A DOUTRINA DA JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ - GÁLATAS 2.15-21
Fiz uma exegese em Gálatas
1.6-10 e já foi observado que Paulo escrevia para pessoas que ele havia
evangelizado em sua primeira viagem missionária. No entanto, falsos mestres
judaizantes estavam perturbando os gálatas, negando o apostolado paulino e
exigindo a submissão dos gentios às leis judaicas. Agora, será apresentada uma
análise do texto de Gálatas 2.15-21, no qual o apóstolo Paulo trata do tema da
justificação pela fé:
15 Nós,
judeus por natureza e não pecadores dentre os gentios,
Ἡμεῖς φύσει Ἰουδαῖοι καὶ οὐκ ἐξ ἐθνῶν ἁμαρτωλοί
A carta aos gálatas recorrentemente trata de dois temas: o evangelho de Cristo e o
apostolado de Paulo. Por exemplo, Paulo saúda os gálatas defendendo seu
apostolado (1.1-5), exorta os gálatas contra os judaizantes (1.6-9) e defende
novamente seu apostolado e o evangelho de Cristo com sua própria biografia
(1.10-17). O apóstolo defende que recebeu seu evangelho por revelação divina, e
não de homens, nem mesmo de outros apóstolos e nesse sentido, o evangelho por
ele pregado não dependia da aprovação humana. O evangelho pregado por Paulo se
mantinha de pé mesmo contra um dos colunas da Igreja, Pedro (WH).
Em seguida, o texto narra uma divergência entre o apóstolo
Paulo, pregador para os gentios e o apóstolo Pedro, pregador para os judeus
(2.1-10). Paulo repreende Pedro por se deixar influenciar pelos judaizantes
(2.11-14). A controvérsia entre os dois ocorreu provavelmente logo depois do
Concílio de Jerusalém - Atos 15.1-21 (WH).
Pedro havia ido à Antioquia e ao chegar lá se alinhara ao
comportamento dos membros (judeus e gentios) daquela igreja, que seguindo a
decisão do Concílio de Jerusalém, comiam em unidade nas festas de amor - ágape
(confira: 1 Coríntios 11.17-22). No entanto, ocorreu que alguns indivíduos
judaizantes se introduziram na congregação insistindo que os gentios comessem
com os gentios e os judeus comessem com os judeus por causa das proibições
dietéticas. Então, Pedro começou a hesitar de sua posição e a se afastar dos
gentios. Isso mostra que mesmo que o processo de santificação seja progressivo,
cristãos podem cometer falhas durante sua caminhada. E aqui, como já havia
ocorrido antes, Cefas novamente deixou ser levado pelo medo e pela inconstância
como quando negou a Cristo (Mateus 26.69-75). Por causa disso, Paulo repreende
a Pedro publicamente (WH).
As exortações dos versículos 15 ao 21 passam a se dirigidas
não só a Pedro, mas também aos gálatas, aos judaizantes e até ao próprio Paulo
(WH). O apóstolo observa que eles eram “judeus” por natureza em oposição aos pecadores gentios.
A aplicação do adjetivo “pecadores” aos gentios pode
refletir o modo como os judeus costumavam encarar as pessoas de outros povos em
oposição ao povo eleito. A TI traz: “não somos pecadores como os outros”. A NVI
usa aspas, vertendo: “‘gentios pecadores’” e a NTLH faz o mesmo: “ ‘pecadores
não-judeus’”, o que pode insinuar que Paulo faz uso de uma expressão que era
usada pelos judeus. Essa ideia fica ainda mais insinuada na OL: “não fazemos
parte daqueles a que chamam os pecadores gentios”. Desse modo, Paulo sabia que
todos, judeus e gentios, eram pecadores, mas ao usar a expressão “gentios
pecadores” ele está aduzindo à visão que os judeus em geral tinham sobre os
gentios. William MacDonald entende que o apóstolo também poderia estar usando
de uma ironia para denunciar que o comportamento de Pedro evidenciava a noção
de uma superioridade dos judeus em relação aos gentios (WM).
16 sabendo,
contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em
Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos
justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei,
ninguém será justificado.
εἰδότες δὲ ὅτι οὐ δικαιοῦται ἄνθρωπος ἐξ ἔργων νόμου ἐὰν μὴ
διὰ πίστεως Χριστοῦ Ἰησοῦ καὶ ἡμεῖς εἰς Χριστὸν Ἰησοῦν ἐπιστεύσαμεν ἵνα
δικαιωθῶμεν ἐκ πίστεως Χριστοῦ καὶ οὐκ ἐξ ἔργων νόμου ὅτι ἐξ ἔργων νόμου οὐ
δικαιωθήσεται πᾶσα σάρξ
Paulo prossegue dizendo que apesar de (“δέ”) ser judeu por nascimento, e, portanto não estar
entre os ditos “pagãos pecadores” (“ἐθνῶν ἁμαρτωλοί”), ele não tinha as obras da lei como base de sua justificação. E,
assim, embora fosse parte do “povo da lei”, ele sabia que o homem não é
justificado pelas obras da lei, mas sim mediante a fé. E essa não era uma
questão particular, o apóstolo afirma categoricamente que ser justificado por
obras da lei é impossível para qualquer um.
Na medida
em que o apóstolo fala de “justificação mediante a fé”, ele parece ter em mente
a justificação subjetiva. Isto é, quando o pecador deposita por meio (“διὰ”) da fé sua confiança na obra justificadora de Cristo Jesus. A
justificação objetiva ou ativa seria a declaração, no tribunal de Deus, da
imputação da justiça de Cristo ao pecador, enquanto a justificação subjetiva
seria quando o pecador aceita ou se apropria dessa declaração por meio da fé
(LB).
Outras versões traduzem a ideia de justificação como:
“declarar justo” (TNM); “ser aceito por Deus” (NTLH); “entrar em boas relações
com Deus” (TI); “torna-se justa” (OL) e “se justificar” ou “tirar sua
justificação de” (VC). Desse modo, algumas traduções dão a entender um ato de
Deus de declarar justo o pecador e assim aceitá-lo para que o mesmo entre em
boas relações com Ele (TNM, NTLH, TI), enquanto outras parecem entender por
justificação um ato do pecador de se justificar ou tornar-se justo, insinuando
uma mudança subjetiva no pecador (OL, VC). Esse último entendimento parece
opor-se ao que o próprio texto está dizendo, isto é, que a justificação não é
um ato ou obra do pecador.
O verbo “δικαιόω” tem o sentido de julgar, declarar ou
pronunciar algo como justo, e, por conseguinte, aceitável (TGL). J.I. Packer em
God’s Words, pp.139-140 define justificar
como: “declarar [...], acerca de um homem levado a julgamento, que ele não está
sujeito a nenhuma penalidade, mas tem direito a todos os privilégios devidos a
quem guarda a lei. Justificar é o ato do juiz que pronuncia sentença oposta à
condenação – de indulto e imunidade legal” (apud
TK, p.62).
Já o termo “πίστις” (fé) fala de alguém que foi persuadido a
confiar em algo. Mas é distinto de uma mera confiança humana embora a inclua
também, pois se refere a uma dádiva que só pode ser concedida por Deus e nesse
sentido, é uma “persuasão divina” que traz consigo um elemento de garantia,
certeza e confiança baseados na revelação divina (HWS). A fé pística é um poder
que se apodera da alma, é a firme convicção de que Jesus é o Messias por meio
de quem obtemos a salvação (TGL). Nesse sentido, a justificação seria a
declaração de que somos aceitáveis a Deus mediante uma firme convicção e
confiança operada pelo próprio Deus em nós.
William
Hendriksen define justificação como “aquele ato gracioso de Deus pelo qual,
tão-somente com base na obra mediadora que Cristo consumou, ele declara justo o
pecador, e este aceita tal benefício com um coração crente” (WH, p.120). A fé é como a mão que se estende e aceita
essa dádiva. Mas, como visto na análise do termo “πίστις”, esse próprio
estender a mão é um dom de Deus (WH). Se o estender da mão fosse uma mera ação
do homem, como parece sugerir algumas ilustrações arminianas, tal fé seria uma
obra, e isso é exatamente o oposto do que o apóstolo está ensinando.
John Stott,
por sua vez, define justificação como o “ato imerecido do favor de Deus através
do qual ele coloca diante de si o pecador, não apenas perdoando-o ou
isentando-o de culpa, mas também aceitando-o e tratando-o como justo” (JS,
p.58). No entanto, a crença comum do povo e de todas as religiões em todos os
tempos, com exceção do Cristianismo, é a doutrina da justificação pelas obras
(JS). Todos sabem, ainda que neguem em suas especulações teóricas, que
transgrediram a Lei de Deus e que precisam prestar satisfação à justiça. Todos
os homens entram neste mundo sob um pacto de obras que diz: “Obedeça
integralmente à Lei e receberás a vida eterna.” e ao mesmo tempo, nenhum deles
pode cumprir essa condição. Assim, nenhum sistema de justificação por obras
pode resolver esse problema. Somente a doutrina da justificação pela fé provê
um meio de atender a essa necessidade.
É
importante observar os tempos e modos verbais neste texto. O verbo “οἶδα” (“saber”) está no particípio
perfeito na voz ativa, o que enfatiza uma primeira ação foi concluída antes de
uma segunda ação ter começado (ET). E, assim, primeiro Paulo teve logicamente
que conhecer a doutrina da justificação para que então pudesse crer nela. Desse
modo, a fé pressupõe a comunicação do evangelho: “Como, pois, invocarão aquele
em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram? e como ouvirão,
se não há quem pregue?” (Romanos 10.14). Além disso, ao afirmar que além de
saber da doutrina da justificação, ele também cria em Cristo, Paulo mostra que
a certeza do seu ensino não era meramente intelectual, mas também provada por
sua própria experiência pessoal (JS).
Já o verbo
“δικαιόω” (ser justificado) está no
presente do indicativo, e não no pretérito, o que reforçaria a interpretação de
que o texto se refere à justificação subjetiva que ocorre sempre que alguém
exerce fé no Senhor e não à justificação objetiva realizada de uma vez por
todas por Cristo no passado.
O verbo “πιστεύω” (crer), por sua vez, está no
aoristo o que pode sugerir uma ação que ocorre uma única vez ou uma vez por
todas e corresponde mais ou menos a um gerúndio + particípio - "tendo
crido" (W). Desse modo, a crença para justificação seria um ato ocorrido
simples e isoladamente. Não se crê várias vezes ou se continua crendo
continuamente para ser justificado. Tendo crido, a pessoa é justificada de uma
vez por todas. E, assim, o verbo “δικαιόω”
também é usado no aoristo. Em seguida “δικαιόω”
aparece no futuro do indicativo a fim de afirmar que ninguém (grego: “nenhuma
carne”: πᾶσα σάρξ), jamais, será justificado por obras da Lei.
17 Mas
se, procurando ser justificados em Cristo, fomos nós mesmos também achados
pecadores, dar-se-á o caso de ser Cristo ministro do pecado? Certo que não!
εἰ δὲ ζητοῦντες δικαιωθῆναι ἐν Χριστῷ εὑρέθημεν καὶ αὐτοὶ
ἁμαρτωλοί ἆρα Χριστὸς ἁμαρτίας διάκονος μὴ γένοιτο
Este versículo e o seguinte parecem um pouco confusos na
ARA. Outras traduções podem clarear o significado do versículo 17. A TI traz:
“Então se nós que procuramos estar em boas relações com Deus por nossa relação
com Cristo ainda continuamos pecadores, quer isso dizer que é Cristo quem nos
torna pecadores?”; a NVI diz: "Se, porém, procurando ser justificados em
Cristo descobrimos que nós mesmos somos pecadores, será Cristo então ministro
do pecado?”; a NTLH verte: “Ao procurarmos ser aceitos por Deus por estarmos
unidos com Cristo, fica claro que somos ‘pecadores’ como os não-judeus. Mas
será que isso quer dizer que Cristo trabalha em favor do pecado?”; já a OL
traduz da seguinte forma: “Se viessem agora dizer-nos - a nós que confiamos em
Cristo para nos perdoar e salvar - que errámos, e que não podemos tornarmo-nos
justos diante de Deus se não for pela obediência à lei, teríamos que concluir
daí que Cristo afinal nos levou ao erro!”
Desse modo,
o texto pode estar se opondo a espantalhos da doutrina da justificação que
poderiam ser feitos pelos falsos mestres, por exemplo. O texto poderia estar
dizendo que a doutrina da justificação realça o fato de que somos pecadores e
que por isso tal doutrina tornava Cristo ministro (“διάκονος”) do pecado. Ou
ainda poderia ser argumentado pelos opositores que apesar de se declarar
justificado, o indivíduo continua pecador e que por isso tal doutrina colocava
Cristo a serviço do pecado. E, assim, tais objeções seriam muito similares ou
as mesmas que aquelas que geralmente se ouve contra a doutrina reformada da
justificação pela fé. Isto é, que o ensino de que somos salvos sem obras da Lei
promove a impiedade e o pecado. Também poderia ser o caso de o apóstolo estar
conjecturando a acusação de pregar um sistema falso de justificação e que nesse
sentido, o “Cristo” por ele pregado estava conduzindo-o ao erro.
William
MacDonald entende essa passagem como se o apóstolo estivesse dizendo que se ele
buscasse a justificação pelas obras estaria colocando Cristo na posição de um
ministro do pecado (WM). Timothy Keller parafraseia este versículo e o seguinte
assim: “Se alguém que sabe ser
justificado pela fé comete pecado, é porque a justificação pela fé em Cristo
promove o pecado? Absolutamente, não! Mas, se alguém que professa fé em Cristo
mantêm o mesmo estilo de vida pecaminoso, restaurando sua condição de pecador,
cuja penalidade Cristo morreu para destruir, não se esforço nada para mudar,
isso prova que essa pessoa nunca entendeu de fato o evangelho. Ele estava só
procurando uma desculpa para viver em desobediência a Deus” (TK, p.63).
William Hendriksen defende a posição de que o texto deveria
ser entendido assim: “ ‘Se os judaizantes
estão no caminho certo, ao sustentar que nós, ao buscarmos a justificação
unicamente em Cristo, assim negligenciamos a lei e acabamos nos tornando rudes
pecadores tais como os gentios, diríamos então que Cristo, que nos ensinou essa
doutrina, é promotor do pecado?” (WH, p.123).
John Stott, por sua vez, entende a passagem em questão da
seguinte forma: “ ‘A sua doutrina da justificação através da fé em Cristo
somente, à parte das obras da lei, é uma doutrina altamente perigosa.
Fatalmente enfraquece o senso de responsabilidade moral do homem. Ao afirmar
que ele pode ser aceito confiando em Cristo, sem qualquer necessidade de boas
obras, você o está encorajando a transgredir a lei, que é a vil heresia do
‘antinomismo’’” (Js, p.62). Parece coerente, entender, assim como Stott, que Paulo
está refutando os oponentes que acusavam a dourina da justificação pela fé de
promover o pecado.
18 Porque,
se torno a edificar aquilo que destruí, a mim mesmo me constituo transgressor.
εἰ γὰρ ἃ κατέλυσα ταῦτα πάλιν
οἰκοδομῶ παραβάτην ἐμαυτὸν συνιστάνω
A NTLH traz: “Se eu, depois de ter destruído a lei, começar
a construí-la de novo como meio de ser aceito por Deus, aí, sim, fica claro que
eu havia quebrado a lei.” Neste caso, não seria a doutrina da Justificação pela
fé que tornaria Cristo ministro do pecado por evidenciar que somos pecadores,
mas sim a doutrina da justificação pelas obras da Lei. O esforço inútil por
tentar guardar a lei para ser aceito por Deus é o que deixaria claro o fato de
sermos transgressores da Lei. Já na OL lemos: “Evidentemente que se me ponho a
construir de novo um sistema de justificação, o qual antes tinha sido
destruído, torno-me transgressor.” Neste caso, o sentido do verso seria que se
Paulo abandonasse a doutrina da justificação pela fé por causa do argumento dos
opositores de que ela promove o pecado, ele se tornaria culpado por isso. Esse
último sentido me apetece mais. O termo παραβάτης descreve alguém que
transgride deliberadamente a Lei de
Deus (TGL). Essa atitude de reconstruir um sistema de justificação que havia
sido demolido, teria sido a atitude de Pedro quando influenciou-se pelos
judaizantes, deixando de confiar em Cristo ao voltar-se para a Lei (WM).
19 Porque
eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus. Estou
crucificado com Cristo;
ἐγὼ γὰρ διὰ νόμου νόμῳ ἀπέθανον ἵνα
Θεῷ ζήσω Χριστῷ συνεσταύρωμαι
Paulo afirma que através da própria lei morreu para a lei.
Isso parece ter o sentido de que a Lei cumpriu o papel de servir de espelho
para que o apóstolo se percebesse como pecador, descobrisse que é incapaz de
obedecer a lei e buscasse a graça de Cristo a fim de viver para Deus. O termo
“νόμος” é empregado em diversos sentidos pelo apóstolo em suas epístolas. Aqui
provavelmente νόμος é usado em um sentindo mais amplo para se referir à Lei de
Moisés e a todo o volume de mandamentos humanos que os judeus acrescentaram a
ela (WH).
Algo importante de ser observado no versículo é a expressão
“Estou crucificado com Cristo” que destaca a união mística do crente com o
Senhor. O verbo “συσταυρόω” está no perfeito do indicativo denotando algo que
aconteceu no passado, mas cujos efeitos continuam no presente. Paulo foi
crucificado com Cristo, mas ainda experimenta os efeitos dessa crucificação.
Estamos unidos com nosso Representante, Cristo Jesus, e por isso nos
identificamos com ele em sua morte. Mas essa expressão não deve ser entendida,
como fazem alguns místicos, como a fusão da personalidade do Cristão em Cristo.
Paulo continua tendo uma existência individual e separada (“vida que tenho na
carne” v.20), o que o apóstolo trata aqui é de uma união por meio da fé. Sendo
assim, a justificação insere o crente numa relação pessoal com Cristo (WH).
Morrer em Cristo significa morrer para um modo de vida no qual se busca ganhar
a salvação por méritos próprios.
20 logo,
já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho
na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou
por mim.
ζῶ δὲ οὐκέτι ἐγώ ζῇ δὲ ἐν ἐμοὶ Χριστός ὃ δὲ νῦν ζῶ ἐν
σαρκί ἐν πίστει ζῶ τῇ τοῦ Υἱοῦ τοῦ Θεοῦ τοῦ ἀγαπήσαντός με καὶ παραδόντος
ἑαυτὸν ὑπὲρ ἐμοῦ
Este verso explora mais a identificação
do crente com Cristo. Paulo afirma que não é ele quem vive, mas é Cristo quem
vive nele. Ele também destaca o fato de que Cristo o amou e morreu por ele.
Assim, a justificação deve ser entendida à luz da obra sacrifical de Cristo e
da união mística do crente com o Senhor.
Essa
união entre o crente e Cristo faz com que Paulo descreva a mudança que acontece
com uma pessoa justificada em termos de morte e ressurreição. A justiça divina
foi satisfeita na morte de Cristo, e nela nossa vida passada é crucificada e
ressuscitamos para uma nova vida. Assim, é absurdo que alguém que tenha morrido
para a vida antiga queira voltar a ela (JS).
O termo usado no grego para “carne”
(σάρξ) parece denotar, aqui, a vida humana natural, destacando contra os
místicos que a união com Cristo não anula nossa existência humana individual e
real (v.16). O verbo ἀγαπάω empregado na passagem no aoristo traz a ideia de
ser cheio de boa-vontade e exibi-la realmente. É a boa-vontade exibida na cruz,
é o amor que levou Cristo a sofrer e morrer para nos salvar (TGL).
21 Não
anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é mediante a lei, segue-se que morreu
Cristo em vão.
Οὐκ ἀθετῶ τὴν χάριν τοῦ Θεοῦ εἰ γὰρ
διὰ νόμου δικαιοσύνη ἄρα Χριστὸς δωρεὰν ἀπέθανεν
Por fim, o apóstolo mostra que ao crer na justificação pela
fé está pregando o evangelho da graça, ao contrário dos falsos mestres
judaizantes que ao ensinar a justificação pelas obras da Lei tornavam a morte
de Cristo em vão. Se o crente pode ser salvo pela obediência das ordenanças,
logo não haveria necessidade de que Cristo tivesse se entregado para nos
salvar.
O verbo “ἀθετέω” tem o sentido de rejeitar, recusar,
diminuir, destruir (TGL), acabar com o que já está estabelecido, romper com a
fé, invalidar, ignorar (SC) ou ainda desprezar como algo espúrio (HWS). Assim,
negar a doutrina da justificação pela fé somente é rejeitar a graça. Pois, se a
justificação pode ser por obras, Cristo morreu em vão (“δωρεὰν”), isto é, como
uma oferta sem propósito (NAS).
Desse modo, o apóstolo deixa claro que a doutrina da
justificação pela fé é uma doutrina fundamental e essencial do evangelho. É o
próprio fundamento da religião cristã, pois se no final o destino de nossa
salvação é decidido por nós, a graça de Deus é anulada e torna-se inútil o
sacrifício de Cristo (JS). Todos os sistemas soteriológico antiagostinianos
(anticalvinistas), ao fazerem o destino final ultimamente definido por uma
decisão do homem, caem nesse erro. Mas não só isso, quando nós mesmos olhamos
para os nossos pecados como se eles ainda precisassem ser punidos ou trouxessem
condenação e quando buscamos justificar as nossas falhas, estamos agindo como
Pedro, esquecendo-nos da graça de Cristo e reconstruindo um sistema de justificação
com base em obras.
SIGLAS
ARA – Almeida Revista e Atualizada.
ARC – Almeida Revista e Corrigida.
HWS - HELPS Word-studies
JS – John Stott – A Mensagem de Gálatas.
LB – Louis Berkhof – Manual de Doutrina Cristã.
NAS - NAS Exhaustive Concordance.
NVI – Nova Versão Internacional.
NTLH – Nova Tradução na Linguagem de Hoje.
OL – O Livro.
TGL - Thayer's Greek Lexicon.
TK – Timothy Keller – Gálatas para você.
TI – Tradução Interconfessional.
TNM – Tradução do Novo Mundo.
VC – Versão Católica.
WH – William Hendriksen – Comentário do Novo Testamento – Gálatas.
WM – William MacDonald – Comentário Bíblico Popular – Novo Testamento.
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