LEIA TAMBÉM (CLIQUE NA IMAGEM)

QUEM ESCREVEU OS EVANGELHOS?

 

Como sabemos que os Evangelhos não foram escritos pelos apóstolos? Em nossas Bíblias, assim que abrimos o Novo Testamento, lemos “Evangelho segundo Mateus”, Evangelho segundo Marcos”, “Evangelho segundo Lucas” e Evangelho segundo João”. Podemos, no entanto, confiar nessas autorias? Quando, onde e por quem os Evangelhos foram realmente escritos? Para discutir essas questões, este texto é composto das seguintes partes:

I. ARGUMENTOS A FAVOR DA AUTORIA APOSTÓLICA

II. ARGUMENTOS A FAVOR DA AUTORIA ANÔNIMA

III. AUTORIA DE MATEUS

IV. AUTORIA DE MARCOS

V. AUTORIA DE LUCAS

VI. AUTORIA DE JOÃO

 

I. ARGUMENTOS A FAVOR DA AUTORIA TRADICIONAL

 

Richard Bauckham apresenta os seguintes argumentos a favor da autoria tradicional dos Evangelhos:

 

1. Papias relata ter consultado diretamente discípulos dos apóstolos, referindo-se especificamente a João, o presbítero, identificado com o apóstolo João: Papias, bispo de Hierápolis e figura da terceira geração cristã, teve contato com membros da geração apostólica. Segundo a tradição, ele conheceu pessoalmente as filhas de Filipe, o evangelista, e delas ouviu relatos sobre os apóstolos. Papias afirma que, sempre que alguém que “tinha convivido com os anciãos” o procurava, ele perguntava o que André, Pedro, Filipe, Tomé, Tiago, João, Mateus ou outro discípulo do Senhor “havia dito”. A tradição menciona também o que “Aristião e o presbítero João”, discípulos do Senhor, “estavam dizendo”, indicando que ambos ainda estavam vivos durante a coleta dessas informações. Segundo a tradição, Papias teve contato com o “presbítero João” como uma testemunha ocular ativa no final do século I. Esse “João, o Ancião” é identificado como o mesmo que o Evangelho de João chama de “discípulo amado”, sendo ele o seu autor.

 

2. O Evangelho de Marcos é, segundo antiga tradição, um registro das memórias e pregações do apóstolo Pedro: De acordo com uma tradição transmitida por Papias (preservada por Eusébio), Marcos foi o “intérprete” (hermēneutēs) de Pedro. Marcos teria registrado “com precisão” o que Pedro “recordava de memória” sobre os feitos e palavras de Jesus, embora sem uma organização formal (táxis), já que Pedro não buscava oferecer uma “estrutura ordenada” (súntaxis) dos ensinamentos do Senhor. Essa é a mais antiga e clara tradição a conectar o Evangelho de Marcos à pregação de Pedro. Papias teria recebido de “o Ancião”, uma fonte com autoridade e acesso direto à origem do evangelho.

 

3. Já no início do século II, os títulos dos Evangelhos aparecem de forma uniforme nos manuscritos antigos, revelando uma tradição estável sobre seus autores: A tradição da autoria dos Evangelhos era “tenaz” e eles não circularam originalmente como obras anônimas. Papias, como testemunha do início do século II, é fonte primária da atribuição de autoria a Marcos e Mateus. Essa estabilidade precoce sugere que não houve um período de incerteza ou múltiplas versões concorrentes quanto à autoria, contrariando a hipótese de uma tradição posterior artificial.

 

4. Técnicas literárias presentes nos Evangelhos, como a inclusão de nomes no início e no fim da narrativa, apontam para o testemunho de uma fonte ocular específica: Os evangelhos fazem uso de uma técnica literária denominada “inclusio de testemunho ocular”. Trata-se de mencionar uma testemunha ocular central tanto no início quanto no encerramento da narrativa do ministério de Jesus, sinalizando que o conteúdo se baseia integralmente em seu testemunho. Os evangelhos de Marcos, Lucas e João empregaram esse recurso para evidenciar suas fontes principais. Em João, o “discípulo amado” aparece entre os primeiros seguidores e reaparece de forma proeminente no final, onde o texto afirma: “Este é o discípulo que dá testemunho destas coisas e as escreveu”. Tal construção literária reforça a autenticidade do relato como testemunho direto desde o início da missão de Jesus.

 

5. O anonimato de certas figuras nos Evangelhos visaria protegê-las em tempos de perseguição, e não significaria anonimato dos próprios evangelistas: Alguns personagens específicos nos Evangelhos, como o homem que feriu o servo do sumo sacerdote ou a mulher que ungiu Jesus, são mantidos anônimos como medida de proteção. Essa teoria do “anonimato protetor”, proposta por Theissen, se aplica ao contexto da Igreja em Jerusalém, num cenário politicamente sensível. A omissão deliberada de nomes buscaria evitar represálias contra aqueles que haviam se associado publicamente a Jesus.

 

6. Os Evangelhos foram compostos enquanto ainda havia testemunhas oculares vivas, garantindo a proximidade temporal com os eventos narrados: Os Evangelhos foram escritos “dentro da memória viva” dos eventos descritos. Entre os fatos da vida de Jesus e sua redação evangélica houve “presença e testemunho contínuos das testemunhas oculares”. O Evangelho de Marcos, em particular, teria sido escrito enquanto muitas dessas testemunhas ainda estavam vivas, e os demais evangelhos surgiram quando os últimos testemunhos começavam a desaparecer, sendo, por isso, registrados nesse momento crítico.

 

7. Os evangelhos seguem o modelo de historiografia greco-romana, valorizando o testemunho direto e a memória viva: Os evangelhos devem ser entendidos como uma forma de “historiografia de testemunho”. Com base em Samuel Byrskog, essa prática pode ser comparada à “história oral” moderna, destacando que historiadores greco-romanos buscavam relatos de participantes diretos e testemunhas oculares. Para esses historiadores, o testemunho de quem viveu os eventos tinha primazia sobre fontes secundárias. Os evangelistas teriam adotado abordagem semelhante, recorrendo a testemunhas que haviam “estado com Jesus desde o princípio”, em um esforço coletivo no qual o historiador registra os relatos fornecidos pelos participantes.

 

8. As tradições sobre Jesus não circularam anonimamente por longo tempo, mas estavam associadas a nomes, lugares e testemunhas específicas: As tradições sobre Jesus não passaram por uma longa fase de tradição oral anônima. Em contraste, a maioria dessas tradições estava vinculada a testemunhas oculares identificadas, com menções claras de nomes e lugares.

 

9. Não há evidência de que os evangelhos canônicos tenham sido originalmente atribuídos a outros autores, o que reforça a autenticidade da tradição sobre sua autoria: Os evangelhos não circularam anonimamente nem tiveram sua autoria definida tardiamente. A existência de uma tradição sólida e precoce (iniciando com Papias e se confirmando no Cânone Muratoriano no final do século II) indica que as atribuições a Mateus, Marcos, Lucas e João foram amplamente reconhecidas desde os primeiros tempos.

 

A maioria desses argumentos pede sua força quando comparado com a hipótese da produção comunitária dos Evangelhos. Segundo essa perspectiva, os Evangelhos não foram escritos isoladamente por apóstolos ou testemunhas oculares específicas, mas surgiram como produtos coletivos de comunidades cristãs distintas, cada uma reivindicando sua ligação a uma tradição apostólica reconhecida. Essas comunidades buscavam assegurar a legitimidade e autoridade de seus ensinamentos, associando-os a figuras como Mateus, Pedro (por meio de Marcos), Paulo (por meio de Lucas) e João. Cada comunidade traçava sua origem a um apóstolo e atuava em nome dele. Assim, os textos que produziam eram reinvidicados como da autoridade do apóstolo do qual a comunidade se originava segundo sua tradição.

Essa hipótese justifica a uniformidade da tradição patrística, na qual cada evangelho é atribuído a um autor apostólico, não necessariamente porque este tenha sido o redator direto, mas porque representava a comunidade que detinha aquela tradição viva. Explica também porque desde cedo os Evangelhos já tinham uma autoria apostólica atribuída por tradição.

A objeção aos demais argumentos ficará clara ou poderá ser inferida a partir do restante deste artigo. Vejamos, primeiramente, razões para duvidar da autoria tradicional. Depois disso, consideraremos a problemática de autoria de cada Evangelho.

 

II. ARGUMENTOS CONTRA A AUTORIA TRADICIONAL

 

    Podemos apresentar alguns indícios que sugerem que os Evangelhos não foram escritos diretamente pelos apóstolos. É importante destacar que esses indícios funcionam de maneira abdutiva, ou seja, são evidências que, em conjunto, favorecem a hipótese da autoria anônima e comunitária dos textos. Nenhum deles, isoladamente, deve ser considerado prova definitiva ou conclusiva, mas, tomados em conjunto, oferecem um quadro coerente que questiona a autoria tradicional e apoia a compreensão dos Evangelhos como produtos de comunidades cristãs que reivindicavam uma ligação apostólica:

 

(1) Os textos originais não trazem nomes de autores: Os evangelhos foram originalmente escritos de forma anônima. O título “Segundo Mateus” e outros semelhantes foram acréscimos posteriores, provavelmente do início do século II, e as primeiras cópias completas com esses títulos datam do século IV. A maioria dos estudiosos concorda que os nomes tradicionais foram atribuídos para conferir autoridade aos textos, ao invés de refletir uma autoria literal.

 

(2) Os evangelhos foram compostos em grego literário, por autores letrados: Os evangelhos são escritos em grego koiné, a língua franca do Império Romano, com domínio de vocabulário sofisticado e técnicas literárias. Isso contrasta com a origem humilde e linguística dos apóstolos, que falavam aramaico e tinham pouca ou nenhuma formação em grego escrito, o que torna improvável a autoria direta deles.

 

(3) As narrativas refletem elaboração teológica avançada: O Evangelho de João, em particular, demonstra uma cristologia altamente desenvolvida e uma teologia complexa. A datação mais tardia dos evangelhos (Mateus e Lucas entre 80-90 d.C., João por volta de 90-150 d.C.) indica que houve tempo para a reflexão teológica e o desenvolvimento de lendas em torno de Jesus.

 

(4) A idade dos autores torna a autoria apostólica improvável: Considerando que os apóstolos eram contemporâneos de Jesus, teriam cerca de 80 a 90 anos quando os evangelhos foram escritos. Em um contexto histórico de expectativa de vida baixa (em torno de 30 anos entre as classes mais pobres), isso torna improvável que eles tenham sido os autores originais.

 

(5). Dependência literária entre os evangelhos: Mateus e Lucas mostram forte dependência do Evangelho de Marcos e da Fonte Q, copiando-o praticamente palavra por palavra. Essa dependência literária indica que os evangelistas se basearam mais em documentação existente do que em testemunho ocular. Acrescenta-se também as possíveis Fonte M e L.

 

(6) Os evangelhos foram escritos para resolver questões comunitárias e reforçar doutrinas: Os textos não são relatos neutros, mas visam responder a desafios teológicos e sociais enfrentados pelas comunidades cristãs. Marcos enfatiza o sofrimento messiânico; Mateus reforça a continuidade com a lei judaica; João responde a disputas como seitas da época. Os Evangelhos tinham um caráter mais apologético do que biográfico.

 

(7) Os autores dos evangelhos pensam em grego, não em aramaico: A estrutura e os jogos de palavras nos evangelhos só fazem sentido no grego, sugerindo que seus autores eram falantes nativos ou altamente fluentes nessa língua. Um jogo de palavras interessante se encontra em em João 3:3, onde Jesus diz a Nicodemos: “ἀναγεννηθῇ ἄνωθεν” (anagennēthē anōthen), um trocadilho em grego com duplo sentido (“nascer de novo” e “nascer de cima”)

 

(8) Contradições significativas entre os relatos indicam não se tratar de testemunhas oculares: Os Evangelhos apresentam diversas discrepâncias que corroboram a ideia de uma autoria não-ocular. Por exemplo, há uma divergência quanto à origem da família de Jesus: Mateus afirma que a família de Jesus era habitante da cidade de Belém quando Jesus nasceu (Mateus 2:1), enquanto Lucas destaca que a família de Jesus residia em Nazaré (Lucas 2:4-7, 4:16). Marcos relata que Jesus foi crucificado às nove horas da manhã (Marcos 15:25), enquanto João indica que a condenação aconteceu ao meio-dia (João 19:14). Além disso, o final do Evangelho de Marcos termina abruptamente, no capítulo 16, versículo 8, onde as mulheres que visitam o túmulo vazio fogem assustadas, sem relatos de aparições de Jesus ressuscitado (Marcos 16:1-8). Em contraste, Mateus e Lucas descrevem aparições detalhadas de Jesus em diferentes locais e momentos (Mateus 28:9-10; Lucas 24:13-35). As genealogias de Jesus também apresentam diferenças marcantes (Mateus 1:1-17, Lucas 3:23-38). Em Marcos (10:46-52), é relatada a cura de um único cego chamado Bartimeu, que foi curado enquanto Jesus saía de Jericó. Lucas (18:35-43), por sua vez, também menciona a cura de apenas um cego, porém anônimo, e situa o milagre enquanto Jesus se aproximava da cidade, ou seja, entrando em Jericó. Já Mateus (20:29-34) descreve a cura de dois cegos no momento em que Jesus saía de Jericó. Enquanto Mateus relata que Judas cometeu suicídio por enforcamento (Mateus 27:3-5), o autor do evangelho de Lucas descreve que ele comprou um campo com o dinheiro da traição e morreu violentamente ao cair de cabeça (Atos 1:18-19).

 

(9) Erros historiográficos indicam não se tratar de testemunhas oculares: Por exemplo, em Marcos 7:31, a rota descrita “da região de Tiro para o mar da Galileia pela Decápolis” é geograficamente incoerente, pois Tiro está localizada no litoral do Mediterrâneo, tornando essa passagem um tanto desconexa. Além disso, há confusão sobre a localização de eventos, como em Marcos 5:1, onde a região dos Gerasenos é mencionada, apesar de estar distante do Mar da Galileia; a variação nos manuscritos, que alternam entre Gerasenos, Gadarinos e Gadarenos, revela incerteza sobre o local exato. Os evangelhos também apresentam erros cronológicos, como a confusão entre o censo ordenado por César Augusto e o governador Quirino, pois Lucas 2:1-2 menciona o censo durante o governo de Quirino, que ocorreu por volta de 6 d.C., enquanto a tradição situa o nascimento de Jesus antes dessa data

 

(10) Visto que os evangelhos não-canônicos são reconhecidos como pseudônimos,  os evangelhos canônicos provavelmente também são: Na literatura cristã primitiva, diversos evangelhos que não foram incluídos no cânon oficial, como o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Pedro, o Evangelho de Maria, o Evangelho de Judas e o Evangelho de Filipe, são amplamente reconhecidos pelos estudiosos como obras pseudônimas. Dado que o uso do pseudonimato era uma prática comum no contexto literário e religioso da Antiguidade, especialmente para textos que buscavam autoridade apostólica, e que há textos pseudônimos não-canônicos contemporâneos aos canônicos, como o Evangelho de Tomé, não há razões sólidas para supor que os evangelhos canônicos sejam diferentes.

                                        

            Além das razões gerais para duvidar da autoria tradicional, temos razões específicas em relação a cada Evangelho para isso. Além disso, há, na pesquisa acadêmica, hipóteses específicas sobre a autoria, data e local de escrita de cada Evangelho, o que iremos considerar a seguir. Vejamos, pois, agora, a discussão de autoria específica sobre cada Evangelho.

 

II. A AUTORIA DO EVANGELHO DE MATEUS

 

            A autoria do Evangelho de Mateus é tradicionalmente atribuída ao apóstolo Mateus, um ex-cobrador de impostos e testemunha ocular do ministério de Jesus Cristo. Contudo, essa tese é questionada academicamente.  Como já considerado, a principal fonte histórica para a autoria mateana é o testemunho de Papias, bispo do início do século II, que atribui o evangelho a Mateus, o ex-cobrador de impostos. Entretanto, a confiabilidade de Papias e a interpretação exata do que ele disse são questões ainda em debate na academia.

Primeiro, os escritos de Papias não sobreviveram integralmente, sendo conhecidos apenas por citações posteriores, especialmente de Eusébio de Cesareia, o que levanta dúvidas quanto à fidelidade e ao contexto original de suas afirmações. Segundo, Papias menciona que “Mateus compilou os logia em língua hebraica, e cada um os interpretava como podia”, mas essa frase é ambígua: não está claro se ele se refere ao atual evangelho de Mateus, nem o que exatamente significa “logia”, se seriam ditos isolados de Jesus, uma narrativa completa ou algo intermediário. Hoje, a análise textual já mostrou que o Evangelho de Mateus foi escrito diretamente em grego fluente, não traduzido do hebraico, nem aramaico.

Outro argumento importante refere-se ao uso de fontes por testemunhas oculares. O Evangelho de Mateus claramente depende de material escrito anteriormente, notadamente o Evangelho de Marcos e a Fonte Q, além de possivelmente mais uma fonte chamada M. Isso mostra que o Evangelho tem uma dependência maior de fontes documentais do que do testemunho ocular. Em suma, embora a autoria apostólica tradicional seja sustentada por testemunhos antigos como o de Papias, a análise crítica pondera a autoria anônima e coletiva dos evangelhos, dada a dependência de fontes anteriores e o estilo literário empregado.

Quanto à data de composição, há consenso geral em situar o Evangelho de Mateus após o ano 70 d.C., embora a data exata permaneça incerta. Alguns argumentos principais sustentam essa posição:

(1) Dependência do Evangelho de Marcos, que é geralmente datado no final dos anos 60 ou início dos anos 70, indicando que Mateus foi escrito posteriormente.

(2) A cristologia mais desenvolvida do evangelho, sugerindo uma composição mais tardia.

(3) A presença de uma alusão à destruição de Jerusalém (70 d.C.) na passagem de Mateus 22:7, onde o rei "destrói aqueles assassinos e queima a sua cidade", o que muitos estudiosos interpretam como referência indireta à Guerra Judaica.

(4) O sermão escatológico de Mateus 24, também faz referência à destruição de Jerusalém em 70 d.C.

(5) A presença de termos como "igreja" (ἐκκλησία, em Mt 16:18 e 18:17), quase ausentes nos outros evangelhos sinóticos, sugere uma fase em que a comunidade cristã já estava mais institucionalizada, o que é típico de uma época pós-apostólica.

(6) Mateus parece refletir um contexto de crescente tensão e separação entre judeus cristãos e judeus farisaicos, como visto nos ataques severos aos "escribas e fariseus" (Mt 23). Esse cenário se alinha melhor com a realidade pós-70, quando o farisaísmo se tornou dominante após a queda do Templo.

(7) Em Mateus 17:24-27, a referência ao “didracma” (imposto do Templo) pode ser interpretada à luz do que ocorreu após 70 d.C., quando Vespasiano impôs o fiscus Judaicus (imposto pago ao templo de Júpiter Capitolino). 

(8) O uso da expressão “até o fim dos tempos” (Mt 28:20) parece refletir uma consciência escatológica desenvolvida em meio à espera prolongada pela parusia.

(9) O evangelho parece responder a questões de identidade e organização de uma comunidade já separada do culto do templo e da sinagoga.

(10) A elaboração de regras internas, como aquelas em Mt 18 (sobre disciplina comunitária), indica uma comunidade estruturada, característica de um período mais avançado da vida cristã.

(11) Algumas parábolas em Mateus, como a dos lavradores maus (Mt 21:33-46) e a das bodas (Mt 22:1-14), parecem reinterpretar a história de Israel à luz da rejeição de Jesus e da destruição subsequente de Jerusalém, sugerindo que o evangelista escrevia com esses eventos já consumados.

Diante disso, a maioria dos acadêmicos situa o evangelho entre as décadas de 80 e 90 d.C., associando-o à comunidade mateana que enfrentava conflitos com o judaísmo em processo de formação pós-revolta. Além disso, o modo como Mateus trata a destruição do Templo, não como um trauma imediato, mas como um juízo divino inserido em uma teologia elaborada, indica que ele escreve algum tempo após 70 d.C., quando já era possível interpretar o evento com distância histórica. Isso também sugere que o Evangelho foi escrito em um contexto geográfico mais distanciado dos conflitos da Galileia.

Assim, sobre o local de composição, não há um consenso definitivo. Contudo, uma hipótese sugere que o evangelho poderia ter sido escrito em Antioquia ou em outra cidade distante da zona de conflito da Guerra Judaica, o que explicaria o tom relativamente distante do autor em relação à destruição de Jerusalém.

 

III. A AUTORIA DO EVANGELHO DE MARCOS

 

            A tradição cristã antiga atribui o Evangelho a João Marcos, um judeu de Jerusalém, companheiro de viagem de Paulo e Barnabé, e posteriormente associado a Pedro. No início do século II, como já considerado, Papias relata que Marcos foi o “intérprete de Pedro” e que escreveu o que este pregava sobre Jesus. Essa tradição aparece também em Irineu de Lyon e outros Pais da Igreja, tornando-se a posição dominante na Antiguidade. Contudo, há diversas dificuldades com essa atribuição:

(1) Os títulos “segundo Marcos” aparecem somente em manuscritos posteriores, datados de aproximadamente 375 d.C., e foram provavelmente adicionados para garantir autoridade à obra.

(2) O texto não apresenta nenhuma conexão direta com Pedro. Pelo contrário, o apóstolo é frequentemente retratado de maneira negativa: ele não compreende plenamente Jesus (Mc 8:32-33); é repreendido duramente, chamado de “Satanás” (Mc 8:33); nega Jesus três vezes (Mc 14:66-72). Após o episódio do arrependimento, Pedro desaparece da narrativa, sem destaque ou papel relevante.

(3) O Evangelho de Marcos é redigido em grego literário de alta qualidade, com influência da Septuaginta e da cultura helenística, o que indica que o autor era fluente nesse idioma e familiarizado com a cultura grega. Isso contrasta com a condição esperada de um discípulo judeu da Judeia ou Galileia, como Marcos, onde o aramaico era o idioma dominante e a alfabetização em grego era incomum, especialmente entre não elites.

(4) O texto não apresenta indícios de que seu autor fosse uma testemunha ocular dos eventos ou um discípulo direto de Pedro. Marcos escreve como um autor independente, com foco narrativo próprio, sem referência a experiências pessoais ou lembranças específicas que caracterizariam um seguidor direto de Pedro.

(5) Embora o autor conheça algumas tradições judaicas, ele não demonstra profundo conhecimento das práticas locais judaicas, costumes ou do ambiente palestino típico de Pedro, sugerindo uma distância cultural significativa, por exemplo, ao:

5.1 Explicar costumes judaicos como se fossem desconhecidos: “Pois os fariseus, e todos os judeus, não comem sem lavar cuidadosamente as mãos... e há muitas outras tradições...” (Mc 7:3-4). Isso só faria sentido se o autor e seu público-alvo fossem não judeus ou judeus da diáspora, não familiarizados com tais práticas cotidianas.

5.2 Traduzir expressões aramaicas para o grego, como “Talita cumi” (Mc 5:41) e “Eloí, Eloí, lamá sabactâni?” (Mc 15:34), indicando que o autor, e presumivelmente seus leitores, não dominavam o aramaico, língua predominante entre os judeus palestinos do século I.

5.3 Apresentar uma geografia confusa da região: como em Mc 10:1, ao dizer que Jesus foi “para os territórios da Judeia, além do Jordão”, combinação que sugere um desconhecimento da geopolítica local, já que “além do Jordão” se referia à Pereia, não à Judeia.

5.4 Ignorar ou distorcer aspectos da lei e do julgamento judaico: o julgamento de Jesus (Mc 14:55-64) viola normas básicas da halaká, como a proibição de julgamentos noturnos ou a exigência de dois dias para sentenças capitais, algo improvável se o autor fosse intimamente familiar com o sistema legal palestino da época.

5.5 Reduzir os fariseus e escribas a caricaturas oposicionistas, sem demonstrar conhecimento das distinções internas e complexidades do judaísmo do Segundo Templo. Isso sugere um olhar de fora, mais apologético e ideológico que etnograficamente acurado.

 

É importante, porém, fazer aqui uma observação metodológica essencial. Na pesquisa histórica, os argumentos utilizados são de natureza indiciária e abdutiva, não demonstrativa ou conclusiva nos moldes dedutivos. Isso significa que não se pretende que esses pontos, isoladamente, constituam uma prova definitiva contra a autoria de Marcos, nem que, mesmo em conjunto, ofereçam uma conclusão certa. O que se propõe, antes, é que tais indícios, considerados cumulativamente, tornam mais plausível, dentro de uma inferência abdutiva, a hipótese de que o evangelho tenha sido composto por um autor anônimo helenizado, posteriormente associado a Marcos com base em tradições da igreja primitiva, do que a tese da autoria petro-marcana tradicional.

Quanto à datação de Marcos, a maioria dos estudiosos contemporâneos o situa em torno de 70 d.C., mas há defensores tanto de uma data posterior (pós-70) quanto de uma data anterior (pré-70). A hipótese mais amplamente aceita hoje sustenta que Marcos foi composto logo após a destruição de Jerusalém, por volta de 70–75 d.C.. Os principais argumentos incluem:

(1) O capítulo 13 contém uma descrição vívida da destruição do Templo, das guerras internas e da desolação de Jerusalém. Embora o texto apresente isso como uma profecia de Jesus, o nível de detalhe sugere que o autor já tinha conhecimento dos eventos da Primeira Guerra Judaico-Romana (66–70 d.C.), incluindo: a profanação do santuário, o cerco e a fuga para os montes e sofrimento sem precedentes (Mc 13:14–20).

(2) A parábola da vinha (Marcos 12:1-11) sugere que os líderes judeus mataram os profetas e, por fim, o “filho” (Jesus), e que, como consequência, Deus destruiria os lavradores e entregaria a vinha a outros, uma metáfora do juízo divino sobre Israel e a rejeição do judaísmo institucional, o que ecoa a teologia cristã pós-70.

(3) A discussão sobre o pagamento de impostos em moeda romana seria anacrônica se situada na época de Jesus, quando a tributação na Judeia era predominantemente em espécie. Somente após 71 d.C., com a imposição do fiscus judaicus (tributo especial aos judeus), a cobrança em moeda romana se torna norma. Isso indica que o autor escrevia num contexto posterior.

            Uma posição acadêmica marginal propõe, entretanto, que Marcos tenha sido composto entre 66 e 70 d.C., durante os primeiros anos da guerra judaico-romana. Um argumento central dessa tese é que o autor do Evangelho de Marcos sabia que o Templo estava sob ameaça de destruição, provavelmente por estar escrevendo durante a revolta judaica iniciada em 66 d.C., mas ainda não tinha conhecimento dos detalhes específicos da destruição em 70 d.C.. Isso explicaria por que o texto de Marcos 13 apresenta profecias apocalípticas e de julgamento, mas sem menções precisas à destruição arquitetônica do Templo, à queima do santuário, ao saque de objetos sagrados ou descrições mais detalhadas do cerco de Jerusalém como, por exemplo, as de Lucas.

            Quanto ao local de escrita, o local exato onde o Evangelho de Marcos foi redigido permanece incerto e amplamente debatido entre os estudiosos. A tradição patrística, particularmente Papias e, mais tarde, Irineu, associa Marcos a Roma, onde teria atuado como “intérprete de Pedro” durante os últimos anos da vida do apóstolo. Além disso, o Evangelho de Marcos apresenta alguns termos latinos transliterados para o grego (como denarion, centurion, legion, praetorium, etc.), o que tem sido usado como argumento em favor de uma composição em contexto romano. Do ponto de vista histórico, isso poderia remontar a uma tradição petrina segundo a qual Pedro foi bispo em Roma, algo que a comunidade cristã em Roma talvez reivindicasse.

            Outros estudiosos contemporâneos, no entanto, defendem que o evangelho tenha sido composto na Síria, mais precisamente em Antioquia, uma cidade cosmopolita com significativa população judaico-helênica e cristã emergente. Essa hipótese se baseia em fatores como: a tensão entre judeus e gentios presente no evangelho; a provável presença de uma comunidade cristã que via o judaísmo tradicional como tendo rejeitado Jesus e o uso sofisticado do grego combinado a ecos da tradição apocalíptica judaica.

 

IV. A AUTORIA DO EVANGELHO DE LUCAS

 

            A tradição cristã primitiva identificou o autor do Evangelho de Lucas e Atos dos Apóstolos com Lucas, “o médico amado” mencionado em Colossenses 4:14, Filemom 1:24 e 2 Timóteo 4:11, companheiro de Paulo em algumas de suas viagens missionárias. Segundo essa tradição, Lucas teria sido um gentio convertido ao cristianismo, possuidor de boa formação intelectual e responsável por escrever tanto o terceiro evangelho quanto Atos como uma obra em dois volumes.

            A identificação de Lucas como autor do Evangelho enfrenta, contudo, dois problemas principais. Em primeiro lugar, há diferenças significativas entre a teologia e os eventos apresentados em Atos e as informações disponíveis nas epístolas autênticas de Paulo. Por exemplo, Atos descreve Paulo se encontrando com os apóstolos em Jerusalém logo após sua conversão (At 9; 22), enquanto Gálatas 1:18-24 afirma que tal encontro ocorreu apenas três anos depois. Há também divergências teológicas importantes: Atos apresenta uma imagem de Paulo mais conciliatória e menos polemista do que a que aparece em suas cartas. Em segundo lugar, o nome "Lucas" como autor dos textos lucanos surge apenas por volta de 180 d.C., em fontes como o Cânone Muratoriano e Irineu de Lyon. As primeiras citações do evangelho e de Atos por autores do século II, como Inácio de Antioquia, Justino Mártir e outros, são sempre anônimas

            É bem aceito que o autor do Evangelho de Lucas e de Atos dos Apóstolos é o mesmo. O autor de Lucas-Atos demonstra grande sofisticação no uso do grego, com um vocabulário amplo, estruturas complexas e sensibilidade estilística que o diferenciam de outros evangelistas. Há também o uso de técnicas historiográficas, como prólogos formais (Lc 1:1-4), estrutura narrativa elaborada e retomada de temas e personagens, que sugerem formação literária refinada e possível familiaridade com gêneros históricos da Antiguidade helenística. O autor demonstra conhecimento razoável do mundo greco-romano, da estrutura política do Império e de costumes culturais de diversas regiões, o que sugere formação cosmopolita.

            Uma hipótese bem aceita academicamente é a de que o autor seja um judeu prosélito. Atos dos Apóstolos destaca, em diferentes passagens, a figura dos chamados “tementes a Deus” (grego: οἱ φοβούμενοι τὸν θεόν, hoi phoboumenoi ton theon), isto é, gentios que frequentavam sinagogas, praticavam certos costumes judaicos e demonstravam reverência ao Deus de Israel, mesmo sem uma conversão formal plena (Atos 10:2,22,35; 13:16,26,43,50; 16:14; 17:4,7). O retrato positivo desses personagens e o detalhamento de sua participação nas comunidades judaicas e cristãs primordiais sugerem que o autor tinha uma afinidade teológica e cultural com essa categoria social-religiosa. Além disso, o autor demonstra grande familiaridade com as Escrituras gregas (a Septuaginta) e preocupação com a inclusão dos gentios devotos no plano salvífico.

            Quanto ao local de escrita, é amplamente aceito que o evangelho foi provavelmente escrito fora da Palestina, em uma região do Império Romano de língua grega com forte presença cristã, possivelmente em um ambiente urbano. Entre as propostas, a Síria, especialmente a cidade de Antioquia, é apontada por alguns estudiosos como a hipótese mais convincente.

 

V. A AUTORIA DO EVANGELHO DE JOÃO

 

Desde o século II, fontes patrísticas como Irineu de Lyon afirmam que o evangelho foi escrito por João, o discípulo amado, que teria vivido até idade avançada em Éfeso. Essa ligação apostólica era de “suprema importância” para a autoridade canônica da obra. Contudo, alguns fatores que nos fazem questionar a autoria joanina são:

(1) Barreiras linguísticas e educacionais: João, como pescador galileu, teria sido falante de aramaico e possivelmente analfabeto ou com instrução rudimentar. O grego refinado, a estrutura complexa e o vocabulário teológico sofisticado do Evangelho de João sugerem um autor letrado, fluente em grego e familiarizado com conceitos filosóficos helenísticos e judaicos.

(2) Distanciamento teológico e cronológico: O Evangelho de João difere substancialmente dos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas). Em vez de focar em parábolas e exorcismos, ele apresenta longos discursos teológicos e uma cristologia “alta” desde o início (“O Verbo era Deus”, Jo 1:1). Muitos estudiosos consideram isso um indicativo de uma fase mais desenvolvida da teologia cristã, provavelmente posterior ao ano 90 d.C., já afastada dos eventos históricos originais.

(3) Camadas de redação: O Evangelho carrega marcas de ter sido escrito por mais de um autor. O texto contém glosas explicativas (João 4:1; 6:1; 7:22; 11:2; 17:3 e 18:10), repetições (João 5:19-25/26-30 e João 6:35-50/51-58), fragmentos autônomos (João 3:31-36 e 12:44-50), e aparentes interrupções no fluxo narrativo (João 5:3-4 e João 7:53–8:11), o que sugere acréscimos editoriais em diferentes momentos.

Uma das hipóteses mais respeitadas na pesquisa contemporânea é a de que o Evangelho de João seja produto de uma comunidade joanina — um grupo cristão que preservou e desenvolveu tradições associadas a uma figura fundadora, possivelmente o “discípulo amado”, que pode ou não ter sido João, filho de Zebedeu. Essa comunidade pode ter tido diferentes redatores e editores (J1, J2, J3, J4) ao longo do tempo. As epístolas joaninas (1, 2 e 3 João) também podem ter sido produzidas por essa comunidade. Um possível modelo de composição em camadas do Evangelho de João é o seguinte:

Primeiro Redator (J1): Por volta de 100 d.C., escreveu o "Livro dos Sinais" (João 1:19–14:31) e a narrativa da Paixão e Ressurreição (João 18:1–20:30). Essa camada contém a base narrativa e os principais milagres e acontecimentos da vida de Jesus.

Segundo Redator (J2): Por volta de 110 d.C., acrescentou uma expansão teológica significativa, especialmente o Discurso da Última Ceia (João 15–17), que aprofunda temas como o amor, a união com Cristo e o Espírito Santo.

Terceiro Redator (J3): Por volta de 120 d.C., escreveu o prólogo altamente teológico (João 1:1–18), que apresenta a cristologia do Verbo (Logos) pré-existente e estabelece o fundamento filosófico do evangelho.

Editor Final (J4): Por volta de 150 d.C., adicionou o epílogo (João 21), incluindo detalhes sobre a aparição de Jesus aos discípulos e o encerramento da obra, consolidando o texto para a forma final que conhecemos.

A comunidade joanina se encontrava situada provavelmente na cidade de Éfeso. Os diferentes redatores e editores responsáveis pelo evangelho teriam pertencido a essa comunidade, que se via como guardiã dos ensinamentos do "discípulo amado" de Jesus, tradicionalmente identificado como João, o apóstolo. A comunidade de Éfeso reivindicava uma ligação direta com o apóstolo João, apresentando-o como seu fundador e fonte principal das tradições que transmitiam. Esse vínculo era fundamental para conferir autoridade e legitimidade às suas crenças e escritos. Por isso, o evangelho enfatiza a figura do "discípulo amado", reforçando a ideia de que o texto se baseava em um testemunho apostólico privilegiado.

A tradição de que Papias, bispo do início do século II, teve contato direto com o apóstolo João ou com seus discípulos pode ser explicada pelo fato de que ele teria conhecido a comunidade joanina de Éfeso, que se considerava herdeira dos ensinamentos de João. Assim, mesmo que Papias não tenha tido contato direto com o apóstolo, sua proximidade com a comunidade justificaria a tradição antiga de que ele possuía informações confiáveis sobre João e seus ensinamentos.

 

Podemos concluir, portanto, que os Evangelhos não foram escritos por Mateus, Marcos, Lucas e João, mas são de autoria anônima. A atribuição apostólica faz parte de uma tradição que buscou legitimar a autoridade desses textos e refletia a origem apostólica reivindicada pela comunidade cristã que os produziu. Evidentemente, isso em nada diminui o valor desses textos, seja do ponto de vista literário, teológico ou histórico, já que continuam a ser fontes fundamentais para a compreensão do cristianismo primitivo e da figura de Jesus.


Comentários

FAÇA UMA DOAÇÃO

Se você gostou dos textos, considere fazer uma doação de qualquer valor em agradecimento pelo material do blog. Você pode fazer isso via PIX!

Chave PIX: 34988210137 (celular)

Bruno dos Santos Queiroz

VEJA TAMBÉM

O MITO DA LIBERDADE - SKINNER (RESUMO)

CULTURA E SOCIEDADE - ANTHONY GIDDENS

TEXTOS BÍBLICOS ABSURDOS

20 MITOS DA FILOSOFIA

SER E TEMPO (RESUMO)

SOCIOLOGIA DO CORPO - ANTHONY GIDDENS (RESUMO)

AMOR LÍQUIDO - ZYGMUNT BAUMAN (RESUMO)

TRANSTORNO OBSESSIVO - COMPULSIVO (TOC) - TIPOS, CAUSAS, INTERPRETAÇÕES E TRATAMENTO

O SER E O NADA (RESUMO)

LISTA DOS ARTIGOS DO BLOG (CLIQUE AQUI)