RESPOSTA AOS ARGUMENTOS DE WILLIAM LANE CRAIG A FAVOR DA RESSURREIÇÃO DE JESUS
O objetivo do texto abaixo é apresentar uma resposta aos argumentos do filósofo William Lane Craig a favor da ressurreição histórica de Jesus. Para tanto, o texto discorre sobre os seguintes pontos: (i) uma taxonomia das posições sobre a ressurreição, onde apresento todas as teorias (ortodoxas e céticas) sobre a ressurreição; (ii) fatos mínimos que demandam explicação: onde apresento a abordagem dos fatos mínimos de Habermas e Lycon, o modelo RHBS de James Fodor e o consenso acadêmico atual; (iii) a Teoria das Aparições Visionárias, que é a abordagem que eu adoto, inspirado em Dominic Crossan, para explicar como os discípulos passaram a crer na ressurreição de Jesus e; (iv) uma resposta a cada um dos argumentos usados por William Lane Craig para sustentar a crença na ressurreição histórica de Jesus. Cabe ressaltar que esse texto não pretende desrespeitar ou questionar a fé de nenhum cristão, mas apenas trazer argumentos e objeções que contribuam para o debate sobre a ressurreição de Jesus de Nazaré.
I. TAXONOMIA DAS POSIÇÕES SOBRE A RESSURREIÇÃO
Para iniciar este texto, apresento uma taxonomia das teorias sobre a ressurreição de Jesus. Essa taxonomia inclui tanto teorias cristãs da ressurreição como teorias não cristãs.
(1) Teorias cristãs: teorias que aceitam a ressurreição de Jesus, literal ou simbólica, dentro do contexto da fé cristã.
1.1 Teoria ortodoxa: Jesus ressuscitou exatamente com o mesmo corpo de carne e sangue que morreu, mas glorificado e imortal.
1.2 Teoria espiritualista: Jesus ressuscitou em espírito ou em um corpo espiritual, que não era de carne e sangue.
1.3 Teoria simbólica: A ressurreição de Jesus não foi um evento histórico literal, ao invés disso Jesus ressuscitou no coração dos discípulos.
(2) Teorias céticas: teorias que negam a ressurreição histórica de Jesus fora do contexto da fé cristã.
2.1 Teoria das Alucinações: a crença na ressurreição de Jesus foi resultado de alucinações individuais e coletivas experimentadas pelos discípulos.
2.2 Teoria das aparições visionárias: A crença na ressurreição de Jesus foi baseada em aparições visionárias experimentadas pelos discípulos individual ou coletivamente.
-> 2.2.1 Teoria naturalista das aparições visionárias: A crença na ressurreição de Jesus foi baseada em aparições visionárias experimentadas pelos discípulos individual ou coletivamente e essas aparições tiveram uma causa natural.
-> 2.2.2 Teoria sobrenaturalista das aparições visionárias: A crença na ressurreição de Jesus foi baseada em aparições visionárias de Jesus experimentadas pelos discípulos individual ou coletivamente e essas aparições tiveram uma causa sobrenatural.
2.3 Teoria do duplo Cristo: Jesus de Nazaré morreu na cruz, mas após sua morte, seus discípulos foram visitados por uma entidade espiritual sobrenatural elevada (Cristo), que foi equivocadamente interpretada pelos discípulos como uma ressurreição de Jesus de Nazaré.
2.4 Teoria da morte aparente: afirma que Jesus de Nazaré não morreu de fato na cruz, apenas pareceu que foi assim.
-> 2.4.1 Teoria islâmica da morte aparente: afirma que Jesus não foi pregado na cruz, mas sim que Deus fez parecer que foi ele.
-> 2.4.2 Teoria secular da morte aparente: afirma que Jesus apenas desmaiou na cruz e depois recuperou-se.
-> 2.4.3 Teoria do irmão gêmeo: afirma que quem morreu na cruz foi na verdade um irmão gêmeo de Jesus.
2.5 Teoria miticista: afirma que a ressurreição de Jesus é completamente um mito criado sem qualquer base em um personagem realmente histórico.
2.6 Teoria da fraude: afirma que os discípulos intencionalmente inventaram a ressurreição e espalharam essa crença mesmo sabendo que era mentira.
Ao discutir se a ressurreição de Jesus foi histórica, fazemos uma espécie de inferência pela melhor explicação. A maioria das teorias acima pode ser descartada por pressupor muita coisa que não pode ser provada, como a existência de um irmão gêmeo de Jesus ou de um segundo Cristo celestial. Outras teorias podem ser descartadas por pressuporem coisas muito improváveis, como a de que a morte de Jesus foi meramente aparente, quando, na verdade, que Jesus morreu na cruz é o evento mais bem atestado da sua vida, ou de que os discípulos estavam mentindo, quando na realidade eles eram, ao que tudo indica, sinceros em sua fé. Proponho levar a sério apenas três hipóteses:
(1) A Teoria de que Jesus realmente ressuscitou.
(2) A Teoria de que a crença na ressurreição de Jesus foi resultado de alucinações.
(3) A Teoria de que a ressurreição de Jesus foi resultado de aparições visionárias.
Para avaliar qual dessas três teorias melhor explica os fatos, primeiro precisamos saber quais são os fatos que demandam explicação. A seguir apresento os fatos mínimos que são concesso entre pesquisadores acadêmicos sobre a ressurreição de Jesus.
II. FATOS MÍNIMOS QUE DEMANDAM EXPLICAÇÃO
William Lane Craig, seguindo a abordagem dos fatos mínimos de Habermas e Lycona, apresenta seis fatos que, segundo ele, são consenso entre acadêmicos sobre a ressurreição de Jesus:
(1) Jesus morreu por crucificação
(2) Jesus foi sepultado
(3) O túmulo de Jesus foi encontrado vazio
(4) Os discípulos de Jesus começaram a ter visões de um Jesus ressuscitado
(5) Pessoas que não acreditavam em Jesus começaram a ter visões semelhantes
(6) A ressurreição foi pregada muito cedo
William Lane Craig considera que a ressurreição histórica de Jesus é a melhor explicação para esses seis fatos. Ele apresenta os seguintes argumentos:
(1) Argumento do Testemunho Ocular: A ressurreição de Jesus teria sido testemunhada ocularmente por muitas pessoas, incluindo uma aparição a mais de quinhentas pessoas ao mesmo tempo, o que tornaria implausível a hipótese de engano ou alucinação coletiva (1 Coríntios 15:6).
(2) Argumento da Dissimilaridade da Crença: A crença na ressurreição de Jesus não corresponderia nem às expectativas judaicas nem às pagãs, sendo, portanto, improvável que tenha sido inventada como um mito atraente para angariar seguidores.
(3) Argumento do Martírio das Testemunhas: Os discípulos estavam dispostos a sofrer perseguição e até a morte por proclamarem a ressurreição, o que indicaria que não estavam conscientemente defendendo uma mentira.
(4) Argumento do Túmulo Vazio: O túmulo no qual Jesus teria sido sepultado foi encontrado vazio pouco tempo após sua morte, fato que Craig considera amplamente aceito entre estudiosos e que exigiria uma explicação.
(5) Argumento do Testemunho Feminino: Os Evangelhos afirmam que mulheres foram as primeiras testemunhas do túmulo vazio, algo improvável de ser inventado, já que o testemunho feminino tinha pouco valor jurídico e social na época.
(6) Argumento da Publicidade: O túmulo vazio seria um fato público e verificável em Jerusalém; se fosse falso, poderia ter sido facilmente refutado pelos opositores do cristianismo primitivo.
(7) Argumento da Precocidade do Relato: As tradições sobre a ressurreição de Jesus surgiram muito cedo, logo após sua morte, o que não dava tempo suficiente para se criar um mito.
Irei, ao final do texto, responder um a um desses argumentos. Aqui, no entanto, cabe ressaltar que na pesquisa acadêmica hoje, essa lista de fatos mínimos de Habermas e Lycona não é aceita. Na realidade, quando ele propôs a lista, esses seis fatos já não eram todos consensos. Ainda assim, assumindo a verdades desses seis fatos, temos uma teoria alternativa à do Craig que também os explica de forma coerente: o modelo RHBS.
O modelo RHBS foi proposto por James Fodor para explicar esses seis fatos. RHBS é uma sigla que representa quatro componentes centrais: Reburial (Reenterramento), Hallucinations (Alucinações), Biases (Vieses) e Socialisation (Socialização). A primeira etapa, Reburial, parte do pressuposto de que o corpo de Jesus foi inicialmente enterrado no túmulo de José de Arimatéia, mas que posteriormente teria sido removido ou reenterrado antes da visita dos discípulos na manhã de domingo. Fodor argumenta que, devido à pressa do sepultamento na sexta-feira à tarde, em função do sábado iminente e dos costumes funerários judaicos, um enterro temporário seria plausível. A eventual relocação do corpo explicaria o túmulo vazio sem necessidade de que Jesus tenha fisicamente ressuscitado.
A segunda etapa, Hallucinations, propõe que pelo menos um dos seguidores de Jesus experimentou uma percepção alucinatória do mestre vivo após sua morte. Esse tipo de experiência é bem documentado em contextos de luto intenso, em que indivíduos submetidos a forte estresse emocional podem ter impressões sensoriais vívidas do falecido, servindo como base psicológica para a crença em aparições pós-morte.
A terceira etapa, Biases, enfatiza o papel dos vieses cognitivos, distorções sistemáticas no pensamento que poderiam ter moldado e reforçado essas crenças. Vieses de memória, efeitos de conformidade social e raciocínio motivado podem levar indivíduos e grupos a lembrar eventos de forma incorreta, interpretar excessivamente experiências e consolidar crenças coletivas mesmo diante de evidências contrárias.
A quarta etapa, Socialisation, destaca a influência do reforço social e cultural. As primeiras comunidades cristãs eram coesas, e as crenças eram transmitidas e reforçadas por meio de narrativas comunitárias repetidas. Dúvidas e dissidências eram frequentemente suprimidas por pressões sociais, resultando em um sistema de crenças coletivamente estabilizado que interpretava o túmulo vazio e as experiências visionárias como evidência de ressurreição.
RHBS, no entanto, é um modelo "concessionista”, isto é, que concede que os seis fatos mínimos da abordagem de Habermas e Lycona são verdadeiros. No entanto, a pesquisa acadêmica atual considera consenso apenas os seguintes fatos:
(1) Jesus morreu por crucificação.
(2) Pelo menos alguns discípulos de Jesus começaram a ter visões de um Jesus ressuscitado.
(3) Pelo menos uma pessoa que não acreditava em Jesus (Paulo), teve uma visão semelhante.
(4) A ressurreição foi pregada muito cedo.
Dado esses quatro fatos, na minha opinião, a teoria que melhor os explica, inspirado em Dominic Crossan, é a Teoria das Aparições Visionárias. Vejamos a seguir como essa teoria explica esses quatro fatos.
III. TEORIA DAS APARIÇÕES VISIONÁRIAS
De acordo com a Teorias das Aparições Visionárias, essa foi a sequência de eventos após a morte de Jesus:
1. Jesus é deixado no madeiro, e seu corpo é provavelmente devorado por animais e aves de rapina, conforme práticas comuns da crucificação na época ou jogado em uma vala comum onde é devorado por cães: Isso está em acordo com a melhor evidência histórica e arqueológica disponível. Crucificados não eram sepultados, salvo raríssimas exceções. Esse é o motivo pelo qual, embora Roma crucificasse milhares de pessoas, os ossos desses crucificados quase nunca foram encontrados. Um crucificado só era sepultado se ele tinha um padrinho rico que solicitava isso – mas geralmente quem tinha padrinho rico não era crucificado e quem era crucificado não tinha padrinho rico.
2.Após isso, os discípulos se dividem em três grupos principais:
(i) Um grupo abandona a fé e retorna aos seus antigos trabalhos e ocupações.
(ii) Um segundo grupo continua a pregar a mensagem de Jesus, interpretando sua morte como uma reafirmação da validade de sua mensagem sem necessidade de acreditar em ressureição. Esse grupo pode remontar àqueles que receberam a comissão que se encontra no Evangelho Q (Lucas 10:1-16 e Mateus 11:21-24) e que podem ter justamento dado origem ao Evangelho Q.
(iii) Um terceiro grupo passa a crer sinceramente que Jesus ressuscitou, baseando-se em experiências de aparições visionárias individuais e coletivas (comparáveis às aparições da Virgem Maria no Catolicismo).
Não devemos supor, pois, que todos os discípulos de Jesus passaram a crer na ressurreição, nem que todos os discípulos que mantiveram sua fé também acreditavam que ele ressuscitou.
3. Esse terceiro grupo começa a desenvolver, muito cedo, de forma sincera e orgânica tradições pascais orais que incluem narrativas sobre o sepultamento, encontro do túmulo vazio, ressurreição de Jesus e suas aparições. Essas tradições se formam de modo natural: se Jesus ressuscitou, logo seu corpo foi preservado. Se seu corpo foi preservado, logo ele foi sepultado. Se ele foi sepultado, logo ele tinha um padrinho rico que solicitou seu sepultamento. Se ele tinha um padrinho rico que não era conhecido, logo esse padrinho rico foi um discípulo secreto (José de Arimatéia). Se ele ressuscitou e foi sepultado, logo a tumba foi encontrada vazia. Se a tumba foi encontrada vazia, logo foi pelas discípulas mulheres, porque a elas cabiam cuidar do corpo de Jesus. Chamamos isso de “Tradição Pascal” que irá depois aparecer de diferentes formas (e com contradições e discrepâncias) em diferentes Evangelhos. Como o relato pascal é muito “conveniente”, isso torna improvável que ele seja histórico.
4. Essas tradições pascais orais são posteriormente registradas, primeiro por Paulo (em cartas como 1 Coríntios 15) que registra apenas a ideia de que houve sepultamento e aparições e, mais tarde, pelos evangelistas, que sistematizam essas tradições em narrativas escritas, incluindo a descoberta do túmulo vazio pelas mulheres.
Há duas formas de explicar as aparições visionárias, uma sobrenaturalista (segundo a qual as aparições de Jesus foram fenômenos sobrenaturais) e uma naturalista (segundo a qual essas aparições tiveram causas naturais). Sendo tudo igual, devemos preferir a explicação naturalista por ser mais simples, o que aproxima essa teoria ao modelo RHBS. Contudo, evita-se aqui o termo alucinação por sua conotação psicopatológica e anacrônica. Uma explicação psicológica das aparições visionárias aos discípulos é facilmente explicada como induzida pelo luto que experimentavam. Paulo é o único não-cristão que temos registro que teve uma aparição de Jesus, o que pode ser explicado como resultado da culpa que ele sentia por perseguir cristãos ao ver que eles eram pessoas sinceras e boas. Por fim, cabe agora responder os argumentos de William Lane Craig a favor da ressurreição histórica de Jesus.
IV. RESPOSTA AOS ARGUMENTOS DE CRAIG
Assumindo a Teoria das Aparições Visionárias, vejamos como cada argumento de William Lane Craig pode ser satisfatoriamente respondido:
1. ARGUMENTO DO TESTEMUNHO OCULAR: o testemunho ocular de grande número de pessoas: de acordo com o apóstolo Paulo, 500 pessoas testemunharam de maneira ocular que Jesus ressuscitou, seria impossível que 500 pessoas tivessem uma alucinação coletiva e se enganassem a esse respeito (1 Coríntios 15:6).
RESPOSTA: Paulo é o único autor a mencionar que Jesus apareceu de uma só vez a 500 pessoas, sem pelo menos um duplo testemunho independente não é possível estabelecer a Historicidade de uma declaração. Contudo, é verdade que Jesus apareceu a diferentes pessoas e grupos de pessoas após a sua morte. O que se discute é a natureza dessas aparições. Paulo, por exemplo, inclui o fato de que Jesus apareceu a ele como prova de que Jesus ressuscitou, no entanto, Jesus apareceu a Paulo em uma visão. Pode ser que as aparições de Jesus tenham a mesma natureza das aparições da Virgem Maria no Catolicismo romano. Há relatos de aparições de Maria a 70 mil pessoas de uma só vez, nem por isso, as pessoas estão prontas para concluir, a partir dessas aparições, que houve uma ressurreição de Maria.
2. ARGUMENTO DA DISSIMILARIDADE DA CRENÇA: A crença de que Jesus ressuscitou era contraproducente, era um tipo de crença que não atraía nem judeus nem pagãos, pois estava em descontinuidade com o que eles ensinavam. Assim, se os cristãos precisassem inventar um mito para atrair seguidores e vender uma ideia atrativa, não teriam inventado que Jesus ressuscitou.
RESPOSTA: Essa informação é equivocada. Na verdade, a crença na ressurreição cristã está em continuidade com a crença dos fariseus na ressurreição geral dos fiéis no fim dos tempos. Paulo interpretou a ressurreição de Jesus, não como uma ressurreição individual isolada, mas como parte da ressurreição geral no fim dos tempos. Para Paulo, não era que o fim dos tempos estava próximo, mas que ele já havia começado. A ressurreição de Jesus já era o caso da primeira pessoa a ressuscitar como parte da ressurreição geral final (1 Coríntios 15:20-22). Como a ressurreição de Jesus era parte da ressurreição geral final dos justos, o ensino paulino estava em continuidade com o ensino farisaico da ressurreição geral final.
3. ARGUMENTO DO MARTÍRIO DAS TESTEMUNHAS: seguidores de Jesus se entregaram à morte em nome dele. Não faz sentido pensar que pessoas entregariam sua vida por algo que soubessem conscientemente ser uma mentira.
RESPOSTA: Se as aparições de Jesus após a sua morte se assemelhavam às aparições da Virgem Maria no Catolicismo Romano, mesmo se essas aparições fossem meramente psicológicas, então essas aparições eram, para os discípulos que as experimentaram, pelo menos fenomenologicamente reais. Isso significa que os seguidores de Jesus que passaram a acreditar em sua ressurreição, acreditavam sinceramente na ressurreição de Cristo com base em suas experiências religiosas fenomenologicamente reais. Sendo assim, que eles estavam dispostos a morrer por sua fé só prova que sua crença era sincera, não que era verdadeira.
4. ARGUMENTO DO TÚMULO VAZIO: o túmulo no qual Jesus foi sepultado foi encontrado vazio, algo que é um consenso entre acadêmicos.
RESPOSTA: É falso que exista um consenso de “fatos mínimos” sobre tumba vazia como Craig afirma. De acordo com a evidência arqueológica e histórica, sabe-se que via de regra, crucificados não eram sepultados, antes seus corpos eram devorados por cães e aves sem deixar vestígios. Assim, é possível que o corpo de Jesus após sua morte tenha sido devorado por animais e que a tradição de que o corpo de Jesus foi sepultado para que pudesse voltar à vida seja uma tradição que se formou a partir da crença na ressurreição de Cristo. No entanto, ainda que o túmulo de Jesus possa ter sido encontrado vazio isso pode ser interpretado de diferentes formas. Pode ser que as mulheres se equivocaram quanto ao túmulo em que Jesus estava ou pode ser que o corpo de Jesus tenha sido transferido para outro túmulo sem aviso prévio. O mais provável, contudo, é que Jesus não foi sepultado e a ideia de sepultamento surgiu naturalmente da crença na ressurreição, porque se Jesus ressuscitou, logo seu corpo tem de ter sido preservado. O corpo de Jesus só teria sido preservado se ele fosse sepultado. Um crucificado só era sepultado se tinha um padrinho rico, logo Jesus tinha um discípulo rico secreto que solicitou seu sepultamento (José de Arimateia) e se ele ressuscitou, sua tumba foi encontrada vazia.
5. ARGUMENTO DO TESTEMUNHO FEMININO: Se a ressurreição de Jesus não fosse real, os Evangelhos não colocariam as mulheres como primeiras testemunhas, porque o testemunho delas não tinha valor.
RESPOSTA: O fato de a tradição ter colocado as mulheres como primeiras testemunhas da tumba vazia, vem apenas de uma tradição dos Evangelhos de colocar as mulheres como responsáveis pelo cuidado do corpo de Jesus, por isso são elas as primeiras a ir ao túmulo cuidar do corpo dele e, por isso, o encontram vazio. No entanto, depois Jesus aparece aos discípulos homens e é esse testemunho que conta posteriormente como argumento de evidência da ressurreição de Jesus.
6. ARGUMENTO DA PUBLICIDADE: o túmulo vazio era algo público que qualquer um podia checar. Se os discípulos tivessem mentido, bastava aos céticos da época desmentir mostrando o túmulo vazio.
RESPOSTA: Não há sustentação histórica para a ideia de uma tumba vazia como evento público. Marcos retrata a tumba vazia como um evento secreto, que as mulheres guardaram para si (Marcos 16:8). Os evangelhos dizem que quando Jesus morreu, os discípulos fugiram, de modo que eles não estavam lá para testemunhar onde ele seria sepultado. Além disso, o movimento de Jesus era marginal e ele era só mais um candidato messiânico morto, ele não era uma figura pública e popular. Ninguém na época iria ligar ou querer desmentir se seus discípulos saíssem dizendo que ele ressuscitou. Mesmo a declaração de Mateus (28:15) de uma história espalhada entre os judeus de um corpo roubado pode ser algo bem posterior que surgiu como objeção à narrativa cristã do túmulo vazio, num tempo em que as testemunhas oculares provavelmente nem mais existiam.
(7) ARGUMENTO DA PRECOCIDADE DO RELATO: As tradições sobre a ressurreição de Jesus surgiram muito cedo, logo após sua morte, o que tornaria improvável que fossem fruto de lendas tardias, visto que não haveria tempo suficiente para formação de um mito. A proximidade temporal entre os acontecimentos e os relatos indicaria uma base histórica sólida para as narrativas pascais.
RESPOSTA: A precocidade da tradição pascal não implica sua historicidade. Ela pode ser explicada por um encadeamento lógico muito natural derivado da crença inicial na ressurreição: se Jesus ressuscitou, então seu corpo foi preservado; se foi preservado, então foi sepultado; se foi sepultado, então sua tumba foi encontrada vazia; e, assim, mulheres, responsáveis pelo cuidado do corpo, teriam descoberto o túmulo, enquanto alguém com recursos teria solicitado o sepultamento. Esse encadeamento gera uma narrativa altamente conveniente e funcional para sustentar a crença na ressurreição. O surgimento repentino de um “discípulo secreto rico”, José de Arimateia, que aparece nas narrativas exclusivamente para cumprir a função de sepultar Jesus, reforça esse caráter conveniente. Justamente por ser tão bem ajustada às necessidades teológicas da tradição pascal, essa narrativa se mostra mais plausível como desenvolvimento lógico e interpretativo precoce do que como um relato histórico.

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