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JESUS REALMENTE RESSUSCITOU?

 

O objetivo deste texto é pensar se podemos entender a ressurreição de Jesus de Nazaré como fato histórico ou não. É preciso dizer que é consenso acadêmico estabelecido que Jesus de Nazaré existiu de fato e morreu em uma cruz, portanto, afirmar que Jesus é um mito ou negar a realidade de sua crucificação pode ser considerado como uma teoria da conspiração, assim como o é, por exemplo, negar que o homem foi à lua ou dizer que a terra é plana. Este texto se divide nas seguintes partes:

I. ARGUMENTOS DE APOLOGISTAS A FAVOR DA RESSURREIÇÃO

II. FONTES TEXTUAIS HISTÓRICAS

III. O TÚMULO VAZIO

IV. APARIÇÕES DE JESUS

V. UMA QUESTÃO CIENTÍFICA

Jesus de Nazaré, segundo a tese que expus (aqui), foi um profeta apocalíptico que esperava a vinda do Filho do Homem e o estabelecimento do Reino de Deus enquanto ele e seus discípulos ainda estivessem vivos. Jesus sempre pregou em vilarejos pequenos e na área rural, de modo que sua mensagem, embora incomodasse alguns líderes religiosos, não era muito levada a sério por autoridades importantes e influentes. No entanto, quando Jesus decidiu entrar na capital Jerusalém e até mesmo expulsar pessoas do Templo, suas atividades incomodaram pessoas poderosas e isso ocasionou sua morte. O Cristianismo, no entanto, tem afirmado que após três dias morto, Jesus ressuscitou. Será que temos boas bases para crer que Jesus ressuscitou ou há alguma explicação mais plausível a respeito disso?

 

I. ARGUMENTOS DE APOLOGISTAS A FAVOR DA RESSURREIÇÃO

           

      Apologistas cristãos, entre os quais se destaca especialmente o filósofo Willian Lane Craig, têm afirmado que possuímos evidências consistentes do ponto de vista histórico a favor da ressurreição de Jesus, consideremos estes argumentos:

(i) o testemunho ocular de grande número de pessoas: de acordo com o apóstolo Paulo, 500 pessoas testemunharam de maneira ocular que Jesus ressuscitou, seria impossível que 500 pessoas tivessem uma alucinação coletiva e se enganassem a esse respeito (1 Coríntios 15:6);

(ii) a dissimilaridade da crença: A crença de que Jesus ressuscitou era contraproducente, era um tipo de crença que não atraía nem judeus nem pagãos. Assim, se os cristãos precisassem inventar um mito para atrair seguidores e vender uma ideia atrativa, não teriam inventado que Jesus ressuscitou;

(iii) o martírio das testemunhas: seguidores de Jesus se entregaram à morte em nome dele. Não faz sentido pensar que pessoas entregariam sua vida por algo que soubessem conscientemente ser uma mentira.

(iv) o túmulo vazio: o túmulo no qual Jesus foi sepultado foi encontrado vazio e o testemunho disso foi primeiro dado por mulheres, a quem na época não cabia muita credibilidade, de modo que se esse testemunho fosse uma invenção, não se teria criado a ideia de um testemunho feminino. Ademais, o túmulo vazio se encontrava disponível para quem quisesse refutar a mentira da ressurreição.

            A partir do que será discutido adiante ficará claro que nenhum desses argumentos se sustenta e porque é mais plausível acreditar que a crença na ressurreição de Jesus foi resultado de experiência visionárias de seus discípulos. Assim, ao longo do texto, à medida que eu for discutindo este assunto e as bases para a tese visionária, todos os argumentos apologéticos acima colocados serão refutados. Comecemos tratando das fontes textuais históricas a respeito da ressurreição de Jesus.

 

II. FONTES TEXTUAIS HISTÓRICAS

 

            Primeiramente, é preciso dizer que os textos sobre ressurreição de Jesus que temos são parciais, já que foram escritos por cristãos. Devemos, portanto, lê-los tendo em mente que eles são enviesados. Quando consideramos a ressurreição de Jesus, o primeiro passo é investigar o que os textos antigos dizem sobre isso. Para tanto é preciso obedecer a critérios básicos de historiografia, um deles é chamado de critério da múltipla atestação. O critério da múltipla atestação significa que só conta como evidência histórica razoável algo que tenha sido relatado por mais de uma fonte independente. Por exemplo, suponhamos que eu esteja estudando sobre uma guerra na Antiguidade, e então eu encontro um documento escrito por um fã de um guerreiro, dizendo que esse único guerreiro matou sozinho 3 mil soldados de uma vez. Há diferentes fontes da mesma época que relatam fatos sobre essa guerra, mas apenas uma dessas fontes traz essa informação enquanto as outras nada mencionam a respeito. Embora seja possível que esse fato seja verdade, sua aparição em uma única fonte, ainda por cima parcial, torna-o um dado improvável. Por outro lado, se essa informação é relatada por duas fontes, mas uma foi copiada da outra, ainda assim o fato continua improvável. No entanto, se duas ou mais pessoas que não tiveram contato entre si relatam a mesma coisa, então temos algo que torna mais provável o acontecimento. Portanto além de múltiplas fontes, é preciso que essas fontes sejam independentes.

            Com base nesse princípio, já devemos eliminar 1 Coríntios 15:6 como fonte segura. Esse é o único texto que traz a informação de que a ressurreição de Jesus foi testemunhada por 500 pessoas. Como em nenhum outro texto do Novo Testamento ou da época isso é mencionado, temos aqui um dado que não tem credibilidade histórica. Isso não significa necessariamente que seja impossível que isso tenha ocorrido, mas sim que é improvável. É mais razoável supor que Jesus não tinha tantos seguidores naquele momento e que esse número foi inflacionado pelo apóstolo Paulo ou tenha sido um número que foi aumentado à medida que essa história foi contada e recontada pela tradição oral.

            A ressurreição de Jesus, no entanto, é relatada em fontes independentes. É importante pontuar que os Evangelhos são de autoria anônima, que eles foram escritos de 40 a 50 anos depois do evento e por pessoas que não testemunharam de maneira ocular a ressurreição de Jesus, conforme considerei (aqui). Isso significa que as histórias em torno da ressurreição de Jesus foram primeiro transmitidas de maneira oral. Em primeiro lugar, essa transmissão se deu em aramaico, depois alcançou também pessoas de língua grega e foram sendo contadas de pessoa para pessoa. O fato dos discípulos de Jesus levarem sua fé para fora do contexto judaico pode ter sido uma das causas de sua fé ter continuado, enquanto outros movimentos proféticos e messiânicos intrajudaicos não prosperaram.

          Evidentemente, que essa transmissão oral das histórias de Jesus de Nazaré primeiro em aramaico, depois em grego entre os gentios, significa que nesse processo de transmissão essas histórias passaram por acréscimos e distorções. Essas histórias foram, então, considerando apenas os textos canônicos, primeiramente registradas por "Marcos", posteriormente "Mateus" e "Lucas" copiaram parte dessas histórias do livro de Marcos e de outras fontes e, por fim, "João", provavelmente de maneira independente, décadas mais tarde, registrou a própria versão que recebeu, via tradição oral, desses relatos. Os nomes estão entre aspas porque esses não são os verdadeiros nomes dos autores, que diferentes dos discípulos, eram de fala grega e sabiam escrever. É importante ter em mente, por fim, que uma porção canônica, Marcos 16:9-20, é um acréscimo posterior e, portanto, não conta como evidência histórica.

            Os relatos dos Evangelhos a respeito da ressurreição de Jesus, no entanto, possuem divergências. O historiador Jonathan Matthies, neste vídeo (aqui), pontua as seguintes diferenças:

(i) o testemunho das mulheres: Segundo Evangelho de João (20:1), o túmulo foi encontrado vazio por Maria Madelena aparentemente sozinha; já para Mateus (28:1), Maria Madelena estava acompanhada de outra Maria nessa situação; para Marcos (16:1), por sua vez, estavam presentes Maria Madelena, Maria (mãe de Tiago) e Salomé e; para Lucas (24:10), estavam presentes várias outras mulheres.

(ii) sobre a aparição de anjos às mulheres: Segundo João (20:13), dois anjos apareceram para Maria Madelena e simplesmente a perguntaram por que ela chorava, quando então Jesus logo em seguida aparece; segundo Lucas (24:5-7), dois homens de roupas brilhantes apareceram às mulheres e as relembravam de que Jesus profetizou a própria ressurreição e; segundo Marcos (16:5-7) e conforme copiado por Mateus (28:5-7), um jovem angelical de vestes brancas é encontrado sentado e ordena às mulheres que vão e contem aos discípulos sobre a ressurreição.

(iii) sobre a obediência das mulheres à ordem dos anjos: de acordo com Mateus 28:8, as mulheres prontamente obedeceram ao anjo e correram rapidamente para contar aos discípulos sobre a ressurreição; já, de acordo com Marcos 16:8, as mulheres não obedeceram ao anjo, saíram de lá assustadas e não disseram nada a ninguém, pois estavam com medo.

(iv) sobre as aparições de Jesus: de acordo com Mateus (28:10), os discípulos foram informados de que deveriam ir para a Galileia, onde Jesus lhes iria aparecer, já para Lucas (24:49-50), as aparições de Jesus aos discípulos se deram na Judeia, acompanhadas da ordem de que eles deviam permanecer em Jerusalém e não sair de lá até o Pentecostes.

            É importante considerar que nem todas essas divergências são contradições, algumas delas podem ser conciliadas de alguma maneira, enquanto outras, como a obediência imediata/desobediência dos anjos pelas mulheres são contradições irreconciliáveis. De todo modo, elas refletem diferentes versões de como se deu o testemunho da ressurreição de Jesus. O que devemos perguntar, é o que essas diferentes fontes concordam, isto é, o que podemos dizer que os relatos têm em comum. Fazendo isso, recorremos ao princípio da múltipla atestação, e podemos ter mais clareza do que realmente aconteceu. Parece que todos os relatos nos permitem afirmar duas coisas. Primeiro, que pelo menos uma mulher encontrou o túmulo vazio e, segundo, que houve aparições de Jesus aos discípulos. Consideremos cada um desses pontos.

 

III. O TÚMULO VAZIO

 

            Pelo menos Maria Madalena encontrou o túmulo vazio e logo em seguida, pela aparição de pelo menos um anjo, tomou isso como sinal de que Jesus foi ressuscitado. É importante dizer, no entanto, que nenhum discípulo depois usou o argumento do túmulo vazio para provar a ressurreição de Jesus. Eles não saiam dizendo “olha só, bastam ir onde ele estava sepultado e vocês verão que o corpo dele não está lá mais”, muito menos houve um processo de tentarem verificar se alguma outra coisa poderia ter ocorrido com o corpo. O argumento usado pelos discípulos a princípio sobre a ressurreição era, na verdade, o seguinte “Jesus apareceu para mim” (1 Coríntios 15:8). A ideia de que o túmulo vazio conta como evidência da ressurreição de Jesus é algo usado hoje por apologistas contemporâneos, mas não algo que os discípulos tenham tomado como argumento.

            Há diferentes explicações para as mulheres encontrarem o túmulo vazio. O historiador Jonathan Matthies, no vídeo já citado, elenca a possibilidade de as mulheres simplesmente terem errado de túmulo. Como elas estavam no escuro, tristes e desorientadas, poderiam não estar completamente certas sobre qual túmulo Jesus foi sepultado. Elas poderiam até mesmo não saber ao certo qual túmulo era. Outra possibilidade, é de que Jesus nem sequer tenha sido sepultado. Era comum que crucificados não tivessem direito ao sepultamento, sendo lançados em uma vala comum e a história de que José de Arimateia havia providenciado o sepultamento de Jesus, pode ser uma invenção posterior. Por fim, outra possibilidade, é de que o corpo de Jesus poderia ter simplesmente sido transferido para outro local e isso não foi verificado depois nem pelas mulheres, nem pelos discípulos.

 

IV. APARIÇÕES DE JESUS

 

            Ao lermos os testemunhos sobre as aparições de Jesus, é importante observar a natureza delas. Lucas diz que pessoas conversaram por horas caminhando com Jesus ressuscitado sem ter percebido que era ele (Lucas 24:16). É dito que Jesus meio que se teletransportava, desaparecia num lugar e aparecia em outro (Lucas 24:31,36). Lucas diz que Jesus apareceu em carne (Lucas 24:39). Já João diz que mesmo os discípulos vendo Jesus na frente deles não sabiam reconhecer que era ele a não ser se ele fizesse um ato especial (João 20:14; 21:4) e ele ainda sugere até que Jesus atravessava paredes (João 20:19).

            É interessante considerar ainda que outros textos do Novo Testamento dão a entender que Jesus não ressuscitou em um corpo de carne e osso, contradizendo a versão de Lucas. O apóstolo Paulo, por exemplo, escreveu: “Semeado corpo físico, é levantado corpo espiritual. Se há corpo físico há também um espiritual. Assim está escrito: ‘o primeiro homem, Adão, se tornou um ser vivente. O último Adão se tornou um espírito que dá vida... Mas eu lhes digo o seguinte, irmãos: carne e sangue não podem herdar o Reino de Deus, nem pode o que é perecível herdar o imperecível” (1 Coríntios 15:44-50). Para Paulo, portanto, o corpo de Jesus não era físico, não tinha carne, nem sangue, de modo que se poderia chamar Jesus ressuscitado de um espírito que dá vida. Pedro, por sua vez, segue na mesma linha: “Ele foi morto na carne, mas revivido no espírito” (1 Pedro 3:18). Ou seja, Jesus morreu em um corpo de carne e osso, mas quando reviveu, ele ressuscitou como um espírito.

Os testemunhos da ressurreição são pois:

1. Contraditórios: além das divergências já consideradas entre os evangelhos, para Lucas Jesus ressuscitou em carne, para Paulo e Pedro ele ressuscitou em espírito.

2. Ambíguos: mesmo vendo Jesus na frente deles, as pessoas não sabiam reconhecer que era ele, pensavam que era outra pessoa.

3. Estranhos: esses testemunhos sugerem que Jesus aparecia se teletransportando e atravessando paredes.

            É importante considerar que aparições não são provas de ressurreição. Ver um ser com corpo espiritual que se teletransporta e atravessa paredes está muito mais próximo de uma experiência visionária do que de uma ressurreição física literal. Tudo isso pode ser explicado dizendo que os discípulos em diferentes momentos e numa condição psicológica abalada, tiveram experiências visionárias com Jesus. Elas podem ter acontecido de maneira individual ou coletivas e em ocasiões diversas para cada um, mas fortalecendo cada vez mais a crença de que Jesus estava de volta. À medida que essas experiências visionárias eram relatadas e compartilhadas em um mundo marcado pelo misticismo, mais pessoas vivenciavam essas visões. O apóstolo Paulo, por exemplo, teve, segundo Atos 9:3-8, uma experiência visionária, mesmo assim ele inclui isso como prova da ressurreição de Jesus no mesmo nível da aparição de Jesus aos demais discípulos (1 Coríntios 15:4-8).

            É importante lembrar que no Catolicismo Romano é muito comum ouvirmos falar de diversas aparições de Virgem Maria em diferentes lugares, para diferentes pessoas e em diferentes épocas, de modo que entre os romanistas se diz até que Maria pode ter ressuscitado e sido levada ao céu assim como Jesus. Há inclusive aparições coletivas de Maria. Diz-se, por exemplo, que em uma dessas aparições, chamada Milagre do Sol, 70 mil pessoas viram Nossa Senhora fazer o Sol dançar. O milagre é relatado pelo Padre Paulo Ricardo (aqui). Como se pode ver, experiências visionárias podem se dar até mesmo de forma coletiva. Podemos ter a impressão errada, se acreditarmos em Paulo acriticamente, que a ressurreição de Jesus foi testemunhada por 500 pessoas, mas é bem mais provável que a comunidade de discípulos de Jesus fosse nessa época muito pequena e que mesmo que tenha havido experiências visionárias coletivas, isso envolveria um número bastante minúsculo de pessoas.

            É importante pontuar que experiências visionárias não são “invenções”. Isso significa que os discípulos não estavam tentando “vender” uma história ou criar uma “fantasia” para atrair pessoas. Isso quer dizer que os seguidores de Jesus quando tinham essas experiências visionárias realmente criam que elas eram reais. Assim como um católico crê que a Virgem Maria realmente estava presente em uma aparição, aqueles primeiros cristãos tinham fé profunda que estavam vendo o próprio Cristo ressuscitado. Isso também nos ajuda a entender os martírios. É importante dizer que os discípulos não se entregaram à morte por crerem na ressurreição. Quando levados à morte o que se perguntava não era “Você tem certeza absoluta que Jesus ressuscitou?” Mas sim se eles confessavam Cristo como Senhor. Essa fé no senhorio de Cristo poderia levar muitos ao martírio até mesmo sem o fator de certeza absoluta na ressurreição. No entanto, ainda que concedamos que a fé na ressurreição foi uma motivação fundamental para o martírio, é importante dizer que essa motivação era sincera. Não se tratava de nenhuma fraude, de nenhuma invenção ou mera imaginação, mas de aparições visionárias que para os discípulos eram tomadas como absolutamente certas e reais.

 

V. UMA QUESTÃO CIENTÍFICA

 

            É importante considerar que do ponto de vista histórico, sempre se deve preferir narrativas que estejam de acordo com as leis naturais. Mesmo que milagres sejam/fossem logicamente possíveis (o que é uma discussão filosófica se são ou não), do ponto de vista metodológico, como observa Bart Ehrman no livro Quem Jesus Foi? Quem Jesus não foi?, um historiador precisa adotar uma espécie de naturalismo metodológico. Isso se dá, em primeiro lugar, porque admitir a existência de milagres contamina a pesquisa histórica, visto que sempre se poderá recorrer a uma explicação sobrenaturalista para eventos históricos de difícil explicação ou poder-se-á usar ideias miraculosas para preencher lacunas de fatos desconhecidos. Além disso, a historiografia é uma disciplina que trabalha com probabilidades. Como o historiador não pode replicar em laboratório o que ocorreu no passado, ele trabalha com probabilidades, isto é, ele precisa dar uma explicação que diga o que mais provavelmente aconteceu. Como milagres são, por definição, eventos improváveis, eles não devem ser admitidos pelo historiador.

            Quanto a essa questão de improbabilidade é preciso dizer algo. É claro que eventos históricos improváveis acontecem. Reviravoltas históricas e fenômenos inesperados podem ter lugar no curso da História. Mas todos esses eventos são prováveis no sentido do que conhecemos sobre como o mundo funciona. Por exemplo, se me perguntassem quando eu era um cristão conservador qual era a probabilidade de eu ser quem sou hoje, um gay assumido flertando com o ateísmo, eu diria que isso era extremamente improvável. Mas um gay se assumir ou um cristão se tornar ateu é algo que, sob a luz do que conhecemos sobre como o mundo funciona, é algo natural de acontecer. Por outro lado, se me dissessem que eu iria ter o poder de transformar água em vinho, isso seria improvável num sentido muito mais substancial. Quando falamos de alguém a três dias morto voltar a viver, isso não é só improvável no primeiro sentido, mas sim no segundo sentido, pois contradiz o que sabemos de leis naturais e de biologia.

    Como diz David Hume, nunca a evidência a favor de um milagre será mais forte do que toda a evidência acumulada que temos a respeito da uniformidade das leis naturais. Isso não quer dizer que milagres não possam ocorrer, mas sim que eles são tão, mas tão improváveis, que não contam como hipótese válida no campo da historiografia. Qualquer pessoa tem o direito de crer em milagres, incluindo a ressurreição de Cristo, mas quando essa pessoa está fazendo ciência, ela precisa deixar esse pressuposto de lado. Além do mais, é importante considerar que do ponto de vista dos estudos em Psicologia, é muito comum que pessoas experimentem aparições de pessoas amadas que acabaram de morrer. Também, sabe-se que fenômenos coletivos podem levar uma pessoa a assumir crenças que contrariem sua própria percepção. Portanto, se somarmos tudo o que foi dito aqui a respeito das evidências textuais, das divergências entre os relatos, da imparcialidade das fontes, da estranheza dos testemunhos, da uniformidade das leis naturais, da improbabilidade da ocorrência de milagres, e da capacidade explicativa da tese de aparições visionárias, podemos dizer que a tese de que Jesus Cristo literalmente ressuscitou é muito implausível.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

É importante dizer que nenhuma pesquisa histórica pode determinar com certeza absoluta que a ressurreição não ocorreu, sempre havendo espaço para fé. No entanto, do ponto de vista racional e de evidências, sustentar a ressurreição de Jesus como fato histórico vai se tornando cada vez mais um exercício ad hoc. Entre a tese extremamente improvável de que Jesus literalmente ressuscitou e a tese mais plausível de que a crença em sua ressurreição foi resultado de aparições visionárias, faz mais sentido ao ser humano racional, assumir a segunda. Isso não elimina o direito de uma pessoa religiosa de crer em milagres ou na ressurreição de Jesus, apenas torna essa crença muito improvável.


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