros
da promessa graciosa da Aliança feita com Abraão.
E, se sois de Cristo,: εἰ δὲ ὑμεῖς Χριστοῦ,
: O verbo
"ser" não aparece no texto grego, mas está subtendido, especialmente
por causa do genitivo de "Χριστός". A VFL entende o genitivo como
indicando posse: "E, se vocês pertencem a Cristo". O "se"
(NTLH: "já que") conecta a sentença com a condição do cristão
justificado. Paulo está tratando das implicações daqueles que existem na
condição de justificados, adotados e batizados.
também sois descendentes de Abraão ρα τοῦ Ἀβραὰμ σπέρμα ἐστέ: A conjunção "ἄρα" (SC:
"então") indica que o apóstolo está mostrando a implicação do nosso
pertencimento a Cristo. A implicação é que somos filhos espirituais de Abraão.
Somos o verdadeiro Israel. Assim, unidos a Cristo, nos tornamos o que era Israel
no Antigo Testamento: o povo de Deus. O verbo "εἰμί" é usado no
presente, novamente reafirmando que essa é a condição atual dos cristãos. Os
cristãos são chamados "posteridade de Abraão" por causa da fé que
mantêm em semelhança a ele. Abraão também foi justificado pela fé e nós também
o fomos pela mesma fé no Descendente de Abraão.
e herdeiros segundo a promessa. κατ’ ἐπαγγελίαν κληρονόμοι: A preposição "κατά" traz as noções
de "através de", "devido a", isto é, é por meio da promessa
de Deus que somos tidos por semente de Abraão (SC). "Κληρονόμος", em
contexto messiânico é usado para falar daquele que recebe sua posse por direito
de filiação (TGL). Se fomos adotados por Deus consequentemente nos tornamos
herdeiros de "aquilo que Deus prometeu." (NTLH) ou "das bênçãos
que Deus prometeu" a Abraão (OL). Deus prometeu a Abraão: "em ti
serão benditas todas as famílias da Terra", isso parece se cumprir no fato
de que em Cristo, o descendente de Abraão, pessoas de todos os tipos são
abençoadas com as bênçãos da justificação, da adoção e da união no corpo de
Cristo. Paulo nos localiza historicamente mostrando que a conversão nos insere
na história da redenção e nos dá uma identidade continuada, somos partes de um
mesmo povo, somos unidos aos santos de Deus no passado. Compartilhamos da mesma
Igreja e da mesma história redentiva que os cristãos do Antigo Testamento (JS,
p.94). Não é a circuncisão, ou a guarda dos preceitos da Lei judaica que nos
tornam povo de Deus, mas é a justificão pela fé somente o que nos identifica como filhos de Abraão e
faz de nós o Israel espiritual de Deus. Deus só tem uma nação sobre a terra, ou
seja, a nação dos crentes (1Pedro 2.9 – WH, p.183).
SIGLAS:
ARC: Almeida Revista
e Corrigida.
JC: João Calvino.
Institutas.
JS: John Stott.A
Mensagem de Gálatas.
NTLH: Nova Tradução na Linguagem de
Hoje
NVI: Nova Versão Internacional
OL: o Livro
SBB: Sociedade Bíblica Britânica
SC: Strong'sConcordance
TGL:Thayer'sGreekLexicon
TK: Timothy
Keller. Gálatas para você.
VFL: Portuguese New Testament:
Easy-to-ReadVersion
WH: William Hendriksen – Comentário
do Novo Testamento: Gálatas.
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