BREVE INTRODUÇÃO À METAÉTICA

 

O objetivo deste texto é apresentar uma Breve Introdução à Metaética a partir das aulas apresentadas sobre o assunto por Kane B em seu canal no Youtube (aqui). Este texto trata-se, pois, de anotações por escrito a partir do que ele apresenta em seus vídeos. O texto se divide nas seguintes partes: (1) Posições em Metaética; (2) Emotivismo; (3) Teoria do Erro; (4) Subjetivismo; (5) Realismo Moral.

I. POSIÇÕES EM METAÉTICA


A Ética é a área da filosofia que estuda o bom agir. Ela se divide em três grandes áreas: (1) Ética aplicada: trata de problemas éticos práticos, como aborto, eutanásia, meio ambiente, moralidade sexual, direitos animais etc.; (2) Ética normativa: lida com as regras e princípios que devem guiar o comportamento, como é o caso do utilitarismo, imperativo categórico kantiano, ética das virtudes, egoísmo racional etc.; (3) Metaética: considera o significado das sentenças morais e a natureza dos fatos morais, como é o caso das discussões sobre cognitivismo, não-cognitivismo e realismo moral.

Este texto se dedica, portanto, à terceira área da Ética. As posições em metaética podem ser divididas em dois grandes grupos: (1) Cognitivismo: posição segundo a qual sentenças morais podem ser verdadeiras ou falsas; (2) Não-cognitivismo: posição segundo a qual sentenças morais não possuem valor de verdade. Exemplos de posições não-cognitivisras são: (2.1) Emotivismo: posição segundo a qual sentenças morais expressam emoções; (2.2) Prescritivismo: posição segundo a qual sentenças morais são imperativas; (2.3) Quasi-realismo: posição segundo a qual sentenças morais expressam atitudes que são suficientes para vindicar uma base moral realista.  Neste texto, a fim de exemplificar o não-cognitivismo, será considerado apenas o emotivismo.

Os cognitivistas se subdividem em três grupos: (1.1) Teoria do Erro: posição segundo a qual todas as sentenças morais são falsas; (1.2) Subjetivismo: posição segundo a qual o que faz sentenças morais serem verdadeiras são opiniões, sentimentos e atitudes das pessoas; (1.3) Realismo moral: posição segundo a qual há propriedades morais objetivas independentes das opiniões das pessoas. O realismo moral, por sua vez, se subdivide em dois tipos: (1.3.1) Naturalismo moral: posição segundo a qual propriedades morais são naturais; (1.3.2) Não-naturalismo moral: posição segundo a qual propriedades morais não são redutíveis a propriedades naturais. 

Essas posições são ilustradas na imagem abaixo:



II. EMOTIVISMO


O emotivismo é uma forma de não-cognitivismo, tratando-se, portanto, de uma posição segundo a qual sentenças morais não são verdadeiras nem falsas. Para os emotivistas, sentenças morais expressam as nossas emoções. Um proponente do emotivismo é o filósofo britânico Alfred Ayer. O emotivismo de Ayer foi produto de sua aderência ao positivismo lógico. O positivismo filosófico é uma corrente filosófica que adota o chamado princípio da verificação. De acordo com o princípio da verificação, uma sentença possui significado cognitivo apenas se ela é ou analiticamente ou empiricamente verificável. Assim, há dois tipos de sentenças que possuem significado cognitivo: (1) sentenças analíticas: são aquelas que são verdadeiras em virtude de seu próprio significado. Exemplo: “Todos os solteiros são não-casados”; (2) sentenças sintéticas: são aquelas que são verdadeiras em virtude do modo como o mundo é. Exemplo: “Está chovendo lá fora”.

Uma sentença é empiricamente verificável apenas no caso de haver um conjunto de observações que possam mostrar que ela é verdadeira. Sentenças morais não são analíticas (não são meras definições) nem podem ser verificadas (porque no mundo há apenas fatos, não valores). Logo, sentenças morais não possuem significado cognitivo. Para os emotivistas, sentenças morais possuem apenas “significado emotivo”. Isso significa que sentenças morais expressam emoções.

É importante distinguir “expressar” de “descrever” emoções. Sentenças como “eu me sinto feliz”, “o assassinato me causa nojo” ou “Eu desaprovo o assassinato” são sentenças que descrevem emoções e enquanto sentenças descritivas elas podem ser verdadeiras ou falsas, ou seja, possuem significado cognitivo. Já a sentença “o assassinato é errado” não descreve, mas expressa um estado emocional. Tal sentença, que é um juízo moral não pode ser verdadeira nem falsa. É importante considerar, no entanto, que para ser um emotivista não é necessário ser um verificacionista. O filósofo analítico Charles Stevenson é um exemplo de emotivista que não é verificacionista.

É possível, no entanto, apresentar algumas objeções ao emotivismo:

1. O emotivismo destrói coisas importantes como verdades morais, objetividade moral e progresso moral. No emotivismo, a moralidade se torna mera questão de opinião;

2. O emotivismo implica que não há qualquer discordância moral real. Quando uma pessoa diz “aborto é errado” e outra pessoa diz “aborto é permissível”, para o emotivista, essas duas pessoas não estão em discordância, apenas possuem atitudes emocionais diferentes sobre o aborto. Assim, o emotivismo não dá conta da discordância moral;

3. Se julgamentos morais expressam emoções, por que eles não deveriam expressar crenças? Da mesma forma que juízos morais expressam emoções eles poderiam muito bem expressar crenças morais e essas crenças poderiam ser verdadeiras ou falsas;

4. Se julgamentos morais são expressões de emoções, quais emoções esses julgamentos expressam? Caso se responda que eles expressam emoções especificamente morais, então o emotivismo é circular, pois define juízos morais em termos de emoções morais (juízos morais são aqueles que expressam emoções morais) e define emoções morais em termos de juízos morais (emoções morais são aquelas que são expressas por juízos morais). Por outro lado, caso se responda que julgamentos morais expressam emoções não-morais, o que determina quando algo conta como uma emoção moral?

5. É possível fazer julgamentos morais sem nenhuma emoção correspondente. Um psicopata, por exemplo, pode dizer “Eu sei que o assassinato é errado, mas eu não ligo, eu tenho prazer em matar”. Nesse caso, temos um juízo moral que não expressa qualquer emoção.

6. O emotivismo enfrenta o chamado Problema de Frege-Geach. De acordo com esse problema, se o emotivismo for correto então o significado de sentenças morais muda em contextos não-afirmativos, mas parece óbvio que o significado de sentenças morais não muda nesses contextos. Por exemplo, considere as frases: “Se matar é errado, então pagar alguém para matar é errado”; “João diz que matar é errado” e Precisamos discutir se matar é errado”. Nessas frases, a expressão “matar é errado” não expressa emoções. Mas se “matar é errado” só tem significado emotivo, ou essas frases são sem sentido ou o significado delas muda.

7. O emotivismo cai no chamado Dilema de Jorgensen, de acordo com o qual um argumento para ser válido precisa ser preservador de verdade, mas se sentenças morais não podem ser verdadeiras nem falsas, não é possível construir argumentos a partir de sentenças morais. Isso tornaria impossível argumentar sobre assuntos morais.

III. TEORIA DO ERRO

Outra teoria em metaética é a chamada Teoria do Erro (Error-Theory) defendida por John Mackie. De acordo com essa teoria, todas as sentenças morais são falsas. Para defender tal ponto, Mackie apresenta o seguinte argumento:

1. Sentenças morais expressam crenças sobre valores morais objetivos;

2. Não existem valores morais objetivos;

3. Logo, todas as sentenças morais são falsas.

Em relação à primeira premissa do argumento “sentenças morais expressam crenças sobre valores morais objetivos”, ela depende de que sentenças morais pressuponham que há valores morais independentes do que alguém pensa sobre eles (mind-independent). Há pelo menos três razões para considerar que esse é o caso: (i) tomamos sentenças morais como autoritativas; (ii) supomos que valores morais tornam a vida significativa; (iii) a teoria de que a linguagem moral expressa crenças está em acordo com a ideia de que a linguagem moral está em continuidade com nossa linguagem sobre outras coisas, isto é, nossa linguagem pretende ter valor de verdade.

Em relação à segunda premissa do argumento: “não existem valores morais objetivos”, pode-se apresentar os seguintes argumentos:

1. Argumento da relatividade: valores morais variam significativamente entre sociedades e mesmo entre pessoas de uma mesma cultura;

2. Argumento da estranheza metafísica: se houvesse valores morais objetivos, então eles seriam entidades ou relações de um tipo muito estranho, totalmente diferente de qualquer coisa no universo;

3. Argumento da estranheza epistemológica: se houvesse valores morais objetivos, para conhecê-los, nós precisaríamos de uma faculdade perceptiva ou intuitiva totalmente diferente de nosso modo ordinário de conhecer outras coisas;

4. Argumento da simplicidade ontológica: entidades não devem ser multiplicadas além da necessidade. Realistas morais precisam postular toda uma dimensão da realidade de entidades morais objetivas. Logo, a teoria do erro possui maior simplicidade ontológica.

5. Argumento da simplicidade teorética: não se deve multiplicar suposições e hipóteses além da necessidade. Teorias que supõem existir valores morais objetivos acabam tendo que fornecer uma abordagem semântica do discurso moral muito complexa. A teoria do erro é teoreticamente mais simples.

6. Argumento evolucionário: a moralidade é produto da evolução, os seres humanos desenvolveram crenças morais, pois elas favorecem a sobrevivência da espécie. Esse processo, entretanto, não é portador de verdade.

IV. SUBJETIVISMO

O Subjetivismo ético se baseia em três teses: (1) sentenças morais expressam crenças; (2) algumas sentenças morais são verdadeiras e; (3) o que faz as sentenças morais serem verdadeiras são as opiniões, sentimentos e atitudes das pessoas. Há dois tipos de subjetivismo, de acordo com o subjetivismo relativista, sentenças morais são relativas a indivíduos ou culturas, é o caso do subjetivismo individual e do subjetivismo cultural, que serão considerados a seguir. Já de acordo com o subjetivismo não-relativista, sentenças morais, embora dependam da mente, não são relativas a indivíduos ou culturas, é o caso da Teoria do Comando Divino e da Teoria do Observador Ideal, que serão consideradas adiante.

De acordo com o subjetivismo individualista, sentenças morais são descrições de atitudes do falante. Assim, “x é certo” significa “eu aprovo x” e “x é errado” significa “eu desaprovo x”. Diferente do emotivismo, o subjetivista entende que essas declarações possuem valor de verdade. Pode-se, no entanto, levantar algumas objeções ao subjetivismo individualista:

1. O subjetivismo individualista não explica o desacordo moral. Se uma pessoa A diz “o aborto é errado” e uma pessoa B diz “o aborto não é errado” pode parecer superficialmente que elas discordam entre si. Mas se o subjetivismo individualista for verdadeiro, o que a pessoa A quer dizer é “Eu (a pessoa A) desaprovo o aborto” e o que a pessoa B quer dizer é “Eu (a pessoa B) não desaprovo o aborto”. Se esse é o caso, essas pessoas não discordam entre si. Assim, o subjetivismo individualista não dá conta do desacordo moral.

2. O subjetivismo individualista não dá conta da força persuasiva dos julgamentos morais. Se uma sentença moral expressa minha atitude de aprovação ou desaprovação, ela não serve para tentar influenciar o comportamento de outra pessoa. Mas um elemento fundamental da moral é a tentativa de convencer outras pessoas a mudar seu comportamento.

3. O subjetivismo individualista implica que todos os nossos julgamentos morais são infalíveis. Desde que uma pessoa esteja sendo honesta e sincera sobre suas atitudes, todos os seus juízos morais são verdadeiros, o que é uma conclusão estranha.

4. O subjetivismo individualista enfrenta o problema da inconsistência. Uma pessoa pode ter crenças contraditórias sobre a moralidade de algo. No entanto, se todos os nossos juízos morais honestos são verdadeiros, então duas sentenças contraditórias poderiam ser ambas verdadeiras, mas duas coisas contraditórias não podem ser ambas verdadeiras.

5. Nossos juízos morais pretendem ser objetivamente verdadeiros. Quando digo “o aborto é errado” não quero dizer “o aborto é errado para mim”, mas sim que o aborto é simplesmente errado.

Enquanto o subjetivismo individualista diz que a moral é relativa ao indivíduo, o subjetivismo cultural postula que o valor de verdade das sentenças morais é relativo à cultura em sentido mais amplo. Assim, quando alguém diz “o aborto é errado” isso significa “a minha cultura desaprova o aborto”. O subjetivismo cultural traz como benefício o fato de que ele está em maior acordo com nossas intuições de que a moralidade transcende os indivíduos. Além disso, o subjetivismo cultural dá uma base para estimular o respeito e a tolerância entre as culturas. O subjetivismo cultural também parece fornecer a melhor explicação da razão pela qual as culturas discordam moralmente entre si, já que entende que não há nenhum padrão objetivo que transcenda as culturas. Além disso, o subjetivismo cultural está em acordo com a distinção entre fatos e moralidade na medida em que a moralidade é entendida como um constructo cultural e não um fato natural.

Apesar disso, o subjetivismo cultural enfrenta alguns problemas:

1. O subjetivismo cultural parece eliminar a justificação de reformas morais, já que reformadores morais que discordam do consenso moral cultural estariam errados.

2. O subjetivismo cultural implicaria que atos terríveis apoiados por uma cultura são perfeitamente aceitáveis, como o caso do holocausto nazista.

3. O subjetivismo cultural implicaria coisas absurdas, por exemplo, se o subjetivismo cultural estiver correto se uma pessoa vive em uma cultura em que a homossexualidade é condenada, então a homossexualidade seria errada.

4. Na prática, muitas pessoas não ligam para o que é considerado culturalmente certo ou culturalmente errado.

5. O subjetivismo cultural enfrenta o problema de definir o que é cultura e quais são os seus limites.

6. O subjetivismo cultural precisaria definir como saber qual a moralidade de uma cultura, isto é, se devemos basear isso no que a maioria absoluta diz, ou nos códigos legais dessa cultura ou se no que acham seus governantes ou sua classe dominante etc.

Enquanto os subjetivismos individual e cultural são relativistas, há formas não-relativistas de subjetivismo. Uma teoria subjetivista não-relativista é a chamada Teoria do Observador Ideal. De acordo com a Teoria do Observador Ideal, quando alguém diz “x é certo”, isso significa “x é aprovado por um ou por um conjunto de observadores ideais”. Já quando alguém diz “x é errado” isso significa que “x é desaprovado por um ou por um conjunto de observadores ideais”.

Há dois tipos de teoria sobre o que seria um Observador Ideal; De acordo com alguns, um observador ideal seria alguém essencialmente como um humano bom, mas com menos preconceitos, mas bem informada e racional. Já segundo outros, um observador ideal seria alguém com atributos semelhantes a um ser divino (God-like), para os que defendem essa posição, “x é certo se caso houvesse uma pessoa que é onisciente, onipotente e desinteressado, então essa pessoa aprovaria X”.

É importante considerar que para a Teoria do Observador Ideal, o julgamento de um observador ideal não é melhor por ser mais objetivo, mas meramente em virtude das características desse observador. A Teoria do Observador Ideal enfrenta, entretanto, alguns problemas:

1.  Como podemos saber quais seriam os julgamentos de um observador ideal?

2. A Teoria do Observador Ideal não combina com o significado usual de sentenças morais. Quando as pessoas dizem “o aborto é errado”, elas não querem dizer “um Observador Ideal desaprova o aborto”.

3. Por qual razão deveríamos nos importar mais com o julgamento de um Observador Ideal se não há nenhum padrão objetivo para dizer que eles são melhores?

4. Um Observador Ideal estaria removido das situações concretas da vida humana, que valor, portanto, poderia ter seus julgamentos para nós?

5. Nossos julgamentos morais são influenciados por nossos temperamentos, logo, observadores ideais com diferentes temperamentos poderiam chegar a diferentes julgamentos. Como decidir qual observador ideal está correto?

Outra forma de subjetivismo não-relativista é a chamada Teoria do Comando Divino. De acordo com essa visão, Deus determina o padrão moral. Nesse caso, “x é certo” significa “Deus aprova x” e “x é errado” significa “Deus desaprova x”. A Teoria do Comando Divino enfrenta, contudo, alguns problemas:

1. A Teoria do Comando Divino tornaria a moralidade arbitrária. Por exemplo, se Deus ordenasse torturar crianças, torturar crianças seria correto?

2. Para a Teoria do Comando Divino dizer que Deus é bom se torna uma declaração vazia. Se “bom” significa “comandado por Deus” dizer que “Deus é bom” significaria “Deus faz o que Deus comanda ele mesmo a fazer”, o que é sem sentido ou ao menos circular.

3. Não temos razões para dizer que a moralidade necessariamente depende de Deus. Há formas de fundamentar a moralidade sem fazê-la depender de comandos divinos.

V. REALISMO MORAL


Uma última visão em metaética que será considerada neste texto é o realismo moral. O realismo moral se baseia em três teses: (1) sentenças morais expressam proposições que podem ser verdadeiras ou falsas (cognitivismo); (2) algumas sentenças morais são verdadeiras e; (3) sentenças morais são verdadeiras ou falsas em virtude de propriedades do mundo (mind-independent). O realismo moral tem o benefício de adotar uma moralidade objetiva, o que está em acordo com nosso senso comum sobre a moral. Além disso, o realismo moral explica porque podemos cometer erros morais e fornece uma base melhor para entender por que juízos morais tem uma força persuasiva. Ademais, o progresso moral é mais bem explicado pelo realismo moral.

Há duas formas de realismo moral: (i) naturalismo: de acordo com essa visão, fatos ou propriedades morais são fatos ou propriedades naturais; (ii) não-naturalismo: de acordo com essa posição, fatos ou propriedades morais são irredutíveis a fatos ou propriedades naturais. De acordo com o não-naturalismo, propriedades morais mantêm uma relação de superveniência em relação a propriedades naturais. Propriedades-A são supervenientes em relação a propriedades B apenas no caso de que não pode haver mudanças em propriedades A sem mudanças nas propriedades B.

Uma forma de não-naturalismo é o chamado Intuicionismo. De acordo com o Intuicionismo, a moralidade se baseia fundamentalmente em nossas intuições no sentido de que são nossas intuições que nos dão acesso a fatos morais irredutíveis a fatos naturais. Um defensor dessa posição é o filósofo George Edward Moore. Moore entende que não temos como definir “bom” assim como não é possível definir “amarelo”, por exemplo. Um argumento a favor disso é o chamado Argumento da Questão Aberta. Uma questão é aberta quando ela se trata de uma pergunta do tipo “É um X um Y” tal que X não possa ser definido em termos de Y. Por exemplo, a pergunta “É o amor uma atração?”, é uma questão aberta pois o amor não pode ser simplesmente definido em termos de atração. A pergunta sobre “o que é bom?” seria aberta porque não se pode definir o bem moral em termos de outra coisa.

Definir “bom” em termos de outra coisa sempre comete a falácia naturalista, que consiste em reduzir o bem moral a outras coisas. O bem moral é uma propriedade não-analisável, indefinível e irredutível. Moore defende a chamada lacuna do ser-dever (is-ought gap), segundo a qual não é possível derivar reivindicações normativas a partir de premissas puramente descritivas. Moore, no entanto, não distingue fato de valor, pois entende que valores são fatos e esses fatos morais são acessados por meio de nossas intuições. Intuições consistem em inclinações para crer em uma dada proposição porque ela parece ser o caso para nós. O intuicionismo, todavia, enfrenta alguns problemas:

1.  O Intuicionismo falha em dar conta da força moral dos julgamentos morais. O que nos motiva moralmente são nossos desejos e não fatos morais externos.

2. Valores morais não-naturais são entidades estranhas: como explicar a relação entre propriedades morais e propriedades naturais?

3. Por que deveríamos confiar em nossas intuições? Temos diversas razões para duvidar de nossas intuições, como o fato de que elas são influenciadas pela nossa cultura, outras pessoas não têm as mesmas intuições que nós, não sabemos como elas funcionam, não sabemos como elas nos dão acesso a fatos e pode haver intuições ilusórias.

4. Um problema do Intuicionismo foi apontado por Gilbert Harman e é denominado como Impotência Explanatória. Esse problema se refere ao fato de que recorrer a fatos morais externos é irrelevante para explicar reações morais, a sensibilidade moral do observador é suficiente para explicar reações morais. Assim, a postulação de fatos morais externos é supérflua.

5. Por fim, o intuicionista moral precisa explicar que tipo de poder causal propriedades morais podem ter.

Enquanto não-naturalistas entendem que propriedades morais são irredutíveis a propriedades naturais, de acordo com o naturalismo moral, fatos ou propriedades morais são fatos ou propriedades naturais. Naturalistas morais defendem que a bondade e a maldade possuem efeitos causais no mundo. Pode-se falar do naturalismo moral em dois aspectos: (i) aspecto metafísico: para os naturalistas morais, propriedades morais são propriedades naturais; (ii) aspecto epistemológico: para os naturalistas morais, crenças morais são justificadas basicamente da mesma forma que outras crenças empíricas.

Há, ainda, dois tipos de naturalismo moral: (i) naturalismo moral reducionista ou analítico: consiste na posição de que o vocabulário moral é analisável em termos do vocabulário não-moral, por exemplo, “certo” significa “maximizar prazer”; (ii) naturalismo moral não-reducionista ou sintético: consiste na posição de que ainda que propriedades morais sejam naturais, a linguagem moral não pode ser reduzida à linguagem não-moral.

Um exemplo de naturalismo moral reducionista foi proposto por Peter Railton, segundo ele, a moralidade se baseia na racionalidade social, que consiste naquilo que seria racionalmente aprovado por um agente racional, imparcial e bem informado como sendo o interesse de todos os indivíduos afetados. Já uma forma de naturalismo moral não-reducionista é o chamado Realismo de Cornell, segundo o qual a linguagem moral não pode ser reduzida à linguagem não moral. Richard Boyd, um proponente dessa forma de realismo, entende que o bem moral é uma propriedade homeostática (Homeostatic Property Cluster – HPC). Uma propriedade homeostática é uma propriedade que faz parte de um conjunto de propriedades que tendem a ser co-instanciadas ou que a ocorrência de uma propriedade promove a ocorrência das demais. Assim, a bondade é uma propriedade que implica a promoção de outras propriedades, como a paz, a liberdade e a felicidade, por exemplo.

O naturalismo moral, no entanto, enfrenta o problema da lacuna do ser-dever (is-ought gap), de que não é possível derivar sentenças normativas de sentenças descritivas. Isso ocorre porque propriedades naturais são descritivas e não podem fornecer a base para a normatividade moral. Isso pode ser considerado como o Problema da Normatividade e pode ser colocado na forma do seguinte argumento:

1. Fatos naturais não são normativos.

2.Normatividade é uma característica essencial da moralidade.

3. Logo, fatos morais não são fatos naturais.

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