NO QUE EU ACREDITO?
Eu não possuo um conjunto de crenças fechadas, no entanto, existem certas proposições em filosofia pelas quais tenho mais simpatia. É evidente que minha simpatia por essas crenças pode mudar e meu grau de convicção delas também varia, mas elas servem como um norte de quais teses eu tenho mais inclinação no momento. Assim, se eu pudesse escrever meu credo pessoal das crenças com as quais simpatizo ou tenho inclinação hoje, mas sem me comprometer de maneira forte, elas seriam:
Creio:
(1) Que há um Deus
único, simples, impassível, imutável, eterno, ontologicamente perfeito
(omnibenevolente), pura potencialidade ativa (onipotente) e em cuja essência
está eminentemente contido o princípio de conhecimento de todas as coisas
(onisciente).
(2) Que Deus não
exige de nós práticas religiosas, mas que elas podem ser realizadas como uma
forma de teurgia, visando o desenvolvimento da alma e que a realidade divina e
sagrada pode ser vivenciada de modo válido nas mais diversas formas religiosas
e mesmo sem elas.
(3) Que Deus possui
de modo todo-simultâneo todos os momentos da série do tempo (que é do tipo B),
que o tempo vivido como uma sucessão é uma experiência da alma e que um objeto
temporal completo é o conjunto de todas as suas partes temporais que perduram
no tempo.
(4) Que Jesus foi um
grande mestre moral, mas não era Deus encarnado, nem nasceu de uma virgem, nem
ressuscitou dos mortos, mas foi um pobre camponês que foi morto por lutar contra
as injustiças de seu tempo.
(5) Que a
consciência, em seu sentido mais fundamental, é essencialmente caracterizada
pela autotestemunhalidade intransitiva e não-intencional, não devendo ser
confundida com a mente e seus processos.
(6) Que a consciência
não é idêntica a nem emerge daquilo que é físico, sendo irredutível a qualquer
substrato sem consciência.
(7) Que os princípios
de identidade (lei de Leibniz e princípio da identidade dos indiscerníveis) bem
como o princípio da não-contradição são princípios tanto metafísicos quanto
epistemológicos corretos e que devem guiar nossa compreensão do mundo.
(8 )
Que a identidade na diferença pode ser adequadamente explicada com base no fato
de que todos os particulares de um mesmo tipo participam e são causados por
formas inteligíveis que subsumem as perfeições ontológicas de todos os
particulares e que não devem ser confundidas com propriedades universais ou
objetos abstratos.
(9) Que o
livre-arbítrio é real e compatível com o determinismo de modo que, ainda que
nossas escolhas sejam exaustivamente determinadas por certos fatores, somos
realmente, e não meramente fenomenologicamente, livres e originadores de nossas
escolhas.
(10)
Que nosso eu ou self não é redutível, nem aos nossos estados mentais, nem aos
nossos estados físicos, mas é como a "testemunha de fundo" de toda
nossa vida.
(11)
Que há duas fontes primárias de conhecimento sobre a realidade: (i) os dados
dos sentidos; (ii) as verdades alcançadas por meio de intuições intelectuais
puras que são, porém, despertadas em nós pelos sentidos e que não devem ser
confundidas com meros seemings.
(12)
Que a verdade é objetiva e universal, não dependendo da opinião particular de
indivíduos ou sujeitos.
(13)
Que devemos valorizar o conhecimento científico e filosófico, promovendo boas
virtudes teóricas e evitando viéses cognitivos.
(14)
Que a ética é objetiva, independente das opiniões particulares de indivíduos e
culturas.
(15)
Que o bem humano consiste na vida de florescimento e virtude, por meio da qual
o ser humano realiza a sua natureza racional.
(16)
Que juízos morais possuem um duplo aspecto: (i) aspecto cognitivo: expressam
uma crença que pode ser verdadeira ou falsa; (ii) aspecto expressivo: expressam
emoções e prescrições que podem ser corretas ou incorretas; podendo ambos os
aspectos serem julgados por padrões objetivos.
(17)
Que propriedades morais são normativamente irredutíveis e, portanto,
não-naturais, sem com isso terem implicações ontológicas realistas.
(18)
Que a melhor maneira de conhecer verdades morais é pelo bom uso de nossa razão
natural e pelo refinamento de nossas intuições morais.
(19)
Que o ditame da razão é suficiente para nos fornecer razões externalistas e
objetivas para agirmos moralmente, embora somente o reconhecimento cognitivo ou
emocional dessas razões possa nos motivar moralmente.
(20)
Que a prática da homossexualidade não contradiz, em si, a Lei Natural nem os
valores da ética objetiva, mas é uma expressão natural da diversidade da
sexualidade humana.
(21)
Que embora qualquer prática sexual com livre consentimento adulto dos
envolvidos e sem dano grave à integridade física seja moralmente permissível, a
forma mais profunda de realização do sexo é no contexto do amor, que consiste
na união interpessoal e intencional entre os que se amam, sendo o sexo, o selo
dessa união.
(22)
Que o fim da ética não é produzir o máximo de bem-estar possível no mundo, nem
o de reduzir ao máximo o sofrimento senciente, nem de seguir regras
deontológicas sem exceção, mas sim o cultivo de disposições virtuosas que
orientam um agir equilibrado e deixa espaço para atos de superrogação.
(23)
Que uma das formas de expressar compaixão pelos que sofrem é por meio de
doações voluntárias a instituições filantrópicas confiáveis e a busca em
reduzir o consumo de carne (flexiterianismo/demi-vegetarianismo), sem, no
entanto, haver uma exigência ética absoluta nesses casos.
(24)
Que o aborto, quando praticado antes de o feto se tornar um ser sensiciente,
não é imoral.
(25)
Que a melhor forma de organização social viável é a democracia constitucional
deliberativa e secular (laica), com proteção às liberdades fundamentais e aos
direitos humanos.
(26)
Que o Estado tem o papel de garantir a segurança e promover o bem-estar social
por meio de políticas públicas baseadas em evidências, proteção aos direitos
trabalhistas e prestação de serviços públicos ao mesmo tempo que protege o
livre-mercado regulado.
(27)
Que toda a forma de opressão social e preconceito deve ser combatida, incluindo
a LGBTfobia, misoginia, racismo, gordofobia, psicofobia etc. sem, no entanto,
cair em um discurso identitarista radical, excludente ou que alimente o
cancelamento e intolerância.
(28)
Que homens trans são realmente homens e que mulheres trans são realmente
mulheres, visto que o gênero não é definido pelo sexo biológico, mas sim por um
conjunto de disposições psicológicas razoavelmente fixas e objetivas.
(29)
Que a beleza é um transcendental universal parcialmente subjetivo-objetivo, mas
que a arte é livre, não tendo necessariamente como função ser bela.
(30)
Que o sentido da vida é imanente a ela mesma e consiste em viver de modo
significativo.
***
Essas são crenças que apenas "simpatizo", não que eu adoto de modo
rígido e fechado.
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