POR UMA FILOSOFIA CALVINISTA V: SUSPENSÃO DAS FALÁCIAS
O objetivo deste artigo é suspender a
ideia falaciosa de falácia da Filosofia Secular. A questão é realmente destruir (εποχη) a concepção de que a ‘“falácia
genética’’, o argumento da autoridade, argumento circular, argumento ad hominem e non sequitur, sejam falácias.
Pelo contrário, o que este artigo pretende fazer é dizer que a Filosofia
Pura deve ser circular, baseada na autoridade, no non sequitur e, além disso, que o cristão pode recorrer ao
argumento ad hominem.
O QUE SÃO FALÁCIAS?
Falácias seriam raciocínios falsos
aparentemente verdadeiros. Como já explicado no artigo sobre lógica formal, o
Cristianismo é uma religião lógica e racional. O texto bíblico diz que Paulo “raciocinava’’
com base nas Escrituras (Atos 17.2), a Confissão de Fé de Westminster diz que
as verdades são logicamente deduzidas dos dados bíblicos (1.6). Isso significa
que o cristão não aceita erros de raciocínio.
Não há nenhum problema em si com as três
leis básicas da lógica dedutiva (identidade, contradição e terceiro excluído),
nem com as falácias (erros de raciocínio), como a falácia do maior ou menor
ilícito, do intermediário não distribuído, do quarto termo ou do formato. O
problema existe quando essas falácias são pensadas dentro de uma Cosmovisão
não-cristã, pois elas passam a estar contaminadas por pressuposições antibíblicas.
A Bíblia diz que o não-cristão converte
a verdade de Deus em mentira e para abafar o conhecimento verdadeiro que Deus
gravou em seu coração, ele cria raciocínios e especulações. Para proteger seu
sistema dos argumentos bíblicos que o destruiriam, os não-cristãos acusam a
forma bíblica de argumentar como falaciosa.
Falácia, dentro do sistema não-cristão de pensamento, são escusas para
manter as teorias antibíblicas imunes a crítica cristã
“Porquanto, tendo
conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças;
antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o
coração insensato... pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e
servindo a criatura em lugar do Criador, o qual é bendito eternamente. Amém!’’ –
Romanos 1.21, 25.
JUSTIFICAÇÃO EPISTEMOLÓGICA DAS “FALÁCIAS’’
Falácia Circular: Dentro do sistema não-cristão, todo
argumento circular é uma falácia, porque o não cristão não tem como justificar
epistemologicamente o uso do argumento circular. Na verdade, no final das
contas. todo argumento é circular. Toda Cosmovisão é um círculo, um sistema de
pensamento fechado em si mesmo onde um argumento depende de outro argumento,
formando uma trama de proposições interdependentes. O problema é que toda
cosmovisão, como já mostrado no artigo sobre lógica formal, pressupõe a
afirmação do que pretende negar e a negação do que pretende afirmar. Só a
Cosmovisão cristã é logicamente coerente afirmando o que pressupõe afirmar e
negando o que pressupõe negar, por isso, só o cristão pode argumentar
circularmente sem que seu raciocínio seja falacioso. A Cosmovisão Reformada é
baseada numa circularidade hermenêutica
Deus – si mesmo. Calvino diz, no início das Institutas (1.1.1-2) que "O
conhecimento de nós mesmos nos conduz ao conhecimento de Deus e o conhecimento
de Deus nos leva ao conhecimento de nós mesmos ". Assim, a compreensão de
Deus se desvela a medida que conhecemos a nós mesmos e a compreensão de nós
mesmos se desvela a medida que conhecemos a Deus. Um exemplo do uso correto do
argumento circular é o argumento a favor da Bíblia como Palavra de Deus. O
cristão deve argumentar que a Bíblia é a Palavra de Deus, não com base na
Ciência ou na Filosofia, mas com base na Bíblia mesma. A Bíblia é a Palavra de Deus porque a Bíblia diz que ela é a Palavra de
Deus.
Falácia
da Autoridade:
Todo argumento é baseado, em última instância, na autoridade, seja de um
filósofo, seja da razão (racionalismo) ou seja da experiência (empirismo). O
cristão é o único que pode argumentar com base na autoridade porque o
Cristianismo está baseado no único que tem o direito da autoridade
epistemológica, Deus, que se revela na Escritura. Deus é a Autoridade final e
última e, visto que Deus se revela na Escritura, a Escritura porta autoridade
final e última, ela é o Juiz Final pelo qual toda controvérsia religiosa é definida: “A autoridade da Escritura Sagrada,
razão pela qual deve ser crida e obedecida, não depende do testemunho de
qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus (a mesma verdade) que é o
seu autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é a palavra de Deus.’’
(Confissão de Fé de Westminster I.IV). Além disso, a Escritura diz que o
Espírito Santo ilumina a Igreja a
entender a Escritura, portanto a interpretação
histórica que a Igreja faz da Escritura é autotitativa.
A Escritura deve ser interpretada a luz do credo histórico da Igreja, qualquer
interpretação nova e alternativa que contradiga o testemunho universal dos pais
da igreja, dos grandes teólogos medievais, dos pré-reformadores e dos
reformadores é necessariamente falsa. Esse argumento da autoridade é baseado na
autoridade do Deus Espírito Santo. No entanto, a Fé Reformada crê no Sola Scriptura, por isso se deve
distinguir a autoridade da Bíblia (norma
normans: regra que regula todas as regras)
da autoridade dos credos históricos (norma
normata:
regras reguladas pela Escritura). Nenhum Credo ou Confissão de Fé é
inerrante ou ‘inrevisável’ e só deve ser aceito a medida em que se mostra
uma exposição exata do ensino das Escrituras. Dado que o cristão crê na
Autoridade iluminadora do Espírito Santo ele pode argumentar com base no entendimento
comum dos teólogos e credos. Esta ilustração ajudará a entender isso:
Falácia Ad Hominem: Todo não-cristão que argumenta fazendo ataques pessoais
está cometendo uma falácia, pois só se pode fazer um juízo moral sobre uma
pessoa a partir de um padrão moral cristão, por isso, só o cristão pode fazer
um juízo moral adequado contra uma pessoa. Um cristão pode fazer uso do argumento ad
hominem, em alguns casos é necessário ofender o outro com a verdade, deixando
claro quem ele é enquanto pessoa. A
Bíblia diz que um ateu é ‘tolo’ (Salmos 53.1), João Batista chamou seus
ouvintes de ‘raça de víboras’ (Mateus 12.34). Por vezes, num debate, quando a
pessoa está com os ouvidos fechados para a verdade é suficiente dizer que ela
está errada simplesmente porque ela é ímpia. É impossível que um não-cristão
esteja certo porque sua cosmovisão é falsa.
Falácia Genética: O não-cristão que descarta um argumento com base na fonte ou origem do argumento, comete uma falácia, pois um não-cristão não
usa o padrão correto para julgar a qualidade de uma fonte. O cristão, por outro
lado, tem o padrão bíblico para julgar a fonte e, por isso, qualquer argumento
que venha de um não-cristão é necessariamente falso. O cristão lê livros
não-cristãos e de outras religiões simplesmente para criticar e refutar, porque
ele já sabe de antemão que a Cosmovisão não-cristã não é verdadeira. O mesmo
cristão sabe também que pode argumentar com bases em fontes cristãs e
especialmente com base na Fonte inerrante e infalível das Escrituras, porque se
uma doutrina tem como fonte ou origem as Escrituras ela é necessariamente
verdadeira.
Non Sequitur: O
pensamento aristotélico cria o mito de que uma conclusão se segue
necessariamente das premissas quando na verdade quem estabelece a conexão entre as premissas e a conclusão
é a consciência, por isso, todo argumento é um non sequitur. As premissas podem ser pensadas como “pontos’’ que
podem ser ligados coerentemente de diferentes formas. Só a Cosmovisão cristã
liga os pontos de maneira coerente. O mesmo vale para os dados bíblicos, eles
podem ser ligados de diferentes formas. Por isso, Tertuliano dizia que para
refutar as seitas não basta citar versículos das Escrituras, é necessário
mostrar qual é a interpretação ortodoxa da Igreja recorrendo ao seu credo
histórico. O credo histórico da Igreja deve regular o modo como os dados
bíblicos são ligados no que se chama Teologia Sistemática. É assim que se
soluciona os chamados ‘gaps’ que existem em toda argumentação teológica, filosófica, científica e histórica. Esta ilustração ajudará a entender isso:
Mal-estar na civilização e Futuro de uma Ilusão
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
A Fé Calvinista
é baseada numa circularidade hermenêutica em que o homem conhece a Deus na
medida em que conhece a si mesmo e conhece a si mesmo a medida em que conhece a
Deus. Deus é a Autoridade Final e a Fonte última da Verdade, Verdade que Ele
registrou na Escritura e que é o padrão pelo qual julgamos o mundo. E é Deus
quem estabelece a conexão correta e preenche as lacunas da realidade.
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