COMO OS HEBREUS SE TORNARAM MONOTEÍSTAS?
O objetivo deste texto é apresentar uma tese sobre como os hebreus se tornaram monoteístas. A fim de cumprir esse propósito, este artigo se constitui das seguintes partes: (i) a tese de Sigmund Freud: nesta parte considera-se a hipótese freudiana de que o monoteísmo foi trazido do Egito por Moisés e porque essa tese já foi refutada; (ii) A origem de Javé: a partir desta parte, usando principalmente Thomas Römer como referência, discute-se qual a terra natal do deus Yahweh; (iii) A adoração de Javé em Israel: nesta parte considera-se como Yahweh se tornou o deus supremo do Reino do Norte; (iv) A adoração de Javé em Judá: nesta parte considera-se como Yahweh se tornou o deus supremo do Reino do Sul; (v) A origem do monoteísmo: nesta parte busca-se responder como os hebreus foram da monolatria para o monoteísmo, passando a considerar Yahweh o único deus existente.
I. A TESE DE SIGMUND FREUD
O pai da psicanálise, Sigmund
Freud, acreditava que o monoteísmo hebreu foi herdado do Egito. Em sua obra
Moisés e o Monoteísmo ele defende que o deus hebreu surgiu com a reforma
religiosa egípcia realizada pelo faraó Aquenáton, por volta do ano 1300 a.C.
Aquenáton teria proposto a ideia de que o deus Aton, o Sol resplandecente,
seria o único Deus:
"Aton vivo, não há outro exceto ele!" Aton, de acordo com essa
teoria era considerado um Deus do Universo inteiro, não sendo um mero deus
regional. Talvez um sacerdote de Aton, quando a reforma monoteísta perdia força
no Egito, escolheu o povo hebreu para conseguir adeptos a fim de dar
continuidade à religião de Aton. Esse sacerdote é denominado por Freud como Moisés
I, que pode ter convencido os hebreus de que Aton os havia escolhido como
povo especial a fim de libertá-los da escravidão no Egito.
Movidos pela fé em um deus-libertador,
os hebreus, segundo Freud, lutaram contra a escravidão egípcia e conseguiram
unidos e liderados por Moisés I, iniciar uma peregrinação rumo à Palestina.
Herdeiro da religião egípcia, Moisés instituiu a prática da circuncisão entre
os hebreus e disseminou a crença de que os hebreus eram um povo desde sempre
eleito. Em algum momento durante a peregrinação rumo à Palestina, Moisés I
morre e é substituído por um Moisés II, que na memória hebraica passa a
ser identificado como o mesmo Moisés. Moisés II provavelmente vinha ou tinha
influência de uma religião que existia em torno do Monte Sinai, uma religião
que adorava um deus-vulcânico: Javé, um deus colérico de fogo e ira. Aton, então, passou a ser substituído por Javé, um deus guerreiro que serviu como
justificava para que os hebreus exterminassem os povos de Canaã por meio da
guerra: "Javé é varão de guerra. Javé é seu nome" (Êxodo 13:5).
Essa versão proposta por Freud,
no entanto, não é mais aceita e não se sustenta do ponto de vista
histórico-arqueológico. Hoje se crê muito mais que o Êxodo dos hebreus é um
mito que não tem evidência arqueológica e que a reforma de Aquenáton era monolátrica e não monoteísta. A história de Moisés se assemelha
muito com outros mitos de fundação de uma dada civilização. Por exemplo, na
Babilônia, há o mito do rei Sargão. Sua mãe que não podia revelar sua
gravidez ou manter o filho, o teria colocado em uma cesta no rio Eufrates, onde
mais tarde foi encontrado por um homem chamado Akki. Já no mito romano, o
fundador da cidade de Roma foi jogado em um rio, arremessado à margem do rio
pela correnteza, encontrado e amamentado por uma loba e, então, criado por um
casal de pastores. Trata-se da narrativa de Rômulo e Remo. De modo
similar, Moisés, para fugir da perseguição de faraó, teria sido colocado em um
cesto à margem de um rio, encontrado e criado pela filha de faraó e amamentado
por uma ama que era sua verdadeira mãe.
O Êxodo de Moisés é, portanto,
um mito fundador assim como o são Rômulo e Remo em relação a Roma. É praticamente
consenso entre acadêmicos que o Êxodo bíblico não ocorreu, trata-se de uma
narrativa desconhecida pela História, cujas fontes podem ser encontradas somente
na Bíblia hebraica. A história de que um exército de 600 mil homens adultos e
um total de cerca de 2 milhões de pessoas se mobilizaram em uma única noite para
deixar o Egito e que cruzaram todos juntos o deserto a pé do Egito a Canaã é
implausível. Ademais parece matematicamente improvável que os hebreus tenham se
multiplicado em quatro gerações como escravos no Egito a ponto de alcançar um
número tão gigantesco. Há também outras inconsistências históricas e geográficas
com a narrativa que não serão tratadas aqui, mas que podem ser lidas no livro Did
Moses Exist?: The Myth of the Israelite Lawgiver de D. M. Murdock,
Acharya S.
II. A ORIGEM DE JAVÉ
Tendo considerado que o Deus judaico não tem ligação com a reforma religiosa de Aquenáton, é preciso discutir qual sua real origem. O nome desse Deus será o nosso fio condutor nessa busca. O
nome Javé também traduzido como Jeová, Iavé, Yahweh, Yahu, Yaohu ou simplesmente
“O SENHOR” aparece quase sete mil vezes na Bíblia hebraica e é tratado
como o nome do único Deus dos hebreus. Traçar as origens de Javé nos ajudará a
saber como os hebreus se tornaram monoteístas. É um consenso estabelecido entre
acadêmicos que a origem do deus Javé não está entre os hebreus, sua origem se
encontra em algum grupo que não era israelita. O nome de Javé ou nomes parecidos
aparecem em textos de diferentes localidades. Thomas Römer no
livro The Invention of God, pontua os seguintes exemplos de regiões em
que há possíveis alusões a Yahweh:
1. Ebla: trata-se de uma antiga cidade localizada no norte da Síria. Nessa
região há textos datados do século XIV e XV a.C. nos quais aparecem nomes
pessoais que terminam em “Yah” que poderia ser a forma abreviada do nome
Yahweh. Essa hipótese, no entanto, não é muito aceita entre eruditos, já que “yah”
poderia ser uma terminação que indicasse diminutivo ou pronome de posse.
2. Ugarite: trata-se de uma antiga cidade localizada na costa
mediterrânea do norte da Síria. Há um fragmento de texto que diz “o nome de meu
filho Yw Deus”, que pode ser interpretado como uma fala do deus cananeu El
dizendo “O nome do meu filho é Javé”. Esse texto lembra o que diz Deuteronômio 32:8-9
conforme uma versão reconstruída a partir do grego e do texto de Qumran: “Quando Elyon (O Mais Alto) deu às nações a sua herança, quando dividiu toda a humanidade,
estabeleceu fronteiras para os povos de acordo com o número dos filhos de El. E
a porção de Javé é seu povo, Jacó é a herança que lhe coube.” Assim, o verso
poderia ser lido como sendo Javé contado entre os números dos filhos do deus cananeu
El. Isso, no entanto, não indica que a origem de Javé é ugarítica, mas sim que
por volta dos séculos XII e XIII a.C., Yahweh era conhecido em Ugarite.
3. Mari: trata-se de uma cidade sobre o rio Eufrates. Nela foram descobertos
documentos com o nome próprio “Yahwi-ilum”, no entanto, estudiosos acreditam se
tratar de uma expressão cuja raiz significa “ele se manifesta a si mesmo”, que
parece não ter relação com o nome Javé.
4. Egito: em papiros egípcios aparece o nome “Yah”, que pode ser a forma abreviada
de Yahweh. Há também um texto que menciona uma lista de localidades, no qual
aparece “Yhw no território de Shasu”. Esse testo é datado do século XIV a.C. e pode ser traduzido como "Território da tribo Shashu de Javé". Shasu pode se referir a uma região no
Neguebe. Há um papiro que usa a expressão “Shasu de Edom”. Assim, Yahweh seria
um deus adorado na região ao sul de Israel, no território de Edom, o que pode
concordar com as descrições bíblicas de que Deus veio de Edom (Temã – Habacuque
3:3). Há outros textos também que dizem que Yahweh teve sua origem no Sul (Deuteronômio
33:2; Juízes 5:4-5). A história de que os hebreus teriam vindo do Sul quando
caminhavam do Egito para o Canaã, pode ter algum fundo de historicidade na possibilidade de
algum grupo de pastores adoradores de Javé terem vindo da região de Edom rumo a
Canaã, trazendo consigo o deus Yahweh. Isso também pode ecoar na história de
que Moisés teria encontrado Yahweh entre os pastores da terra de Midiã (Êxodo 3:1-14)
ou de que o monte de Yahweh é o Sinai, ao sul de Israel (Êxodo 19:20).
É possível
que os hebreus tenham sempre vivido entre os cananeus e adorado os mesmos
deuses que eles por muito tempo. Na região de Canaã havia o deus El
considerado o deus supremo e marido da deusa da fertilidade Asserá. El
era considerado o Criador e pai dos demais deuses. Sua imagem era associada a
figura de um touro, representando virilidade e poder. El e Asserá eram pais de Baal,
que era considerado tanto um deus de guerra como de tempestade tendo seu trono
no monte Zafon (Isaías 14:13). Em muitos textos bíblicos Javé é identificado como El ou seu
plural Elohim, bem como Baal. Isaías 54:5, por exemplo, diz: “Porque o
teu Criador é o teu Baal, Javé dos Exércitos é o seu nome, e o Santo de Israel
é o teu redentor, que é chamado El-o-him de toda terra.”
O que
isso pode indicar? Em primeiro lugar, parece que podemos construir a hipótese
de que Javé era adorado por um grupo de beduínos em Edom e Midiã, sendo pensado
como um deus que habitava uma montanha nesse território. Esse grupo é chamado de
“Shasu”, conforme inscrição egípcia. Esse grupo pode ter caminhado rumo
ao sul de Israel e introduzido Yahweh no território de Benjamin e Efraim, no qual
os hebreus habitavam. Isso pode ter ocorrido em algum momento da Idade de
Ferro (1.200 a.C. - 1.000) Em um primeiro momento, Javé deve ter sido
adorado ao lado das divindades cananeias, como Baal e El. Com o tempo, ele
teria incorporado características desses deuses, passando, ele mesmo a ser
confundido com Baal e El, a ponto do nome desses deuses se tornarem seus
títulos, como aparece na Bíblia Hebraica. A mesclagem entre Javé e os deuses
cananeus é corroborada pela arqueologia. Por exemplo, observe este retrato
datado de por volta 800 a.C.:
A
imagem aparece com a seguinte descrição “Javé e sua esposa Asserá”. Como
dito, a esposa de Asserá era o deus cananeu El, Javé tomou não só o nome do
deus El para si como sua esposa. No retrato Javé aparece duplicado, ele possui
um corpo, incluindo um pênis. Isso está em acordo com as descrições bíblicas de
que Javé tinha um corpo (Êxodo 33:23; Ezequiel 1:27), o que nos mostra que para os hebreus essas descrições
não eram antropomórficas, mas literais. Javé também aparece com características
que lembram um touro, o que nos faz lembrar o modo como o deus Baal era
representado. Isso lançaria também luz ao texto em que se diz que os hebreus
construíram um bezerro ou touro de ouro como uma representação de seu deus que os havia tirado do Egito (Êxodo 32).
À
medida que Yahweh foi incorporando os demais deuses, ele foi ganhado lugar
central no panteão de deuses dos hebreus. É possível que com o tempo se
desenvolveu entre os hebreus uma monolatria, na qual se cria-se ser Yahweh,
não o único deus existente, mas o Deus mais poderoso entre os deuses, um Deus
muito superior às divindades dos demais povos. Logo, a crença era não de que só existia Javé, mas que entre os deuses ninguém se comparava a ele (Êxodo 15:11; Salmos 86:8). Assim, os hebreus antigos podem
ter adotado algum tipo de monolatria ou henoteísmo. A seguir, considerarei um
pouco como Javé foi adorado em Israel e Judá. É importante considerar que pela
maior parte da monarquia, talvez desde 930 a.C., os hebreus encontravam-se
divididos em dois reinos, o Reino do Norte (Israel) e o Reino do Sul (Judá). O Reino do Norte (Israel) caiu em 722 a.C. nas
mãos dos assírios e o Reino do Sul (Judá) caiu e, 586 a.C., sendo boa parte de
seu povo levada cativo para a Babilônia.
III. A ADORAÇÃO DE JAVÉ EM ISRAEL
Thomas Römer no livro já citado, defende a tese de que em Israel,
Javé era adorado na figura de um touro assim como Baal (1 Reis
12:25-29). Por volta do século VIII a.C., Betel teria se tornado o
santuário mais importante de Israel. Também pode ter havido um templo dedicado
a Javé em Samaria (1 Reis 16:32). Javé teria, assim, sido adorado em Israel
na forma de um touro ou um deus de tempestade em santuários em Samaria,
Betel e outras regiões. Javé, no entanto, não era adorado sozinho, mas
juntamente com outras divindades.
Assim
como Baal de Ugarite, Javé era descrito como um deus que usa nuvens como
carruagem (Salmos 104:3) e como um deus de tempestade que doma as águas (Salmo
29:3-9). Em algum momento, entretanto, da história de Israel, houve uma disputa
entre os adoradores de Javé e de Baal, que é retratada no desafio de Elias aos
sacerdotes de Baal (1 Reis 18). Javé teria demonstrado ser mais poderoso do que
qualquer outro Baal. Posteriormente, o rei Jeú (842-814a.C.), um fervoroso adorador de Javé,
teria trabalhado para eliminar a adoração de Baal e entronizar Yahweh como o único
deus a ser adorado. Todo esse processo envolveu muito sangue, com morticínios que
visavam extirpar de Israel a adoração a qualquer divindade que não fosse Javé
(2 Reis 10:18-28). Teria, assim, sido graças a Jeú que Javé se tornou o deus
mais importante de Israel.
IV. A ADORAÇÃO DE JAVÉ EM JUDÁ
Embora no Reino de Israel (Reino do Norte), Javé tenha sido adorado como um touro que lembra Baal, no Reino de Judá (Reino do Sul), parece que Javé era adorado como um Rei assentado em um trono em uma imagem que lembra o deus El. No entanto, Javé com o tempo assumiu o lugar de divindade suprema de Jerusalém e de todo o território de Judá. A princípio Javé teria sido adorado em Jerusalém ao lado de outros deuses. Thomas Römer defende ainda que a princípio se ofereciam crianças em sacrifício a Javé-Melek (Javé-Rei), que requeria para si a vida dos primogênitos (Numéros 3:13). Editores posteriores teriam substituído Melek por Molek mudando uma vogal, criando a ideia de que os sacrifícios infantis eram dirigidos a um deus chamado Moloque (Levítico 18:21), que alguns estudiosos acreditam nunca ter existido. Resquícios da ideia de que Javé aceitava sacrifícios humanos pode ser encontrada em textos como Gênesis 22:1-12 e Juízes 11:30-40. No entanto, a posição de que Moloque era na verdade o próprio Javé e não uma deidade cananeia é apenas uma hipótese.
Como
dito, enquanto no Norte Javé era representado como um touro, no Sul ele era representado
como um rei entronizado. Abaixo há a imagem uma moeda em que Javé é
representado assentado em um trono com rodas. Essa moeda é datada de IV a.C.:
Enquanto
no Norte, Jeú foi fundamental para estabelecer Yahweh como deus supremo, no Sul,
o rei que teve um papel fundamental em tornar Javé o Deus supremo e único a ser
adorado foi Josias (641-609 a..C.) . Ele realizou uma reforma religiosa,
estabelecendo que somente Javé deveria ser cultuado (2 Reis 23). Alguns escritos que encontramos
na Bíblia hebraica, como parte do Pentateuco e de livros históricos podem ter sido
compostas ou editadas em seu tempo. Esses textos podem ter sido,
posteriormente, compilados e reeditados por Baruque, secretário de
Jeremias. A reforma de Josias teria marcado, assim, a consolidação da
monolatria a Javé como único Deus supremo, Rei de um só povo (Judá), tendo um
só Templo (o Templo de Salomão) e uma só capital, Jerusalém.
V. A ORIGEM DO MONOTEÍSMO
É
importante dizer que Javé passou a ser adorado nos reinos de Israel e Judá como
o único Deus digno de culto e não como único Deus existente. Isso significa que
os hebreus eram monolátricos, e não monoteístas. Isto é, provavelmente
eles criam ser Javé o deus supremo e mais poderoso que havia, superando em
muito as divindades de outros povos e que só ele, portanto, merecia culto. Mas
isso não significa que eles acreditassem que os demais deuses fossem apenas ilusões.
É mais provável que as outras divindades fossem apenas vistas como fracas e
insignificantes quando comparadas com a grandeza de Javé. Se isso é assim,
ainda falta responder como os hebreus foram da monolatria para o monoteísmo.
Ainda
seguindo as hipóteses de Thomas Römer, foi só no período do exílio
que os judeus se tornaram monoteístas. Sabe-se que o Reino do Norte (Israel) foi
dominado pelos assírios e, posteriormente, os judeus do Reino do Sul (Judá)
foram levados cativos para a Babilônia. Nesse momento, os judeus tiveram de
lidar com a difícil questão existencial: “se Javé é o deus supremo e
mais poderoso do que qualquer outro, como ele pode não ter sido capaz de vencer
a Babilônia?” É importante dizer que as guerras eram interpretadas como um
conflito entre deuses, e quando uma nação vencia outra, isso significava que os
deuses do povo vencedor se revelavam mais poderosos do que as divindades da nação
derrotada.
Boa
parte da Bíblia hebraica deve ter sido escrita e editada nesse período
de exílio ou no contexto em que a Pérsia já havia tomado o lugar da Babilônia
como nação que dominava os hebreus. Assim, seria nesse tempo que surgiu textos
que buscavam fornecer uma explicação mítica para o fato de os hebreus terem
sido exilados. O que os textos buscaram mostrar é que o exílio não significava
que os deuses babilônicos eram mais poderosos do que Javé, o deus nacional de
Judá. Javé foi descrito por essa literatura como o Deus que reina sobre todas
as nações, sendo o único Deus que controla e dirige todas as coisas. Assim,
mesmo a Babilônia era um instrumento em Suas mãos. A resposta que se deu à pergunta
existencial sobre o exílio era, não de que Javé fora derrotado pelos deuses babilônicos, mas de que ele
estava corrigindo o seu povo por terem adorado falsos deuses.
Provavelmente,
é desse tempo os capítulos 40 a 55 de Isaías. Neles fica claro que Javé
não é somente o único deus que deve ser adorado, nem apenas o deus mais
poderoso entre outros deuses, mas que ele é o único Deus que existe. “Vós
sois as minhas testemunhas, diz Javé, e meu servo, a quem escolhi; para que
o saibais, e me creiais, e entendais que eu sou o mesmo, e que antes de mim
deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá.” (Isaías 43:10). “Existe
outro Deus além de mim? Não, não há nenhuma outra Rocha; não conheço nenhuma.”
(Isaías 44:8)
Essa
crença de Javé como único Deus existente, além de fornecer uma explicação existencial
para o problema do exílio, era importante para garantir a unidade de um povo expatriado
e espalhado. Quando não havia mais templo, terra ou rei os
hebreus encontraram esperança e unidade em torno de uma crença monoteísta. O
monoteísmo, assim, nasceu em uma resposta a uma situação de crise. De
tudo o que foi dito, podemos entender como se deu o processo pelo qual Javé foi
de um deus vulcânico tribal da região de Edom para se tornar o Deus supremo de toda terra.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante
considerar que este texto se trata de uma hipótese, construída a partir
de uma análise histórica que tome os textos e achados do passado de forma
crítica, sem partir de pressupostos religiosos ou ideias como a de que os
textos bíblicos são inspirados. Isso significa olhar para a histórias do deus
dos hebreus como se olha para a história de quaisquer deuses de qualquer povo.
Segundo a hipótese proposta aqui, Javé era um deus vulcânico da região de Edom
trazido para Israel por um grupo de pastores peregrinos. Com o tempo, durante a
história da monarquia hebreia, Javé incorporou outras divindades cananeias,
como El e Baal, tornando-se o deus supremo e único digno de adoração entre os
hebreus. No entanto, foi somente no período do exílio, em uma situação de
crise, que Javé passou a ser entendido como o único Deus existente, o que assegurou
a unidade dos judeus mesmo quando dominados por outros povos. É, assim, portanto,
que nasceu, de acordo com essa tese, o Deus judaico.
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